
Mesmo com avanços científicos nas últimas décadas, o Transtorno do Espectro Autista (TEA) continua sendo um dos principais desafios da medicina. As causas exatas do transtorno ainda não foram determinadas, e os exames disponíveis identificam apenas uma parcela dos casos. A falta de consenso científico tem contribuído para a disseminação de informações incorretas e teorias sem respaldo técnico sobre possíveis origens e curas.
Em setembro, declarações do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump reacenderam o debate ao associar o uso de paracetamol na gestação ao risco de autismo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) contestou a afirmação, informando que não há evidências científicas que sustentem essa ligação. O Ministério da Saúde também classificou como inadequadas as divulgações que relacionam o medicamento ao transtorno. Segundo o Censo de 2022, cerca de 2,4 milhões de pessoas foram diagnosticadas com TEA no Brasil. A OMS estima que o número global corresponda a uma em cada 127 pessoas.
Desinformação e Autismo: Um Cenário Preocupante
Levantamento da Fundação Getulio Vargas (FGV) em parceria com a Associação Nacional para Inclusão das Pessoas Autistas (Autistas Brasil) mostrou que o volume de conteúdos falsos sobre o autismo cresceu mais de 15 mil % entre 2019 e 2024 na América Latina e no Caribe. O estudo identificou cerca de 150 falsas causas e igual número de supostas curas. Em entrevista ao portal Terra, o psicólogo Guilherme Bracarense Filgueiras, da Universidade Estadual de Londrina, afirmou que essas teorias exploram lacunas de conhecimento científico para gerar engajamento nas redes sociais. Já a neuropediatra Marcela Rodríguez de Freitas, da Universidade Federal Fluminense, destacou ao site que a desinformação pode levar famílias a evitar vacinas e tratamentos médicos.
Pesquisas indicam que o autismo tem origem multifatorial, envolvendo componentes genéticos e ambientais. A bióloga Andréa Laurato Sertié, do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein, explicou ao Terra que mutações raras em um ou poucos genes aparecem em 20 a 25 % dos casos, mas não existe um marcador genético comum a todos os diagnósticos. Idade dos pais, infecções durante a gestação e exposição a toxinas estão entre os fatores investigados como possíveis influências ambientais.
Avanços e Desafios no Diagnóstico e Tratamento do TEA
O entendimento de que o TEA é uma condição heterogênea levou à revisão de protocolos diagnósticos. A Sociedade Brasileira de Neurologia Infantil recomenda a triagem precoce, preferencialmente antes dos dois anos de idade. Ainda não há cura para o transtorno, mas terapias comportamentais e educacionais intensivas continuam sendo as abordagens com maior respaldo científico. Pesquisas em medicina de precisão buscam identificar subgrupos genéticos que permitam desenvolver intervenções mais específicas.
Especialistas ressaltam que o avanço científico precisa vir acompanhado de políticas públicas voltadas à inclusão, à acessibilidade e à garantia de qualidade de vida para pessoas com autismo e suas famílias.