Crianças do Clube de Observadores da Natureza Sabiá visitam a RPPN Guaribus, em Itaguaçu. Foto: Leonardo Merçon
Crianças do Clube de Observadores da Natureza Sabiá visitam a RPPN Guaribus, em Itaguaçu. Foto: Leonardo Merçon

Toda vez que entro em uma escola do interior para falar sobre observação da natureza, algo em mim se rearranja. Talvez porque eu saiba, por experiência própria, que o acesso à ciência, à cultura e às experiências fora do currículo tradicional não chega da mesma forma a todos. 

Não sei quantas oportunidades aquelas crianças têm de realizar atividades como às que propomos. Em alguns municípios do interior, muitas vezes cercados por florestas, rios e fragmentos de Mata Atlântica, a biodiversidade está ali, mas o convite para observá-la com atenção, com atenção e com um olhar de valorização, é algo que precisa ser fomentado com frequência.

Foi isso que senti em Itaguaçu, ao acompanhar as crianças do recém-criado Clube de Observadores da Natureza Sabiá, da EMIEIF Pedro Thomazini, em sua primeira saída de campo para a RPPN dos Guaribus. 

Consegui perceber que a escola valoriza esse tipo de atividade e que as crianças ali já possuíam o coração aberto para a natureza, imagino que graças aos professores e à diretora, que nos receberam de braços abertos. Bem como os representantes da Prefeitura, que fizeram questão de participar de todas as atividades.

Eles estavam atentos, curiosos, descobrindo aves, insetos, fungos e árvores como se estivessem abrindo um livro vivo. A frase “Tio, olha o que eu achei!” era uma constância em nossa caminhada. E eu adorei. Um lembrete poderoso do porquê faço o que faço.

Isso corrobora muito uma frase que sempre uso: “Entrar na floresta sem conhecer a natureza é a mesma coisa que entrar em uma biblioteca sem saber ler. Você não vai se interessar por nenhum livro e consequentemente, não vai valorizar a biblioteca!”

Então é importante que as crianças conheçam a natureza, para que ela faça mais parte de suas vidas e, consequentemente, se importem com ela.

A ciência cidadã como porta de entrada

Quando falamos em ciência, muita gente ainda imagina laboratórios distantes, universidades inacessíveis ou pesquisas feitas por “especialistas” que não vivem o território. A ciência cidadã rompe essa lógica. Ao incentivarmos cidadãos comuns a registrar a natureza, mostramos que eles também podem produzir conhecimento. E que o quintal de casa, a trilha próxima ou uma reserva particular como a RPPN dos Guaribus são espaços para serem investigados.

Crianças do Clube de Observadores da Natureza Sabiá visitam a RPPN Guaribus, em Itaguaçu. Foto: Leonardo Merçon
Crianças do Clube de Observadores da Natureza Sabiá visitam a RPPN Guaribus, em Itaguaçu. Foto: Leonardo Merçon

Em Itaguaçu, isso ganha um peso ainda maior. Antes do início de nosso projeto do Clube de Observadores da Natureza nas Escolas, o município figurava entre aqueles com menos registros de espécies na plataforma iNaturalist (uma das maiores plataformas de ciência cidadã do mundo)

E isso não era por falta de biodiversidade, mas por falta de oportunidade de observação, registro e valorização do que sempre esteve ali. Cada foto feita pelas crianças passa a alimentar bancos de dados científicos globais, utilizados por pesquisadores, gestores públicos e iniciativas de conservação. 

Pertencimento e vínculo com o território

Mas talvez o impacto mais profundo não esteja apenas nos números. Está no sentimento de pertencimento que nasce quando uma criança entende que o lugar onde ela vive importa, que sua floresta tem valor, que suas ações fazem a diferença. 

Ao caminharmos pelas trilhas da RPPN dos Guaribus, guiados pela dona Helga, as crianças estavam aprendendo sobre biodiversidade e sobre a história de conservação daquele local. Histórias de pessoas que realizam esforços reais para a proteção da natureza da terra que eles habitam, fazendo com que os visitantes construam uma relação afetiva com o território.

É aí que acredito estar a conservação. Não só em discursos distantes, em espaços cheios de políticos tomadores de decisões, mas também no vínculo criado entre pessoas e paisagens. Levar ciência cidadã para cidades do interior é reconhecer que esses territórios têm grande potencial não aproveitado.

O Desafio de Observação da Natureza de Itaguaçu 

O evento convida os moradores de Itaguaçu a registrar espécies de fauna e flora locais, vai até o dia 11 de janeiro. Famílias, moradores, jovens e adultos podem registrar espécies e somar esforços com as crianças do Clube Sabiá. Cada novo registro ajuda a fortalecer uma rede de cuidado com a biodiversidade local.

Crianças do Clube de Observadores da Natureza Sabiá visitam a RPPN Guaribus, em Itaguaçu. Foto: Leonardo Merçon
Crianças do Clube de Observadores da Natureza Sabiá visitam a RPPN Guaribus, em Itaguaçu. Foto: Leonardo Merçon

Para mim, acompanhar esse processo é reafirmar uma convicção antiga. Inspirando pessoas, promovemos mudanças.

Leonardo Merçon

Fotógrafo de Natureza, Cinegrafista e Produtor Cultural

Fundador e diretor voluntário do Instituto Últimos Refúgios, OSC ambiental/cultural sem fins lucrativos, que atua desde 2011 na divulgação e sensibilização ambiental, estimulando o diálogo entre sociedade, organizações ambientais, instituições privadas e governamentais. Fotógrafo de natureza, documentarista desde 2004, Merçon é focado na proteção da natureza, com Mestrado em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento sustentável pela ESCAS/Instituto IPÊ. Também formado em Design Gráfico pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Estudou fotografia voltada para publicações na Academia de Mídias e Artes, na Alemanha. O colunista acredita e trabalha em atividades de sensibilização ambiental (em especial com crianças) e fomento do turismo relacionado à natureza. Leonardo Merçon também tem dezenas de livros impressos e documentários em vídeo publicados. Realiza trabalhos ajudando a contar histórias por meio de imagens em mídias nacionais e internacionais, como a BBC de Londres e National Geographic Brasil, dentre outras.

Fundador e diretor voluntário do Instituto Últimos Refúgios, OSC ambiental/cultural sem fins lucrativos, que atua desde 2011 na divulgação e sensibilização ambiental, estimulando o diálogo entre sociedade, organizações ambientais, instituições privadas e governamentais. Fotógrafo de natureza, documentarista desde 2004, Merçon é focado na proteção da natureza, com Mestrado em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento sustentável pela ESCAS/Instituto IPÊ. Também formado em Design Gráfico pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Estudou fotografia voltada para publicações na Academia de Mídias e Artes, na Alemanha. O colunista acredita e trabalha em atividades de sensibilização ambiental (em especial com crianças) e fomento do turismo relacionado à natureza. Leonardo Merçon também tem dezenas de livros impressos e documentários em vídeo publicados. Realiza trabalhos ajudando a contar histórias por meio de imagens em mídias nacionais e internacionais, como a BBC de Londres e National Geographic Brasil, dentre outras.