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Educação infantil: por que o brincar é tão importante?

Criança que brinca produz conhecimento. Brincadeiras são importantes para o desenvolvimento de outras competências e habilidades, como a própria alfabetização

Ariani Caetano

Redação Folha Vitória

“Não existe educação infantil sem estar pautada pelo brincar.” A afirmação é da diretora pedagógica da Escola Novo Mundo, Mara Stella Zanotti, que há 17 anos atua com educação infantil numa abordagem sociointeracionista. O brincar, no caso, é produzir materiais, modelar de massinha, explorar texturas diferentes, estar na areia. 

“Quando a gente proporciona isso à criança, a gente percebe que o resultado é mais visível, e a criança fica feliz, pois acha que está sempre brincando”, afirma.
Foto: Divulgação

O brincar livre precisa, entretanto, estar associado às brincadeiras mediadas e aos jogos simbólicos, que são o famoso faz-de-conta.

“Os jogos são importantíssimos a partir de determinada idade porque trazem a regra e fornecem a base para a criança lidar com frustrações, com o trânsito, a fila do banco, situações cotidianas. A brincadeira proporciona isso. Eu não abro mão do brincar, e essa é uma premissa da Escola Novo Mundo desde sempre.”

A educação infantil como espaço e tempo do brincar não é uma abordagem nova. O psicólogo Lev Semionovitch Vigotski (1896-1934), proponente da psicologia histórico-cultural, foi pioneiro no conceito de que o desenvolvimento intelectual das crianças ocorre em função das interações sociais e condições de vida.

Nos seus relatos sobre a brincadeira infantil, ele afirmava que essa é uma situação imaginária criada pela criança e na qual ela podia, no mundo da fantasia, satisfazer desejos até então impossíveis para a sua realidade. Para ele, o brincar “é imaginação em ação”.

No Brasil, o educador Paulo Freire (1921-1997) defendia que o brincar é indispensável à saúde física, emocional e intelectual da criança. Para ele, estamos sempre construindo e, ao construirmos, aprendemos, e se aprendemos estamos buscando algo que possa nos levar a viver enquanto tenhamos vida.

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Ambiente brincante é ambiente alfabetizante

Para aprender a ler e escrever, a criança precisa, antes de tudo, brincar. Amassar e rasgar papel, encaixar pecinhas, mexer na areia, apertar botões... Tudo isso é fundamental para deixar em dia a coordenação motora fina, que é o que vai permitir que a criança consiga pegar no lápis e desenhar as letras, por exemplo.

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“Leitura e escrita são um processo brincante. Para a criança, não existe a cobrança do certo e do errado, então, para ela, está tudo certo. Para crianças de um grupo 3, por exemplo, o importante é interagir, adquirir autonomia, e isso é um grande brincar. O brincar está presente na rotina da escola o tempo todo. E a escola precisa ter esse olhar”, defende Mara.

O brincar é importante para trabalhar a memória, a concentração, o tempo de atenção. O resultado é uma criança predisposta à aprendizagem.

“Criança feliz aprende, tem muito mais vontade de fazer e vai buscando seu conhecimento. O brincar precisa estar comandando o tempo todo, mesmo que dentro de uma sala de aula com uma atividade sistematizada.”

Brincadeira levada a sério

Não é porque o brincar é uma premissa da educação infantil que ele deve ser proposto de qualquer maneira, sem intenção ou método. Brincadeira na escola é coisa séria. Mara afirma que brincar não pode ser confundido com deixar a criança solta, fazendo o que quer. Pelo contrário, é apresentar à ela algo com muito significado. 

“E o que é mais significativo para a criança? Justamente o brinquedo, a brincadeira.”
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Essa proposição tem respaldo na neuroeducação, na neuropedagogia e na neuropsicologia, além de ser uma demanda da própria contemporaneidade. 

“Hoje temos uma era tecnológica, os pais saem para trabalhar e têm cada vez menos tempo com os filhos. As telas tomam um tempo muito grande da vida dessas crianças. Então, se a escola não resgatar o brincar que nós perdemos, a criança vai brincar onde, quando e como? A educação infantil precisou abraçar isso com muita força para devolver às crianças a possibilidade de brincar”, explica Mara.

Parceria escola-famílias

“Brincar com crianças não é perder tempo, é ganhá-lo; se é triste ver meninos sem escola, mais triste ainda é vê-los sentados enfileirados em salas sem ar, com exercícios estéreis, sem valor para a formação do homem”, disse Carlos Drummond de Andrade.

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E brincar com crianças e deixá-las brincar é coisa da escola e das famílias, para se fazer no ambiente escolar, mas também dentro de casa. 

“Nossa base é sociointeracionista, acreditamos que a interação precisa acontecer o tempo todo. Os professores têm essa visão de que precisam deixar a crianças interagir para construir conhecimento junto com os pares. E em casa, o adulto pode ter essa abordagem também, estando perto, do lado, criando situações para a criança e deixando-a fazer as coisas, mesmo que seja mais demorado!”, considera Mara.

Na escola, os professores passam por formações continuadas para conseguirem incorporar o brincar às atividades do dia a dia e entenderem por que, para o cérebro, a recompensa é maior quando se brinca.

“A criança aprende ao transitar por um mundo de interações. Ela precisa interagir com o outro, na escola, dentro de casa, com a família. A mudança vem com as trocas. Ela aprende muito mais com as trocas”, acredita e defende Mara.
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