JULGAMENTO DO CASO MILENA GOTTARDI

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Caso Milena Gottardi: após quase 12 horas de depoimento, delegado dá detalhes sobre investigação

Janderson Lube, que conduziu o inquérito sobre o crime, começou a ser ouvido às 10h05 e terminou de responder aos questionamentos às 21h41

Rodrigo Araújo , Marcelo Pereira

Redação Folha Vitória
Foto: Divulgação

O delegado da Polícia Civil Janderson Lube foi a única testemunha ouvida nesta quarta-feira (25), terceiro dia do julgamento dos seis acusados de participação no assassinato da médica Milena Gottardi. O depoimento do delegado, que conduziu as investigações sobre o crime, ocorrido em setembro de 2017, durou cerca de 11 horas e 40 minutos.

Janderson começou a ser ouvido às 10h05 e terminou de responder aos questionamentos às 21h41. O julgamento do caso será retomado na manhã desta quinta-feira (26), a partir das 9 horas, no Fórum Criminal de Vitória, na Cidade Alta, Centro da capital.

O irmão de Milena Gottardi, Douglas Gottardi, que deveria ter prestado depoimento nesta quarta-feira, será o primeiro a ser ouvido nesta quinta.

Em seu depoimento, Janderson Lube destacou os principais pontos envolvendo as investigações sobre o assassinato de Milena Gottardi, morta com um tiro, no estacionamento do Hospital das Clínicas, em Vitória, no dia 14 de setembro de 2017. Ele contou que concluiu o inquérito em 35 dias.

Segundo o delegado, Esperidião Frasson, ex-sogro de Milena e acusado de ser um dos mandantes do assassinato da médica, teria tentando matar a vítima em uma outra ocasião. A informação foi obtida por meio do depoimento dado na época por Valcir da Silva Dias, acusado de ser um dos intermediadores do crime. 

Ainda de acordo com o delegado, Esperidião não aceitava a separação de Milena e do filho dele, o ex-policial civil Hilário Frasson, por ter ajudado a médica financeiramente enquanto ela estava em São Paulo fazendo seu curso de residência.

Janderson Lube também disse que chamaram a sua atenção, durante as investigações, as ligações telefônicas feitas entre os réus na véspera e no dia do assassinato de Milena.

Foto: Arte/Julio Lopes

Também surpreenderam as pesquisas em sites pornográficos feitas por Hilário cerca de 48 horas depois da morte da ex-esposa. Segundo Lube, ele procurava principalmente pelos termos "esposa" e "loirinha".

O delegado ainda estranhou o fato de Hilário ter feito uma escala especial de trabalho na Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) após o crime. Ele entendeu o ato como se o acusado quisesse estar nas equipes de plantão para entender a dinâmica das investigações sobre homicídios.

Leia também: Hilário pediu ajuda a juízes durante processo de separação com Milena, diz delegado

Bruno sabia que moto seria usada em crime

O delegado também narrou o envolvimento de cada um dos seis réus no crime, dando respaldo à denúncia do Ministério Público Estadual (MPES).

Segundo ele, Bruno Rodrigues Broetto forneceu a moto utilizada por Dionathas Alves Vieira assassinar a médica. Os dois são cunhados. De acordo com o delegado, Bruno sabia que o veículo seria utilizada em um homicídio, mas não sabia quem era a vítima.

Dionathas confessou que atirou em Milena e admitiu ter mantido contato com Valcir e Hermenegildo Palauro, outro acusado de intermediar o crime. A quebra do sigilo telefônico foi fundamental para colocá-lo no local do crime.

O advogado Leonardo da Rocha Souza, responsável pelas defesas de Dhionatas e Bruno, falou sobre a importância do depoimento do delegado responsável pelo caso para esclarecer alguns fatos.

"Ele disse o que o levou a indiciar todas essas pessoas para que todos os senhores jurados, que não tiveram acesso a 16 volumes de processo, quase 5 mil páginas, tenham condições de ouvi-lo e formar a sua convicção", afirmou.

