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Estudo encontra metais pesados em girinos do Rio Doce

Os pesquisadores alertam que a tendência é essa contaminação possa alcançar outros animais na cadeia alimentar

Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), na Bahia, constaram que girinos presentes no Rio Doce estão acumulando metais pesados da lama de rejeitos da Samarco. De acordo com os pesquisadores, essa ocorrência pode afetar a cadeia alimentar da Região. O estudo intitulado “Girinos como bioindicadores da qualidade da água do Rio Doce” teve início no segundo semestre de 2016 e os resultados foram publicados nesta quarta-feira (27).

Com o auxílio de peneiras, pesquisadores coletaram 1.500 girinos de 24 espécies em 14 pontos amostrais de seis municípios no Espírito Santo e 12 pontos em Aimorés e Mariana, em Minas Gerais, nos meses de setembro, novembro e dezembro de 2016. O que constataram foi que os girinos estão absorvendo e concentrando em seus organismos altos níveis de metais pesados como Ferro, Bário, Cádmio, Manganês, Zinco, Níquel, Cromo, Alumínio, Cobre e Titânio. Quanto maior a concentração de metais na água, maior a quantidade de metal bioconcentrado nos tecidos dos girinos. Isso se mantém durante a vida adulta.

Anfíbios anuros, como sapos e rãs, possuem duas fases distintas de vida: uma aquática (como girinos) e uma terrestre (quando adultos). Em função de suas peles permeáveis e extremamente sensíveis, funcionam como bioindicadores da qualidade ambiental do local em que vivem.

Devido a esse alto potencial acumulador, os pesquisadores alertam que a tendência é essa contaminação alcançar outros animais na cadeia alimentar. “Os resultados sugerem o comprometimento de uma parcela significativa da comunidade faunística silvestre da região”, afirma o relatório.

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Mesmo os pontos de amostra que não tiveram contato com o rejeito da barragem também apresentaram girinos contaminados. “Isso pode ser explicado pela contaminação através do lençol freático. Após um pouco mais de um ano, quando foram feitas as coletas deste trabalho, a contaminação pode ter expandido além dos limites da lama”, relatam os pesquisadores. Eles destacam que, diferentemente do que estipulava o Estudo de Impacto Ambiental (EIA-Rima) da empresa, o estrago foi muito além das áreas de influência previstas tecnicamente. Foram mais de 660 km de desastre, chegando até a foz.

Segundo a coordenadora da pesquisa, a doutora em Zoologia e professora de Biologia da UEFS Flora Acuña Juncá, não há dúvidas de que o ferro absorvido pelos girinos seja produto do desastre, ainda que o mineral seja abundante na região. “O Ferro compõe as rochas e para ficar disponível no meio ambiente é necessário o processamento desse minério. A liberação de concentrações nessa magnitude só é possível em caso de contaminação pontual, proveniente de descarte do resíduo sem nenhum tratamento. Mesmo com o histórico de mineração na área e possíveis contaminações em menor escala no passado, o Ferro não permaneceria disponível para contaminar os girinos da maneira registrada por nós”, explica. Ela ressalta ainda que as amostras de sedimentos e de girinos provenientes de todos os pontos apresentaram altos níveis de vários metais, e não apenas para Ferro.

O Ibama registra na região 28 espécies de anuros de sete famílias. O número de espécies coletados em cada ponto de amostra variou de um a sete. O que se observou foi que aqueles pontos contaminados pela lama tiveram uma diversidade menor de espécies.

“Todas as poças sem contato direto com o rejeito apresentaram girinos de Elachistocleis cesarii, indicando que o período de coleta foi mais ou menos coincidente com período reprodutivo da espécie. Nenhuma poça que teve contato direto com o rejeito, entretanto, mostrou a presença de girinos desta espécie”, relatam os pesquisadores.

“A pesquisa evidencia a extensão e a complexidade dos impactos do desastre causado pela Samarco, que afetam todo um ecossistema e aqueles que dependem dele. Esperamos que estudos como este aprofundem as discussões e auxiliem a aplicação de políticas públicas a favor da recuperação das áreas degradadas e da reparação aos atingidos”, afirma Fabiana Alves, da campanha de Água do Greenpeace.

Este é o último dos seis estudos independentes encomendados pelo Greenpeace e financiados com recursos de doações arrecadadas pelo projeto coletivo Rio de Gente.

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