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Brasil dispensa apoio do Chile a busca de vaga permanente do CS da ONU

A visita de Jair Bolsonaro ao Chile terminou ontem (23) com um encontro com o presidente chileno, Sebastián Piñera, e uma declaração conjunta, que deixou de fora o apoio do governo do Chile à pretensão brasileira de ser membro permanente do Conselho de Segurança (CS) da ONU.

Segundo fontes do Itamaraty, a minuta inicial da declaração enviada pela chancelaria chilena, na semana passada, incluía a declaração de apoio à inclusão do Brasil no Conselho de Segurança. A área competente do Ministério de Relações Exteriores teria até proposto um reforço na linguagem, mas a menção foi retirada da contraproposta enviada pelo governo brasileiro aos chilenos.

Questionado duas vezes ontem pela reportagem, o Itamaraty informou que não comentaria o assunto. O chanceler Ernesto Araújo disse, por meio da assessoria do ministério, que não falaria sobre o processo de elaboração da declaração. Segundo ele, o que vale é o que está no texto oficial.

"O texto acordado é um excelente marco para a nova era das relações entre Brasil e Chile", afirmou Araújo, que tem sido um crítico da ONU e do que ele chama de "globalismo" e "marxismo cultural nas relações internacionais".

O Estado apurou ontem com membros do governo que o Brasil não desistiu de ser membro permanente do CS da ONU e espera o apoio dos EUA para conseguir uma vaga. Pessoas próximas a Araújo negam que ele tenha pedido ao governo chileno para retirar esse trecho da declaração e garantem que o chanceler considera a pauta "importantíssima". "Ele está otimista e acredita no apoio dos EUA", disse um assessor do presidente.

A reivindicação do Brasil é histórica. Antes mesmo da fundação da ONU, ainda no período da Liga das Nações, o Brasil manobrava por um assento no Conselho Executivo (a versão do CS na época). Em 1926, após uma tentativa frustrada de vetar a entrada da Alemanha no órgão, o presidente brasileiro Artur Bernardes abandonou a organização.

A reivindicação foi retomada pelo presidente José Sarney, nos anos 80, e mantida pelos governos seguintes. O cenário global favorecia a discussão sobre uma nova agenda da ONU, travada pela questão da segurança durante a Guerra Fria.

O esforço do Itamaraty se intensificou durante as gestões dos dois chanceleres de Itamar Franco: Fernando Henrique Cardoso e Celso Amorim. O clima favorável a uma reforma da ONU, no entanto, mudou com os atentados de 11 de setembro de 2001, nos EUA.

Os ataques recolocaram a segurança na agenda global e a ONU entrou em crise. Na esteira da guerra ao terror, declarada pelo presidente americano, George W. Bush, os EUA atacaram o Iraque sem a aprovação do CS, em março de 2003.

Em agosto do mesmo ano, um atentado em Bagdá matou 22 pessoas, entre elas o alto comissário para os direitos humanos, o brasileiro Sérgio Vieira de Mello, um dos mais influentes funcionários da ONU e amigo pessoal do secretário-geral, Kofi Annan. "Chegou a hora de a ONU se renovar", disse Annan. "Sob o risco de se tornar irrelevante."

Durante os meses seguintes, o Secretariado da ONU recebeu mais de cem propostas para reformar a organização. Na ocasião, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se identificou com o tema e aproveitou a abertura dada por Annan para reforçar a reivindicação brasileira.

Em 2005, o Brasil formou o G-4, ao lado de Alemanha, Japão e Índia, para atuar em conjunto pela reforma do CS da ONU. A manobra, porém, não avançou em razão do contra-ataque diplomático de rivais regionais: México, Argentina, Itália, Espanha, Coreia do Sul e Paquistão criaram um grupo batizado de "Unidos pelo Consenso", que barrou a reforma.

Hoje, o CS da ONU tem 15 membros, sendo 5 permanentes e com poder de veto: EUA, Rússia, China, Reino Unido e França. Os outros dez integrantes são eleitos pela Assembleia- Geral para mandatos de dois anos.

Segundo o ministro do Interior do Chile, Andrés Chadwick, o apoio chileno à pretensão brasileira de se tornar membro permanente do CS da ONU é uma decisão de Estado do governo chileno - e não apenas do atual presidente. "Piñera já falou isso pessoalmente ao presidente Bolsonaro", afirmou o ministro.

Alinhamento

Bolsonaro foi recebido ontem por Piñera com honras militares no Palácio La Moneda, sede do governo chileno. Em seu discurso, ele se comprometeu a comparecer à COP-25, que será realizada no Chile, mas disse que o Brasil pode não aderir a acordos que serão firmados na conferência climática. "Não podemos assinar um acordo que não podemos cumprir. O Brasil não deve nada a ninguém em termos de preservação do meio ambiente. Temos esta preocupação, mas também a preocupação com o desenvolvimento", disse.

Venezuela

Um dia depois da polêmica causada pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) sobre "uso da força" na Venezuela, os presidentes do Brasil, Jair Bolsonaro, e do Chile, Sebastián Piñera, reiteraram "energicamente" o compromisso contra uma intervenção militar para derrubar o regime de Nicolás Maduro.

Para os governantes, o Grupo de Lima, formado por Brasil, Argentina, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai e Peru é o foro apropriado para a busca de uma saída diplomática.

Na declaração assinada ontem, os presidentes se comprometem a continuar trabalhando no âmbito do Grupo de Lima pela busca de uma saída democrática e pacífica para a crise venezuelana, rejeitando qualquer ação que implique em uso da violência, sobretudo a opção de intervenção militar.

Na véspera, Eduardo disse, em entrevista ao jornal chileno 'La Tercera', que, "de alguma maneira, vai ser necessário o uso da força" contra Maduro. Pouco depois, Bolsonaro desautorizou o filho e voltou a defender uma saída democrática para a Venezuela.

Embora rejeite a opção militar, o documento assinado por Bolsonaro e Piñera é duro em relação ao regime chavista quando pedem a realização de eleições presidenciais "livres e justas", conforme os padrões internacionais e sob observação internacional independente. Eles exigiram ainda a liberação de todos os presos políticos e o fim da violação dos direitos humanos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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