JULGAMENTO DO CASO MILENA GOTTARDI

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Mesmo que seja condenado, Hilário terá direito à metade do patrimônio de Milena Gottardi

Advogada da médica no processo de separação com o ex-policial civil, Ana Paula Morbeck informou, em depoimento, que os dois eram casados em regime de comunhão universal de bens

Rodrigo Araújo , Marcelo Pereira

Redação Folha Vitória
Foto: TV Vitória

A advogada Ana Paula Morbeck, que representou Milena Gottardi no processo de divórcio dela com o ex-policial civil Hilário Frasson, foi a terceira testemunha a depor nesta terça-feira (24), no júri popular dos acusados de participar do assassinato da médica.

Ana Paula esclareceu que, mesmo se for condenado por ser um dos mandantes do assassinato de Milena Gottardi, Hilário terá direito a 50% do patrimônio de Milena, inclusive a herança deixada pelo pai da médica.

Isso porque, segundo a advogada, os dois eram casados em comunhão universal de bens, ou seja, tudo o que o casal possuía deveria ser compartilhado igualmente entre ambos, mesmo os bens adquiridos antes do casamento.

Em seu depoimento, Ana Paula disse que Milena ficou chateada ao descobrir que teria que dividir a herança do pai com o ex-marido. 

Segundo ela, na época, a médica não sabia que casamento em comunhão universal de bens envolvia todos os bens do casal, inclusive os de antes do matrimônio.

De acordo com a testemunha, Milena confiava em Hilário em questões jurídicas, porque ele é formado em Direito. Por isso, teria ficado muito chateada em ter que dividir a herança do pai com Hilário, pois ele nunca havia falado isso com ela.

"Milena queria se separar, pois temia pela própria vida"

A advogada também contou que Milena a procurou porque estava decidida a se separar de Hilário, pois se sentia ameaçada e vigiada por ele. Segundo Ana Paula, a médica se preocupava e temia pela própria vida porque, nas palavras dela, na família de Hilário havia tido um caso de assassinato por causa de separação.

"Ela disse que tinha medo porque na família dele tinha uma cunhada que havia sido morta pelo pai e pelo tio do Hilário por querer se divorciar", contou.

A advogada disse ainda que Milena não tinha preocupação com bens materiais e financeiros. Tanto que, no acordo para o divórcio com Hilário, Milena teria aberto mão de pedir de 30% a 40% do salário do então policial civil, para pagar a pensão das filhas. 

Segundo Ana Paula, Milena pediu apenas 15% do dinheiro, o que surpreendeu a advogada. "Ela disse que queria se separar e viver a vida livre de Hilário e com as filhas", relatou.

Entretanto, o maior medo da médica, segundo a advogada, era a influência de Hilário junto a juízes, o que poderia ser usado para ele tirar a guarda das filhas da ex-esposa. 

Ana Paula disse que Milena constantemente falava que Hilário ameaçava tirar as filhas dela, caso a médica insistisse no divórcio.

Advogada só soube de carta após morte da médica

A advogada, então, sugeriu que a vítima saísse de casa e entrou com uma requisição de tutela, para Milena ter a guarda das crianças. A liminar foi obtida em abril de 2017, cinco meses antes do crime.

Em seguida, Milena disse à advogada que iria registrar um documento em cartório, para se resguardar e orientar sobre o que deveria ser feito caso alguma coisa acontecesse com ela. 

No entanto, a advogada não sabia do que se tratava esse documento. Segundo Ana Paula, somente após a morte de Milena Gottardi, ela ficou sabendo que esse documento se tratava da carta em que Milena contava de sua vida com Hilário.

Foto: Reprodução

A testemunha contou que, no dia 15 de setembro de 2017, um dia após o crime, uma prima da vítima, Shintia Gottardi de Almeida, ligou para ela e falou que precisava se encontrar com a advogada, para lhe mostrar algo. Tratava-se da carta registrada por Milena.

Segundo Ana Paula, no encontro, que também contou com a participação de tios da vítima, todos choraram ao ler a carta escrita por Milena, inclusive a própria advogada. Ela disse que a carta tinha mais informações do relacionamento dos dois do que a própria médica conseguia verbalizar. 

"É um documento que traz momentos de uma pessoa que passou por muita opressão, por muito sofrimento durante o casamento", afirmou.

Sobre o e-mail que Milena teria enviado para Hilário um dia após conseguir a liminar que a permitia sair de casa com as filhas, a advogada afirmou que ele não condiz com a realidade do que acompanhou de sua cliente.

O e-mail foi incluído nos autos, pela defesa de Hilário Frasson, na tentativa de inviabilizar o conteúdo da carta registrada por Milena. No e-mail, a médica teria se mostrado confusa com a situação e disse ter se precipitado em procurar a Justiça.

