Em menos de um mês de mandato, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) cumpriu a primeira e uma de suas principais promessas de campanha: a assinatura do decreto que facilita a posse de armas de fogo no Brasil. A flexibilização foi assinada nesta terça-feira (15), durante cerimônia no Palácio do Planalto.
Com isso, será facilitada a obtenção de licença para manter armas em casa. Já o porte, que é o direito de andar com a arma na rua ou no carro, não foi incluído no texto. O decreto, antes mesmo de ser assinado, já levantava polêmicas e opiniões divergentes na área da segurança pública.
POSSE DE ARMAS NO ESTADO
De acordo com a Polícia Federal, no último levantamento disponível, 1.050 pessoas no Espírito Santo possuíam autorização para porte de arma de fogo válida emitida no SINARM. Esse número contempla apenas civis, não entram na conta policiais, juízes e promotores.
O número de pedidos triplicou nos últimos três anos. Enquanto em 2015 foram solicitados 432 registros de arma de fogo, até outubro de 2018, 1.723 civis capixabas haviam entrado com pedidos na Polícia Federal.
A Secretaria de Segurança Pública do Espírito Santo (Sesp-ES) e o governador Renato Casagrande foram procurados para falar sobre o decreto, mas não quiseram se posicionar.
QUEM É CONTRA E QUEM É A FAVOR
O jornal online Folha Vitória ouviu o ponto de vista de dois especialistas capixabas sobre o assunto.
CONTRA
Contrário à posse, o ex-secretário dos Direitos Humanos do Espírito Santo e professor do Departamento de Direito da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Julio Cesar Pompeu, afirmou que a medida não é a melhor forma de solucionar o problema da violência e usou como exemplo a morte do ex-governador Gerson Camata, assassinado no dia 27 de dezembro, em Vitória.
“Isso não é solução, é aceitar o problema e tentar de uma forma violenta conviver com ele e o risco é muito grande. É preciso dar o exemplo de que há punição para o mal e que praticá-lo não vale a pena. Nosso ex-governador foi assassinado por um homem que não tinha porte, mas tinha a posse de arma. Havia um processo se arrastando na Justiça há anos, então a pessoa foi lá e resolveu solucionar sozinha. O risco de acontecer casos como esse é muito maior. Há um problema que poucos discutem a forma de solucioná-lo”, afirmou.
A FAVOR
Por outro lado, o especialista em Segurança Pública e ´Presidente Capixaba de Segurança Pública, Patrick Oliveira, favorável à flexibilização, defende a posse, principalmente para donos de comércio. No entanto, ele destaca que é necessário fazer um processo rigoroso para a obtenção da arma.
“A gente é a favor da posse de armas, para que comerciantes, donos de empresas e estabelecimentos possam ter dentro de casa ou em seus negócios, mas não do porte. Somos a favor também desde que tenha um critério rigoroso para a obtenção, como um exame minucioso de tiro, por exemplo, um teste psicotécnico, pesquisa de antecedentes criminais e um processo para saber se a pessoa é apta a ter essa arma. Uma investigação criminal para saber se já se envolveu em problemas com a Justiça também é muito importante porque tudo isso vai criar barreiras para não haver a possibilidade de qualquer pessoa ter essa posse”, destacou.
CONTRA A POSSE DE ARMAS
“A minha questão com as armas não é só o decreto em si. Hoje, pela lei, você pode ter arma, mas os critérios são rigorosos, justamente para diminuir a circulação. O maior problema não é o acesso a arma, é a incapacidade de responsabilizar pessoas pelos crimes. Em um país em que as pessoas têm certeza de impunidade, aumentar o numero de armas nas ruas é muito perigosos.”
“O que tem ventilado é que essa flexibilização faz o contrário de exigir algum tipo de avaliação ou responsabilização. Imagina um país que tem o índice de violência doméstica que temos. Ter uma arma em casa facilita isso. Um outro ponto é a questão dos suicídios, que até pouco tempo discutimos sobre o aumento dos casos. Agora imagina com uma arma em casa também? Então é uma série de problemas. Em países que possuem deficiência em diversas áreas, uma arma pode potencializar ainda mais os problemas.”
A FAVOR DA POSSE DE ARMAS
“Quando a gente faz esse tipo de critério, você libera a arma para ela, mas ao mesmo tempo transfere uma responsabilidade imensa. Liberando a posse, tem que ser mais rigoroso com a legislação a respeito da impunidade, então tem que apertar nessa questão da responsabilização. Um outro fator é que nem todo mundo vai poder comprar uma arma. No final das contas, a pessoa vai gastar mais ou menos uns R$ 7 mil reais, considerando todo o processo de compra e realização de exames, por exemplo.”
“Eu acho que a posse não é o fator que vai diminuir a violência, mas o criminoso não vai conseguir furtar com tanta facilidade. Só que é importante lembrar também que não significa que isso vá diminuir a insegurança. Quando ao porte, ele libera a pessoa a transitar com a arma na rua e aí você pode ter não só um banho de sangue, como pode ver criminosos partindo para cima para obter esse tipo de arma, por isso ele já me preocupa mais.”
POSSE E PORTE: QUAL A DIFERENÇA?
Diante da flexibilização da posse de armas, os termos ‘posse’ e ‘porte’ ficaram ainda mais no centro das discussões, mas o que muita gente não sabe é que eles representam coisas distintas.
A posse, tratada no decreto de Jair Bolsonaro, refere-se à guarda de uma arma de fogo. A pessoa que a possui, pode ter uma arma no interior de sua residência, casa de férias ou até mesmo dentro de seu estabelecimento.
Por outro lado, o porte é o direito que uma pessoa adquire de circular com a arma de fogo e transportá-la nas ruas.