
*Artigo escrito por Ana Cássia de Oliveira Barbosa, advogada especialista em Direito de Família, associada do escritório Motta Leal & Advogados Associados
A construção patrimonial representa uma das fases mais significativas da vida adulta, fruto de anos de trabalho, planejamento e dedicação. No entanto, tão relevante quanto conquistar bens é protegê-los de eventuais adversidades que podem surgir no decorrer da vida matrimonial.
A inobservância de cautelas jurídicas no momento da aquisição de um imóvel, nessa linha, pode gerar consequências indesejáveis, sobretudo quando um dos cônjuges vende um bem particular, durante o casamento, para adquirir novo imóvel e, posteriormente, ocorre o divórcio.
Antes de adentrar ao cerne da questão, convém esclarecer que, no Brasil, o regime de bens mais comum — e que se aplica automaticamente quando o casal não escolhe outro — é o da comunhão parcial de bens. Em termos simples, tudo o que for adquirido durante o casamento pertence aos dois.
A intenção do legislador, ao prever esse regime como regra geral, foi prestigiar o vínculo matrimonial, partindo do princípio de que, mesmo quando apenas um contribui financeiramente, o outro também participa ativamente da formação e manutenção do lar.
Há, contudo, exceções à comunhão de bens. Dado que, atualmente, o matrimônio tem sido adiado para etapas mais maduras da vida, é natural que um dos cônjuges ingresse na relação trazendo consigo bens adquiridos anteriormente.
A lei, sensível a essa realidade, reconhece que esses bens, adquiridos antes do casamento, pertencem exclusivamente a um dos consortes, ainda que o regime adotado seja o da comunhão parcial.
É o caso dos bens que cada pessoa já detinha antes do matrimônio, bem como daqueles recebidos por herança ou doação durante a união.
Também são excluídos da comunhão os bens adquiridos com recursos provenientes de patrimônio particular, ou seja, quando um dos cônjuges vende um bem que já era exclusivamente seu e utiliza esse valor para comprar outro.
Nesse caso, o novo bem substitui o antigo e mantém sua natureza particular — é o que o Código Civil chama de sub-rogação.
Mas, afinal, como resguardar, em caso de divórcio, o bem particular que deu origem à aquisição realizada durante o casamento? A resposta está em um detalhe muitas vezes esquecido: a cláusula de sub-rogação na escritura de compra e venda.
Quando o imóvel é adquirido com recursos provenientes de um bem particular, como a venda de um imóvel herdado ou recebido antes do casamento, é essencial que essa origem seja declarada na escritura pública.
É esse registro formal que assegura que o novo bem manterá sua natureza exclusiva, evitando que, no futuro, seja confundido com o patrimônio comum do casal. Sem essa menção expressa, o imóvel pode ser presumido como fruto do esforço conjunto, sujeitando-se à partilha igualitária.
A cláusula de sub-rogação, embora pareça apenas uma formalidade, é o instrumento que garante que aquilo que foi construído antes do casamento — com esforço próprio — permaneça protegido, mesmo diante das adversidades que, embora indesejadas, podem resultar na dissolução do vínculo conjugal.