Ana Paula afirmou que Milena estava muito decidida a se separar de Hilário porque não queria que as filhas sofressem com o comportamento autoritário e agressivo do ex-marido.

"Ela disse que ele reagia com agressividade com a mais velha, à medida que era contrariado. A Milena não queria que o comportamento dele se repetisse com a filha mais nova e, por isso, queria se separar do Hilário", contou.

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Julgamento pode durar uma semana

O julgamento dos réus, de acordo com o Tribunal de Justiça do Espírito Santo, pode, inicialmente, ter a duração de uma semana.

As etapas dos trabalhos podem durar mais tempo devido ao número de réus e de testemunhas. Serão 29 ao todo, sendo 19 convocadas pelas defesas dos acusados e 10, pela acusação.

Estão no banco dos réus Hilário Frasson, Esperidião Frasson, Dionathas Alves, Hermenegildo Palauro Filho, Valcir da Silva Dias e Bruno Broetto.

Ao chegar no Fórum de Vitória nesta terça-feira, a mãe de Milena Gottardi, Zilca Maria Gottardi, falou sobre a decisão de deixar o júri após a entrada dos réus no primeiro dia de julgamento.

O advogado de defesa de Hilário Frasson, Rodrigo Bandeira de Melo, também conversou com a imprensa antes de entrar para o julgamento.

Ele destacou que o primeiro dia foi marcado por depoimentos emocionantes e espera um julgamento tranquilo e respeitoso.

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Entenda a participação dos acusados na morte de Milena

Foto: Arte/Julio Lopes

O assassinato de Milena Gottardi aconteceu na tarde do dia 14 de setembro de 2017 e ganhou grande repercussão no Espírito Santo. A vítima atuava como pediatra oncológica no Hospital das Clínicas, em Maruípe, Vitória.

Quando saía de um plantão, acompanhada de uma amiga, a médica foi abordada, no estacionamento do hospital, por um homem armado, que chegou a anunciar um assalto.

Milena e a amiga chegaram a entregar os pertences ao suposto assaltante. Quando elas se dirigiam ao carro, o criminoso atirou três vezes em direção à pediatra, atingindo a mesma na cabeça e na perna, e fugiu posteriormente. A médica foi socorrida e internada em um hospital, mas morreu no dia seguinte.

A Polícia Civil agiu rápido e, dois dias após a médica ser baleada, dois suspeitos de envolvimento no crime foram detidos: Dionathas Alves Vieira, acusado de ser o executor do crime, e Bruno Rodrigues Broetto, apontado pela polícia como o responsável por conseguir a moto utilizada por Dionathas no dia do assassinato.

A prisão dos suspeitos aconteceu praticamente ao mesmo tempo em que o corpo de Milena era sepultado em Fundão, município onde a médica nasceu e foi criada e onde grande parte de sua família ainda mora.

Com a prisão da dupla, a polícia começou a desvendar o crime e provar que Milena não havia sido vítima de um latrocínio — como fez parecer o autor dos disparos — mas sim de um crime de mando. Faltava, no entanto, chegar aos mentores do assassinato.

Para conseguir as provas necessárias, a Polícia Civil conseguiu, junto à Justiça, que as investigações corressem sob sigilo. Isso porque o principal suspeito de encomendar a morte de Milena era o ex-marido dela, o então policial civil Hilário Antônio Fiorot Frasson, que atuava como assessor técnico do gabinete do Chefe da PC, Guilherme Daré.

A ideia da Secretaria de Estado da Justiça (Sesp) era justamente impedir que Hilário tivesse acesso às provas obtidas pela Delegacia Especializada em Homicídios Contra a Mulher (DHPM), que conduzia o inquérito.

A prisão de Hilário aconteceu no dia 21 de setembro, exatamente uma semana depois do assassinato de Milena. Ele foi preso na Chefatura da Polícia Civil e encaminhado para um anexo da Delegacia de Novo México, em Vila Velha, onde ficam os policiais civis que são presos.

Mais cedo, no mesmo dia, a polícia havia prendido o pai dele, Esperidião Carlos Frasson, apontado como o outro mandante do crime, e Valcir da Silva Dias, acusado de ser um dos intermediadores do assassinato.

Segundo a polícia, o outro intermediador foi Hermenegildo Palauro Filho, o Judinho, que foi preso no dia 25 de setembro.

Hilário, Esperidião, Valcir, Hermenegildo e Dionathas foram denunciados pelos crimes de homicídio qualificado, feminicídio e fraude processual. Já Bruno responde pelo crime de feminicídio.

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