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Barrada em concurso, professora autista briga na Justiça por vaga

A educadora foi aprovada na seleção em uma vaga destinada a pessoas com deficiência, tomou posse com liminar e foi exonerada após perícia médica

Guilherme Lage

Redação Folha Vitória
Foto: Divulgação

Aprovada em concurso público da Secretaria de Educação do Espírito Santo (Sedu) em 2022, a professora de História Marina Vieira Lana, de 30 anos, relata ter sido barrada no cargo por ser autista. A decisão ocorreu na última quarta-feira (18). 

A professora foi aprovada no concurso em uma vaga destinada a pessoas com deficiência, e chegou a ser impedida de tomar posse após perícia médica, que a considerou inapta para exercer o cargo. 

De acordo com a educadora, a recusa ocorreu quando foram avaliados o laudo médico e teste neuropsicológico, que atestavam o autismo. Nesta perícia, segundo a professora, houve constrangimento e perguntas invasivas. 

"No meio do ano passado, quando o edital convocou para comprovar a deficiência, levei o meu laudo médico e o teste neuropsicológico. Passei para o cargo de professora  de história, mas a perícia achou importante perguntar se eu sabia cozinhar ou se eu possuía relacionamentos", relatou.

Após a eliminação, a professora entrou com uma ação na Justiça, que concedeu liminar favorável à posse da profissional, mas no fim do ano, foi novamente barrada pela perícia. 

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"No fim do ano, quando os candidatos, PCD e ampla concorrência, foram convocados para entregar alguns exames, a perícia me barrou pelo mesmo motivo. Tive que acionar a Justiça de novo, que dessa vez determinou multa e investigação de crime de desobediência, caso eu não conseguisse tomar posse", relatou. 

Após a liminar, Marina conseguiu tomar posse, mas conta que a segunda perícia não foi menos estressante do que a primeira. A secretaria alegava não ter sido informada sobre a decisão da Justiça, mas de acordo com a professora, nesta mesma época, o Estado já havia recorrido. 

Professora tomou posse em janeiro

Depois da decisão, a professora tomou posse no dia 3 de janeiro, e em maio deste ano passou a exercer o cargo de professora coordenadora na área de pessoas com deficiência auditiva (PCA).

Segundo a profissional, sua primeira avaliação do estágio probatório foi de 92% de aprovação do trabalho, mas um desembargador de Vitória, deu razão ao Estado, o que causou a queda da liminar e a exoneração. 

De acordo com ela, a perícia teria alegado misofonia, que é uma forte aversão a certos sons, para efetuar a exoneração. 

"A perícia alegou a misofonia como um impedimento. Mas sequer questionou quais barulhos podem me incomodar. Não é tudo o que incomoda. E também não é o tempo todo", contou. 

Autismo não era impeditivo em outros empregos

Marina foi diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista tardiamente, aos 27 anos. E, como conta, a condição nunca foi um impeditivo para o exercício profissional em outros empregos. 

Ela, que também é graduada em jornalismo e tem pós-graduação em História, afirma que muitos de seus ex-colegas sequer sabiam de sua condição. 

"Eu cresci sem diagnóstico, então nunca tive apoio na escola. Estudei em escola regular a vida inteira. Cursei Jornalismo, depois vim pro Espírito Santo e fiz História, licenciatura e bacharelado, na Ufes. Também tenho pós. Como é que posso ser considerada incapaz?", indagou. 

Além disso, a profissional também atua como professora de Designação Temporária (DT) na Prefeitura de Vitória há um ano. 

Profissional recorreu da decisão

Marina relatou que o advogado já recorreu da decisão e que por enquanto, resta apenas esperar. Além disso, outros dois professores teriam sido afastados pela mesma condição. 

"O problema é que, enquanto isso, fico sem o emprego, que é meu por direito, e sem o salário. Fora que o afastamento foi um desfalque pra escola e pras turmas que eu lecionava. Fui afastada de um dia pro outro. Outros dois professores foram afastados pelo mesmo motivo, o que deixa tudo ainda mais revoltante", disse. 

Por meio de nota, a Sedu informou que o edital prevê a desclassificação do candidato PCD que não por aprovado na perícia médica. Ainda de acordo com a Secretaria, todas as regras seguidas no edital foram respeitadas. Confira a nota na íntegra. 

"A Sedu informa que todas as informações referentes ao concurso Seger/Sedu n° 01/2022 constam no Edital 01/2022, inclusive prevê a desclassificação do candidato PCD que não for aprovado na etapa de perícia médica, que é feita pelo IPAJM. A secretaria informa, ainda, que essa fase é realizada por médicos peritos, trabalho esse que consiste em avaliar a capacidade laboral do candidato/servidor, e que também seguiu regras estabelecidas no edital de abertura e nas legislações de amparo vigente."

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