Do Pix ao Real Digital: Uma jornada de digitalização do dinheiro

Marcello Casal Jr/ Agência Brasil

Nos últimos anos uma nova modalidade de pagamento digital revolucionou a maneira como os brasileiros realizam suas transferências financeiras: o popularíssimo PIX. Criado pelo Banco Central (BC), o PIX é um meio de pagamento instantâneo que permite a transferência digital de recursos entre contas bancárias em questão de segundos, a qualquer hora do dia ou da noite. Tal praticidade promoveu uma revolução nas modalidades de pagamentos, mas também suscitou uma série de questionamentos em relação ao aumento dos crimes digitais, que se aproveitam destas comodidades e descuidos no ciberespaço.

O PIX se tornou o instrumento de pagamento digital mais utilizado no Brasil, representando 35% de participação dentre todas as transações realizadas com cartões, boletos e transferências bancárias, de acordo com dados do BC relativos ao primeiro trimestre de 2023. 

A cada dia novas funcionalidades são criadas para ampliar a utilização do PIX nas mais diversas formas de transferências financeiras entre as pessoas e empresas, sejam elas físicas ou digitais. Atualmente, já é possível utilizar o PIX para realizar saques, receber troco, fazer cobranças e, futuramente, até mesmo para crédito. Isso poderia levar o PIX além das fronteiras dos cartões de crédito e boletos garantidos, assim como aconteceu nas operações com cartões de débito.

Embora a criminalidade tenha adaptado o PIX na realização de golpes virtuais, estelionatos e sequestros no mundo real, esse instrumento de pagamento veio para ficar, pois já se incorporou às dinâmicas financeiras e comerciais da atualidade. Além disso, novos modelos de negócios surgiram a partir do PIX e suas funcionalidades, de modo que os empreendedores que não o oferecem correm o risco de perder vendas e participação em seus mercados.

Com efeito, nessa esteira de inovação, outra novidade tem surgido com grandes prenúncios revolucionários no âmbito monetário. É que o BC está desenvolvendo um projeto que utiliza a tecnologia blockchain para criar uma criptomoeda regulada pelo país. Estamos falando do ainda embrionário Real Digital, que tem o potencial de impactar toda a lógica da política monetária e a intermediação bancária ao digitalizar a nossa moeda, deixando de ser disponível apenas em meio físico. Quando falamos de Real Digital, estamos tratando das chamadas moedas digitais dos bancos centrais, conhecidas como Central Bank Digital Currency (CBDC) em inglês.

O tema das CBDCs tem chamado a atenção da comunidade global de bancos centrais, e é pauta frequente das reuniões da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Grande parte desses países membros e bancos centrais envolvidos, que representam quase a totalidade do PIB mundial, estão estudando os mecanismos normativos, explorando ou testando projetos, aspectos operacionais e tecnológicos de um sistema global de CBDCs.

Esses países veem nas CBDCs o potencial de melhorar a eficiência das políticas monetárias, a transparência dos fluxos financeiros internacionais, do mercado de pagamentos, além de promover inclusão financeira para a população que não tem acesso adequado aos serviços bancários. Neste aspecto, a crise da pandemia destacou a importância de os instrumentos digitais de pagamento alcançarem os segmentos mais vulneráveis da população.

Ademais, um dos motivos para o desenvolvimento das CBDCs é a tentativa de conter o crescimento desregulado de criptomoedas. Nesse sentido, poderiam assegurar que os bancos centrais mantenham a regulação sobre o fluxo financeiro das moedas digitais, fortalecendo, assim, seu papel normativo mesmo no contexto de uma economia globalizada. Entretanto, também existem questionamentos acerca do possível controle totalitário por países de restrita liberdade democrática, pois, embora as CBDCs possam ajudar no combate à lavagem de dinheiro e a sonegação fiscal, seu uso abusivo também poderia afetar a privacidade dos cidadãos e o sigilo fiscal empresas.

No contexto de transformações que temos vivenciado, a implantação do Real Digital poderá contribuir, assim como o PIX, para o avanço da economia digital em consonância com as inovações propostas pela reforma tributária, em especial, a tributação de tecnologias emergentes. Deste modo, a utilização do Real Digital facilitaria os processos de arrecadação de impostos, tornando-os mais eficientes e transparentes, seja nas transações presenciais ou virtuais, e ainda contribuir para simplificar o processo de documentação e escrituração fiscal por meio de uma eficaz rastreabilidade financeira.

Cumpre destacar também que dentre os prováveis efeitos positivos da efetivação do Real Digital, está a possibilidade de atacar a prejudicial concentração bancária que é característica no Brasil, de forma a promover uma sustentável competição concorrencial no setor de intermediação financeira. Nesse cenário, abre-se um leque de oportunidades para novos negócios elaborados por fintechs e startups. Embora os bancos tradicionais possam perder receita e participação de mercado com a criação do Real Digital, tal medida deve estar orientada pelo viés do desenvolvimento econômico e social do país, e não pelo protecionismo de determinados setores. 

Logo, o PIX e o Real Digital são avanços significativos para impulsionar a eficácia da economia brasileira, e facilitar o acesso a serviços financeiros para a população. Enquanto o PIX trouxe praticidade e eficiência para as transferências de valores, o Real Digital tem o potencial de revolucionar todo o sistema monetário e de política fiscal com segurança, rastreabilidade e transparência. Sendo assim, para alcançar todos estes almejados objetivos, será necessário avaliar reiteradamente as implicações dessas tecnologias, considerando os benefícios e os desafios que elas apresentam de fato para as pessoas, empresas e o país. Então, quem sabe no futuro as obscuras e corruptivas malas de dinheiro sejam apenas tristes lembranças de um trágico capitulo de nossa história que remontam um passado não tão glorioso assim. Não custa nada acreditar.

Bruno Aguilar Soares 

Auditor fiscal da Receita Estadual, da Secreratia da Fazenda do Espírito Santo.

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