Ainda segundo o delegado, Hermenegildo teria escondido em um fazenda dele a moto usada no crime. Além disso, trocou mensagens de áudio com Valcir depois da prisão de Esperidião, e forneceu a arma usada por Dionathas.

Janderson Lube disse também que Valcir tinha um histórico de ligações telefônicas entre os réus. A quebra do sigilo telefônico colocou ele no local do crime. Segundo o delegado, provavelmente para apontar qual era o carro de Milena para Dionathas.

Hilário ligou para Milena para saber onde ela estava

As investigações apontaram ainda que Esperidião tinha ligação próxima com Valcir e Hermenegildo. Janderson Lube afirmou no depoimento que, motivado pelo ódio da separação entre Milena e Hilário, Esperidião teria planejado o crime em conjunto com os réus.

Segundo o delegado Hilário ficou responsável de fazer contato com Milena no dia do crime. Em seguida, comunicou ao pai onde ela estava. Esperidião, por sua vez, ligou para Valcir e repassou a informação.

De acordo com a testemunha, contra Hilário pesa o fato de ter ligado para o pai informando onde Milena estava pouco antes do crime, e de ter deletado o telefone de Valcir da agenda um dia antes.

Delegado diz que Hilário odiava Milena e causa tumulto

Foto: Reprodução/Facebook

Em um fato curioso, a sessão precisou ser suspensa por cerca de dez minutos depois de um bate-boca entre os advogados. Ele foi causado por uma fala da testemunha, que apontou para Hilário e disse que ele odiava Milena.

"Esses depoimentos confirmam toda a prova produzida no processo, que o acusado Hilário e seu pai contrataram os demais réus de modo a ceifar a vida de Milena. Hilário não aceitava, de forma nenhuma, o fim do casamento. Era um sociopata que não queria perder o seu 'objeto', de que achava que tinha posse. Em razão disso, em razão da manifestação de Milena em se divorciar, foi tramado todo esse cenário de horror que acabou com a vida dela", afirmou o advogado da família de Milena e assistente de acusação, Renan Salles.

Durante o depoimento do delegado, Hilário permaneceu fazendo anotações. O mesmo foi feito por ele nas oitivas desta terça-feira (24). O juiz que preside o julgamento esclareceu que este é um direito garantido, como uma forma de comunicação entre réu e defesa.

O delegado, no entanto, confirmou que Hilário não tentou prejudicar as investigações. Disse que ele entregou o próprio telefone celular e cadastrou a mesma linha com outro aparelho.

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Defesa de Hilário faz questionamentos a Janderson Lube

Já na parte final do depoimento, os advogados de Hilário perguntaram sobre as ligações telefônicas do réu no dia do crime. Questionaram se não era normal um filho ligar para o pai. 

O delegado rebateu,  respondendo que normal não era um filho ligar para o pai e o pai ligar para o intermediário do crime naquele momento.

Ainda sobre as ligações telefônicas, Janderson Lube disse que não se recordava se havia tido diálogo entre Hilário e Valcir, apontado como intermediário, após o crime.

A defesa também questionou o número de reportagens e matérias jornalísticas que o delegado anexou no processo investigativo. Queriam saber se o delegado se pautava pela imprensa. 

O delegado disse que fez essa inclusão de material para mostrar a grande repercussão do crime. "As provas são obtidas mediante investigação", diferenciou.

O trabalho investigativo foi então questionado. Os advogados de Hilário quiseram saber se o ritmo da investigação era diferente na DHPP de Vitória quando se tratava de crime de grande repercussão.

Lube disse que, no caso do assassinato de Milena Gottardi, a produção de provas estava fluindo conforme a investigação avançava. "De sábado para domingo, já havia mandados de prisão expedidos. É natural na rotina da delegacia que se dedicassem a tempo maior quando as investigações traziam mais resultados".

O delegado ainda disse que as matérias jornalísticas anexadas no processo investigativo serviam apenas de ilustração para aquele momento específico. "Elas ajudam também na divulgação de informações para que as pessoas façam um retrato falado, por exemplo, e para esclarecimento dos fatos".

Em seguida, as perguntas se concentraram no relacionamento entre Milena e Hilário.

