Reflexões sobre a qualidade dos empregos gerados e o futuro dos jovens

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Chamou nossa atenção uma matéria recente do jornal O Globo (19/10/2013), “Precariado: o trabalho em crise”. Ao cruzarmos o preocupante conteúdo da matéria com as mais diversas pesquisas de opinião divulgadas na imprensa brasileira, reforçamos nossa convicção de que as manifestações sociais de junho têm também um forte caráter econômico. A demanda da sociedade por um padrão Fifa na gestão pública persiste, porém iremos considerar neste artigo os temas prementes que afligem os mais jovens.

Seguindo a clássica tese de Alexis de Tocqueville (1856), podemos seguramente dizer que os aspectos gerais da vida da nossa população melhoraram nos últimos anos e, junto com os mesmos, as expectativas da sociedade se elevaram: “Não é sempre caminhando de mal a pior que o país entra em revolução”. Levantamento do instituto Data Popular (julho/2013) apontou que 68% dos integrantes das manifestações de junho reconheceram que melhoraram de vida ultimamente; 87% acreditam ter melhorado de vida por conta própria, sendo que os jovens da classe média tradicional ganham aproximadamente 50% da renda dos pais. Uma persistente inflação elevada não facilita a vida dos mesmos. Esses jovens estão com sérias dificuldades em reproduzir o padrão de vida dos pais. Os filhos da classe média emergente, por sua vez, desejam avançar nas conquistas sociais e, para tanto, o status de país de renda média precisará ser superado coletivamente.

Vejamos então o que a matéria sobre o precariado diz: “Imigrantes e jovens trabalhadores com empregos temporários, mal remunerados e sem os direitos da geração dos seus pais constituem um novo ator político estudado no Brasil e no exterior. Ainda muito discutido por pesquisadores, o conceito de ‘precariado’ tenta dar conta das transformações econômicas ao longo das últimas décadas e estaria na origem das manifestações que explodiram na Europa e nos EUA a partir de 2008 e no Brasil este ano”. A sensação de insegurança afeta a percepção de futuro dos mais jovens, podendo a mesma eventualmente transformar a legítima insatisfação do momento em uma inquietação social generalizada logo adiante.

O economista britânico Guy Standing considera o precariado a nova classe perigosa. De acordo com Standing: “[Essas pessoas] rejeitam as forças políticas tradicionais e o que representam. Além disso, há um movimento progressista dentro da classe que deseja uma transformação mais radical da ordem econômica e política. Contudo, por haver um sentimento de frustração disseminado e na falta de um projeto de futuro, o precariado também seria alvo fácil de políticos populistas, neofascistas e xenófobos”.

Para o sociólogo brasileiro Ruy Braga, “mesmo no auge do período de expansão fordista, após a Segunda Guerra, existia, nas margens, trabalhadores submetidos a condições precárias de trabalho e de vida”. O professor Braga sugere uma mutação no mundo do trabalho europeu, pois o precariado migrou da periferia da relação salarial fordista para o centro do sistema economia-mundo. Sobre a eurozona, afirma Braga: “(…) se você tirar da conta todos os empregos que pagam 400 euros, a taxa de desemprego [na Alemanha] é a mesma da Espanha. Ou seja, os trabalhadores que ganham esse salário, que têm um tipo de trabalho muito precário, são os que seguram a onda do desemprego. Mesmo na França ou na Alemanha, a periferia da relação salarial está se tornando o centro”.

No Brasil, o sociólogo sugere que os aumentos da taxa de acidentes, da terceirização e da rotatividade da mão de obra podem ser considerados sintomas do mal estar social entre os nossos jovens. Na última década, foram criados entre nós 2,1 milhões de empregos por ano, sendo que 94% pagando até um salário mínimo e meio. O sociólogo Giovanni Alves enxerga o precariado brasileiro como “jovens altamente escolarizados que acabam assumindo empregos sub-remunerados, em uma situação que se aproxima daquela vivida em muitos países europeus”. O jogo político precisará enfrentar responsavelmente esses desafios, qualificando o nosso debate público e buscando soluções inteligentes e institucionalmente inovadoras a partir de um diálogo permanente com a sociedade. Nossos jovens merecem perspectivas futuras mais animadoras para que possam inclusive ajudar a construir no presente um país mais desenvolvido e socialmente justo.

Paulo Hartung é economista e ex-governador do Espírito Santo

Rodrigo Medeiros é professor do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes)

Um comentário em “Reflexões sobre a qualidade dos empregos gerados e o futuro dos jovens”

  1. Como pode afirmarem que o “Precariado” é composto no Brasil por jovens altamente escolarizados, e que as condições de vida se aproxima às europeias?

    Concordo que na Europa, jovens altamente escolarizados estejam desempregados ou em sub-empregos, mas mesmo assim as condições de vida no tocante à infra-estrutura, de um modo geral, são incomparavelmente superiores ao Brasil.

    O que vemos aqui é uma classe jovem, em sua maioria, que frequenta “sub-universidades”, com “sub-padrão de ensino”, que tem uma “sub-qualidade de vida”, com transporte precário e violência por toda parte, e que leva um padrão de vida tipicamente ‘SUB-desenvolvido”.

    Não podemos nos comparar a Europa e Estados Unidos enquanto nossa “sub-cultura” porca prevalecer na cabeça de nossa classe jovem.

    “Precariada” juventude brasileira!!!!!!

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