Flagra de carinho entre aves em Domingos Martins encanta e alerta sobre a natureza

O “beijo” no alto da árvore. Fotografar a natureza é, muitas vezes, um exercício de paciência e de conexão com o inesperado. E foi assim, quase sem querer, que me deparei com uma cena bem interessante.

Duas tiribas-de-testa-vermelha (Pyrrhura frontalis) no topo de uma árvore, em Domingos Martins, no Espírito Santo, trocando carícias, numa imagem que me remeteu instantaneamente à famosa fotografia do beijo entre um marinheiro e uma enfermeira, no fim da Segunda Guerra Mundial, feita por Alfred Eisenstaedt.

Mais do que palavras

A cena que registrei era simples e, ao mesmo tempo, cheia de ternura: as duas tiribas estavam interagindo calmamente entre si, em total sintonia com o ambiente e com a minha presença. Mesmo com a câmera apontada, elas não pareceram se incomodar.

Estavam ali, no alto de uma árvore da Mata Atlântica capixaba, trocando cuidados, alisando as penas uma da outra com os bicos — até que, num instante de pura delicadeza, seus bicos se encontraram em um gesto que parecia um beijo.

Na hora, me veio à cabeça a imagem icônica registrada em 1945 na Times Square. E por mais que a comparação pareça inusitada, o simbolismo de afeto, conexão e celebração da vida estava ali na minha frente.

Psitacídeos

As tiribas fazem parte de um grupo fascinante de aves, os psitacídeos, que inclui papagaios, maritacas e araras. São aves extremamente sociais, com comportamentos complexos e laços afetivos fortes entre os membros do grupo. Vivem em bandos, vocalizam bastante e, não raro, formam casais que permanecem juntos por toda a vida.

A troca de carinhos, como a que registrei, faz parte desses vínculos profundos. Além da limpeza mútua, os “beijos” entre bicos são uma demonstração de confiança, parceria e afeto.

Uma cena que desperta empatia

Muita gente, ao ver essa foto das tiribas, também sente algo familiar. Talvez seja o gesto de ternura. Ou talvez seja simplesmente o reconhecimento de que, em um mundo tão cheio de conflitos, esses momentos simples entre seres vivos nos oferecem uma espécie de acalento. Um lembrete de que existe cuidado entre os seres desse mundo caótico.

A fotografia como ponte

É por cenas como essa que sigo fotografando e contando histórias. Meu trabalho busca aproximar as pessoas da natureza e mostrar que ela não está distante de nós. As tiribas, como tantas outras espécies da Mata Atlântica, vivem em áreas ameaçadas, impactadas pelo desmatamento e pelo avanço urbano. Ao contar essas histórias, trazendo para perto de nosso sentimento, algo que conseguimos nos conectar, mas sem tirar sua essência selvagem, acredito que podemos despertar mais empatia e vontade de proteger.

Um beijo, um alerta

A cena pode ser bonita, mas por trás dela também está um alerta. As florestas que abrigam essas aves estão desaparecendo. E, com elas, vão também seus cantos, seus vínculos, sua beleza. Cada imagem que compartilho com vocês é um testemunho daquilo que ainda podemos preservar.

Como na foto famosa de 1945, o afeto também pode se tornar um símbolo de esperança.

Leonardo Merçon

Fotógrafo de Natureza, Cinegrafista e Produtor Cultural

Fundador e diretor voluntário do Instituto Últimos Refúgios, OSC ambiental/cultural sem fins lucrativos, que atua desde 2011 na divulgação e sensibilização ambiental, estimulando o diálogo entre sociedade, organizações ambientais, instituições privadas e governamentais. Fotógrafo de natureza, documentarista desde 2004, Merçon é focado na proteção da natureza, com Mestrado em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento sustentável pela ESCAS/Instituto IPÊ. Também formado em Design Gráfico pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Estudou fotografia voltada para publicações na Academia de Mídias e Artes, na Alemanha. O colunista acredita e trabalha em atividades de sensibilização ambiental (em especial com crianças) e fomento do turismo relacionado à natureza. Leonardo Merçon também tem dezenas de livros impressos e documentários em vídeo publicados. Realiza trabalhos ajudando a contar histórias por meio de imagens em mídias nacionais e internacionais, como a BBC de Londres e National Geographic Brasil, dentre outras.

Fundador e diretor voluntário do Instituto Últimos Refúgios, OSC ambiental/cultural sem fins lucrativos, que atua desde 2011 na divulgação e sensibilização ambiental, estimulando o diálogo entre sociedade, organizações ambientais, instituições privadas e governamentais. Fotógrafo de natureza, documentarista desde 2004, Merçon é focado na proteção da natureza, com Mestrado em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento sustentável pela ESCAS/Instituto IPÊ. Também formado em Design Gráfico pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Estudou fotografia voltada para publicações na Academia de Mídias e Artes, na Alemanha. O colunista acredita e trabalha em atividades de sensibilização ambiental (em especial com crianças) e fomento do turismo relacionado à natureza. Leonardo Merçon também tem dezenas de livros impressos e documentários em vídeo publicados. Realiza trabalhos ajudando a contar histórias por meio de imagens em mídias nacionais e internacionais, como a BBC de Londres e National Geographic Brasil, dentre outras.