Hilário queria reatar casamento

O delegado confirmou que, da parte de Hilário, havia um desejo de reatar o casamento. Ele teve conhecimento disso a partir dos depoimentos de uma policial civil, da médica Isabel Lima dos Santos (que viu Milena ser morta) e da advogada Ana Paula Morbeck (que atendeu Milena no processo de divórcio).

Eles questionaram se Hilário, que foi apontado como sendo um homem possessivo, fez algo contra Milena no período em que ela morou dois anos em São Paulo, para fazer uma especialização médica. "Eu não tenho conhecimento de algum desfavor para a doutora Milena", respondeu o delegado.

O delegado também disse que não se recordava de mensagens agressivas entre Hilário e Milena, e que o nome da médica, no celular do acusado, era gravado como "Meu Amor".

Janderson fala do trabalho de Hilário na Polícia Civil

A atitude de Hilário diante das investigações também foi explorada pela defesa. O delegado respondeu que o réu não esboçou reação contrária aos trabalhos de investigação e que não foi violento ou grosseiro diante das investigações.

A defesa também quis saber o que a investigação da polícia tinha apurado sobre a conduta de Hilário como policial civil.

Foto: Divulgação

Janderson Lube disse que Hilário trabalhava no setor administrativo e que o único fato que chamou a atenção foi quando Hilário se queixou do sumiço de uma quantia de dinheiro da gaveta dele no trabalho.

Hilário ingressou na polícia em fevereiro de 2017. O delegado disse que era pouco tempo de casa para traçar um perfil profissional.

O delegado disse que o que chamou a atenção foi Hilário se voluntariar para fazer parte do plantão da Delegacia de Homicídios. No dia da prisão, ele trabalhava em Cariacica.

Sobre a garota de programa que Hilário teria procurado dias após a morte de Milena, o delegado disse que a polícia não conseguiu encontrá-la. 

A defesa também quis esclarecer se existia alguma orientação contrária da polícia sobre exibir arma de forma ostensiva. O delegado disse que não havia uma orientação propriamente dita. "Mas, na prática, quando não se está uniformizado ou durante uma operação, o natural é manter a arma velada".

A pergunta fazia referência aos depoimentos de pais da escola das filhas de Milena que reclamaram quando Hilário ostentava a arma ao ir buscar as crianças.

Por fim, a defesa do réu perguntou se a investigação possuía algum registro de que Dionathas havia mencionado Hilário como mandante do assassinato de Milena. O delegado respondeu que não se recordava, e os trabalhos foram encerrados às 21h42.

Acusação e defesa avaliam depoimento de delegado

Ao fim do depoimento, o promotor do Ministério Público Estadual (MPES), Rodrigo Monteiro, destacou que as informações trazidas pelo delegado reforçam o argumento da acusação.

"Foi um depoimento muito longo, de quase 12 horas, mas o dr. Janderson esclareceu muitos pontos que, na perspectiva da acusação, já estão bem esclarecidos. A defesa tentou, o tempo todo, fazer perguntas repetitivas, para tentar buscar algumas respostas que eram de interesse da defesa, mas dr. Janderson foi firme, sempre respondendo de acordo com a prova, de acordo com aquilo que foi produzido no caderno probatório, deixando claro que não é interesse de ninguém prejudicar qualquer que seja o réu. Nosso interesse é a busca da justiça", completou.

Já o advogado de defesa de Hilário, Leonardo Gagno, destacou que, apesar de ter sido o delegado responsável pela investigação do assassinato de Milena Gottardi, Janderson Lube admitiu não ter ido pessoalmente ao local do crime.

"Durante o depoimento do delegado, os advogados de defesa também tiveram a oportunidade de fazer perguntas a ele. Em uma das respostas, o delegado assumiu que não esteve no local no dia do crime. No entanto, como o próprio delegado confirmou durante em sua fala, ele foi responsável por toda a investigação. Portanto, muito embora tenha sido o dr. Janderson o delegado responsável por conduzir as investigações que levou à prisão dos acusados, ele hoje relatou aos jurados que não esteve no local do crime no dia do fato", frisou.


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