
A Justiça decidiu que o casal de ex-namorados acusado de realizar um aborto e ocultar o cadáver há 22 anos, em Vitória, não será mais punido pelo crime. O caso foi levado ao Tribunal do Júri nesta quarta-feira (26).
O julgamento é polêmico e emblemático e foi acompanhado por vários estudantes de Direito. O motivo da extinção da punição dos dois acusados é diferente para cada um deles. No caso de Elizabeth Ribeiro, a defesa buscou demonstrar que havia ocorrido um fenômeno raro no Direito: a prescrição punitiva.
“O Estado já havia perdido o direito de punir, diante da prescrição da pretensão punitiva plenamente configurada. Tratava-se de uma situação objetiva, reconhecida a partir do próprio conjunto processual, que não permitia mais a continuidade da persecução penal”, explicou a advogada Rayula Simonassi Bellinazzi.
O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) se manifestou favoravelmente à tese da defesa, que foi acolhida pelo juiz, e foi declarada a extinção da punibilidade de Elizabeth. Com isso, ela foi imediatamente liberada.
Veja o vídeo gravado pelos advogados de Elizabeth, Rayula Bellinazzi e Pablo Laranja:
Ex-namorado foi absolvido pelo júri
Em relação ao corréu, Wellington Rodrigues dos Santos, o caso foi apreciado pelo Tribunal do Júri, que votou pela absolvição dele. A advogada de defesa de Wellington, Suzana Baptista da Silva Motta Souza, explicou que quatro dos sete jurados abriram votando pela absolvição, o que exclui a necessidade de votação dos outros três.
A advogada relatou que seu cliente nega ter participado do aborto. “Ele não auxiliou com a compra do remédio, tampouco ajudou a ocultar o cadáver”, defendeu. Assim, tanto Elizabeth quanto Wellington estão livres da acusação.
A advogada de Elizabeth comemorou o resultado para sua cliente. “Para nós, tão importante quanto este desfecho foi a Elizabeth não precisar se sentar diante dos jurados para reviver um passado que já lhe custou lágrimas e estigmas, além de 14 dias no cárcere há treze anos”, relembrando o período em que a cliente chegou a ser presa pelo crime, em 2012.
Entenda o caso
O casal de ex-namorados foi a júri popular pelo crime de aborto e ocultação de cadáver nesta quarta-feira (26), no Fórum Criminal de Vitória. O caso aconteceu em 2003.
Segundo ação penal movida pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES), Elizabeth Ribeiro estava com quatro meses de gestação quando a ré e o namorado, o também réu Wellington Rodrigues dos Santos, decidiram interromper a gravidez.
De acordo com a denúncia, foi Wellington quem adquiriu o medicamento abortivo e entregou à então namorada, que o ingeriu, e o aborto foi consumado. O feto foi enterrado em uma vala no quintal de uma vizinha.
A vizinha também chegou a ser acusada pela participação no enterro, mas teve a punibilidade extinta em decisão de 2017, por prescrição do crime de ocultação de cadáver. Elizabeth chegou a ser presa em 2012, mas foi solta 14 dias depois. Wellington não chegou a ser preso.
Elizabeth teria supostamente realizado um segundo aborto, um ano depois do primeiro, mas a acusação sobre esse crime não foi em frente por falta de provas.
O crime de aborto é julgado pelo Tribunal do Júri por ser considerado um crime contra a vida, assim como homicídio, infanticídio e auxílio ou instigação ao suicídio. As penas para realização do aborto ou por provocar o aborto com o consentimento da gestante vão de um a quatro anos de reclusão.
Defesa afirmou que caso é sensível
A advogada de Elizabeth, Rayula Simonassi Bellinazzi, conversou com a reportagem do Folha Vitória e afirmou que esse tipo de julgamento é raro, e o caso é sensível por envolver questões morais e religiosas da sociedade.
Vários advogados teriam se recusado a assumir o caso, justamente por envolver uma questão tão polêmica. “É um caso bem delicado e sensível. Como advogada, é bem desafiador”, disse a advogada.
Belinazzi revelou, ainda, que sua cliente sofria possível violência por parte do então namorado, mas não ficou claro se essas violências teriam motivado a decisão da ré em realizar o procedimento.