Demarcação avança na COP 30 e povos indígenas reforçam alerta global

Quando comecei a perguntar aos amigos que estão em Belém sobre a presença dos povos indígenas na COP 30, percebi que as respostas carregavam algo em comum. Uma mistura de urgência e cansaço antigo. Essa é uma pauta que atravessa gerações, que transborda as fronteiras da conferência e que volta, ano após ano, para lembrar o mundo de algo simples. Não existe futuro climático sem os povos que conhecem as florestas há milênios.

Um encontro que revela pluralidade

O Mário Constantino, do Instituto Terra, me contou que tem acompanhado as mobilizações indígenas. Ele encontrou representantes dos Krenak, parceiros históricos do Instituto, e comentou sobre a diversidade que existe dentro das próprias pautas indígenas. A ministra Sônia Guajajara sempre reforça isso. Os povos são muitos, com histórias, necessidades e cosmovisões próprias. Não existe uma única pauta indígena, existe um território com muitas vozes.

Porém, existe um ponto que é quase unânime: a demarcação das terras indígenas.

O cacique Raoni, por sua vez, já destacou várias vezes na COP que, apesar de avanços recentes, muitas terras ainda aguardam demarcação. E o tempo para as promessas do atual governo serem cumpridas, está acabando. No dia a dia da conferência, segundo Mário, é comum cruzar com atos, cantos, faixas e reivindicações acontecendo dentro e fora dos espaços oficiais. A presença indígena é constante e firme.

Mobilização e diplomacia

Uma cena que me chamou atenção foi relatada pelo próprio Mário. Depois de um ato dos Munduruku, o presidente da COP, André Corrêa do Lago, e a diretora executiva, Ana Toni, acompanharam as lideranças até uma reunião oficial com a ministra Sônia Guajajara e a ministra Marina Silva.

Um gesto simbólico e poderoso.  Um grupo que minutos antes protestava do lado de fora passou a ser ouvido dentro das salas de negociação.

Foto: Mário Constantino

Esse movimento mostra que na COP nada é tão estático quanto imaginamos. E quando a pressão vem da sociedade, especialmente de povos que carregam memórias de resistência, a conferência precisa se mover.

O recado dos Krenak

Entre as mensagens que recebi, uma fala dos Krenak me cativou. Simples e direto, o representante do povo disse, com firmeza, que eles não vieram para negociar biodiversidade, nem para transformar floresta em moeda de troca. O recado era outro. Exigir direitos. Exigir respeito. Rejeitar qualquer tentativa de monetização que desvirtue o significado das florestas que eles protegem há séculos.

Foto: Leonardo Merçon

Ele disse algo que ficou comigo por um bom tempo.

“Nosso modo de vida não é radical. Nosso modo de vida é a forma de preservar todo o planeta.”

E essa frase revela muito sobre a crise que vivemos. Enquanto o mundo tenta criar modelos para mitigar a crise do clima, os povos indígenas já vivem o único modelo que realmente funcionou. O que preservou rios, matas e territórios inteiros enquanto o restante do planeta se desequilibrava.

Foto: Leonardo Merçon

Quando a demarcação finalmente avança

Enquanto escrevia esta matéria, chegou uma notícia importante. Meus amigos que estão acompanhando a COP 30 de perto me mandaram a notícia de algo relacionado à demarcação das terras indígenas, finalmente avançou. Fui procurar mais notícias sobre o fato, e realmente está acontecendo.

O Ministério da Justiça publicou HOJE (18/11/2025) uma série de portarias declaratórias de demarcação de terras indígenas, anunciadas pela ministra Sônia Guajajara durante o evento. Foi um daqueles momentos em que a política toca a vida real. 

As demarcações envolvem territórios de dez povos diferentes, espalhados do Amazonas ao Paraná, cada um com histórias próprias, feridas antigas e esperanças renovadas. Vista Alegre, Tupinambá de Olivença, Comexatibá, Ypoí Triunfo, Sawré Ba’pim, Pankará da Serra do Arapuá, Sambaqui, Ka’aguy Hovy, Pakurity e Ka’aguy Mirim agora avançam para uma etapa decisiva após décadas de reivindicação. (Fonte: Agência Brasil)

Segundo a ministra, esses territórios fazem parte de um conjunto maior, que prevê a regularização de 63 milhões de hectares até 2030, sendo 59 milhões destinados a terras indígenas e o restante a territórios quilombolas. 

É um gesto que não resolve tudo, mas que sinaliza algo importante. A demarcação não é símbolo. É direito de quem já vivia aqui. E ver esse movimento acontecendo durante a COP reforça que, mesmo com qualquer contradição do evento, existem decisões que atravessam o discurso e chegam onde realmente importa.

Um espelho para o mundo

Achei importante reforçar que os povos indígenas não estão pedindo favores. Estão lembrando o mundo do óbvio. Direitos não se negociam. A biodiversidade não deveria ser ativo financeiro, a não ser que o produto seja a conservação dessa própria natureza. Pois ela é importante demais para nossa sobrevivência para ser “vendida”.

Eu vejo tudo isso com uma certa esperança. Ainda tem gente lutando… e somente por este fato, a COP é importante. E são as vozes indígenas algumas das que também apontam um caminho. Elas nos lembram que não existe solução climática desconectada da terra, da água e da memória que sustentam o planeta desde antes de existir a palavra “clima”.

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Leonardo Merçon

Fotógrafo de Natureza, Cinegrafista e Produtor Cultural

Fundador e diretor voluntário do Instituto Últimos Refúgios, OSC ambiental/cultural sem fins lucrativos, que atua desde 2011 na divulgação e sensibilização ambiental, estimulando o diálogo entre sociedade, organizações ambientais, instituições privadas e governamentais. Fotógrafo de natureza, documentarista desde 2004, Merçon é focado na proteção da natureza, com Mestrado em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento sustentável pela ESCAS/Instituto IPÊ. Também formado em Design Gráfico pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Estudou fotografia voltada para publicações na Academia de Mídias e Artes, na Alemanha. O colunista acredita e trabalha em atividades de sensibilização ambiental (em especial com crianças) e fomento do turismo relacionado à natureza. Leonardo Merçon também tem dezenas de livros impressos e documentários em vídeo publicados. Realiza trabalhos ajudando a contar histórias por meio de imagens em mídias nacionais e internacionais, como a BBC de Londres e National Geographic Brasil, dentre outras.

Fundador e diretor voluntário do Instituto Últimos Refúgios, OSC ambiental/cultural sem fins lucrativos, que atua desde 2011 na divulgação e sensibilização ambiental, estimulando o diálogo entre sociedade, organizações ambientais, instituições privadas e governamentais. Fotógrafo de natureza, documentarista desde 2004, Merçon é focado na proteção da natureza, com Mestrado em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento sustentável pela ESCAS/Instituto IPÊ. Também formado em Design Gráfico pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Estudou fotografia voltada para publicações na Academia de Mídias e Artes, na Alemanha. O colunista acredita e trabalha em atividades de sensibilização ambiental (em especial com crianças) e fomento do turismo relacionado à natureza. Leonardo Merçon também tem dezenas de livros impressos e documentários em vídeo publicados. Realiza trabalhos ajudando a contar histórias por meio de imagens em mídias nacionais e internacionais, como a BBC de Londres e National Geographic Brasil, dentre outras.