
Toda vez que entro em uma escola do interior para falar sobre observação da natureza, algo em mim se rearranja. Talvez porque eu saiba, por experiência própria, que o acesso à ciência, à cultura e às experiências fora do currículo tradicional não chega da mesma forma a todos.
Não sei quantas oportunidades aquelas crianças têm de realizar atividades como às que propomos. Em alguns municípios do interior, muitas vezes cercados por florestas, rios e fragmentos de Mata Atlântica, a biodiversidade está ali, mas o convite para observá-la com atenção, com atenção e com um olhar de valorização, é algo que precisa ser fomentado com frequência.
Foi isso que senti em Itaguaçu, ao acompanhar as crianças do recém-criado Clube de Observadores da Natureza Sabiá, da EMIEIF Pedro Thomazini, em sua primeira saída de campo para a RPPN dos Guaribus.
Consegui perceber que a escola valoriza esse tipo de atividade e que as crianças ali já possuíam o coração aberto para a natureza, imagino que graças aos professores e à diretora, que nos receberam de braços abertos. Bem como os representantes da Prefeitura, que fizeram questão de participar de todas as atividades.
Eles estavam atentos, curiosos, descobrindo aves, insetos, fungos e árvores como se estivessem abrindo um livro vivo. A frase “Tio, olha o que eu achei!” era uma constância em nossa caminhada. E eu adorei. Um lembrete poderoso do porquê faço o que faço.
Isso corrobora muito uma frase que sempre uso: “Entrar na floresta sem conhecer a natureza é a mesma coisa que entrar em uma biblioteca sem saber ler. Você não vai se interessar por nenhum livro e consequentemente, não vai valorizar a biblioteca!”
Então é importante que as crianças conheçam a natureza, para que ela faça mais parte de suas vidas e, consequentemente, se importem com ela.
A ciência cidadã como porta de entrada
Quando falamos em ciência, muita gente ainda imagina laboratórios distantes, universidades inacessíveis ou pesquisas feitas por “especialistas” que não vivem o território. A ciência cidadã rompe essa lógica. Ao incentivarmos cidadãos comuns a registrar a natureza, mostramos que eles também podem produzir conhecimento. E que o quintal de casa, a trilha próxima ou uma reserva particular como a RPPN dos Guaribus são espaços para serem investigados.

Em Itaguaçu, isso ganha um peso ainda maior. Antes do início de nosso projeto do Clube de Observadores da Natureza nas Escolas, o município figurava entre aqueles com menos registros de espécies na plataforma iNaturalist (uma das maiores plataformas de ciência cidadã do mundo).
E isso não era por falta de biodiversidade, mas por falta de oportunidade de observação, registro e valorização do que sempre esteve ali. Cada foto feita pelas crianças passa a alimentar bancos de dados científicos globais, utilizados por pesquisadores, gestores públicos e iniciativas de conservação.
Pertencimento e vínculo com o território
Mas talvez o impacto mais profundo não esteja apenas nos números. Está no sentimento de pertencimento que nasce quando uma criança entende que o lugar onde ela vive importa, que sua floresta tem valor, que suas ações fazem a diferença.
Ao caminharmos pelas trilhas da RPPN dos Guaribus, guiados pela dona Helga, as crianças estavam aprendendo sobre biodiversidade e sobre a história de conservação daquele local. Histórias de pessoas que realizam esforços reais para a proteção da natureza da terra que eles habitam, fazendo com que os visitantes construam uma relação afetiva com o território.
É aí que acredito estar a conservação. Não só em discursos distantes, em espaços cheios de políticos tomadores de decisões, mas também no vínculo criado entre pessoas e paisagens. Levar ciência cidadã para cidades do interior é reconhecer que esses territórios têm grande potencial não aproveitado.
O Desafio de Observação da Natureza de Itaguaçu
O evento convida os moradores de Itaguaçu a registrar espécies de fauna e flora locais, vai até o dia 11 de janeiro. Famílias, moradores, jovens e adultos podem registrar espécies e somar esforços com as crianças do Clube Sabiá. Cada novo registro ajuda a fortalecer uma rede de cuidado com a biodiversidade local.

Para mim, acompanhar esse processo é reafirmar uma convicção antiga. Inspirando pessoas, promovemos mudanças.
















