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Emoção marca mesa sobre golpe na Flip

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Paraty – Emoção, um pouco de esperança e outro de ceticismo marcaram o debate sobre os 50 anos do golpe militar na tarde de ontem, o mais longo desta edição da Flip. No palco, três pessoas que sofreram os efeitos da ditadura no Brasil. Marcelo Rubens Paiva tinha 11 anos em 1971 quando o pai, o deputado Rubens Paiva, foi morto. Bernardo Kucinski perdeu a irmã Ana Rosa. Persio Arida, militante da ala juvenil da VAR-Palmares, foi preso aos 18 anos.

Na sexta, Rubens Paiva sugeriu, em conversa com o Estado, que o encontro seria muito “emocional”. E foi assim desde o princípio, quando a plateia e os participantes ouviram a transmissão de um pronunciamento do deputado Rubens Paiva feito no dia 1.º de abril de 1964.

Marcelo começou sua fala ainda sob o impacto da voz do pai e leu a crônica Trabalhando o Sal, publicada no Estado em fevereiro deste ano, que falava sobre a postura da mãe diante da tragédia. “Minha mãe deu o tom: a família Rubens Paiva não chora em frente às câmeras, não faz cara de coitada, não se faz de vítima. A família Rubens Paiva não é a única vítima da ditadura. Esteve em guerra contra ela desde o primeiro dia. O País é a maior vítima. O crime foi contra a humanidade. Nossa luta não tem fim. Sou pai agora, vejo isso com outros olhos”.

O economista Persio Arida contou que escreve um livro sobre sua experiência durante a ditadura. Depois de um tempo escondido no apartamento secreto do pai, ele foi preso. Foram 15 dias até que a família conseguisse a confirmação de que estava preso.

Bernardo Kucinski, professor aposentado e autor de livros sobre economia, política e jornalismo, narra, em seu livro K., a busca de um pai por sua filha desaparecida. É, de certa forma, a história de sua irmã Ana Rosa, professora de química da USP, presa aos 34 anos e morta. “É um trauma para a família não conseguir enterrar seus mortos e fazer o luto”, disse. “O desaparecimento é uma segunda tortura, que acompanha a família a vida inteira. É um entrave, uma coisa que não tem fim. Mesmo que haja revisão da lei, julgamento, respostas, a tortura não tem fim”, completou Rubens Paiva, que está confiante nas investigações do Ministério Público.

Houve consenso de que pouca gente hoje sabe o que de fato ocorreu. “O que percebemos com as manifestações junho e com as opiniões que vimos nas redes sociais é que fomos muito negligentes com as novas gerações. Se até pessoas que participaram da redemocratização estão confusas, imagina os meninos”, disse Rubens Paiva.

Vigilância

No começo da manhã, as atenções estiveram voltadas para o jornalista americano Glenn Greenwald. Antes de sua mesa no evento, ele voltou a reafirmar seu compromisso de continuar divulgando os documentos em posse do ex-agente Edward Snowden, que viu pela última vez há pouco mais de três meses na Rússia, onde está sob proteção do governo.

Greenwald, de 47 anos, ficou conhecido após a revelação de dados fornecidos por Snowden no final de 2012. Os primeiros documentos foram divulgados em junho do ano passado e caíram como uma bomba sobre o governo americano, que se viu obrigado a explicar o monitoramento de informações e e-mails de autoridades de países espionados pelo NSA, a agência de segurança americana que bisbilhotou, inclusive, a correspondência digital da presidente Dilma Rousseff e de várias empresas brasileiras, como a Petrobrás.

Snowden, disse o jornalista, é uma espécie de jogador de videogame lutando contra superpotências, amparado na mitologia americana do herói que vence sozinho o mal. O governo americano, observou Greenwald, decepciona cada vez mais o cidadão comum com a ambiguidade do presidente Obama, que defende a paz na faixa de Gaza, mas, segundo o jornalista, continua a aceitar as encomendas de armas de Israel.

“A imagem de Obama como promotor da paz é totalmente diversa do que é na realidade”, disse. “A Agência de Segurança Nacional não desiste da ideia de ter absoluto controle sobre as telecomunicações em todo o mundo, elegendo países como alvos prioritários, entre eles o Brasil.”

No debate com o cineasta Charles Ferguson, Greenwald voltaria a reafirmar sua crença de que a agência de segurança americana não quer só espionar países emergentes como o Brasil, mas manter a internet sob controle. Ele acha também que o Brasil tem o dever moral de dar asilo político a Snowden após tudo o que ele fez pelo País, denunciando a espionagem dos e-mails de Dilma.