Quando a gente fala em microplásticos, muita gente ainda pensa apenas no impacto ambiental, em tartarugas presas em sacolas ou praias poluídas. Mas o papo que tive com o biólogo Daniel Gosser Motta, vice-presidente do CRBio-10, deixa claro que o problema vai muito além disso. Microplásticos e saúde humana estão diretamente conectados, e essa é uma conversa que precisa chegar a todo mundo, inclusive aqui no Espírito Santo.

Antes de entrarmos no tema, pedi para o Daniel contar um pouco da própria trajetória. A história dele ajuda a entender por que a divulgação científica é tão importante. Desde criança, movido pela curiosidade e pelo contato com a natureza, ele encontrou na biologia um caminho para responder perguntas, mas também para gerar novas.

Depois de uma pausa na carreira, voltou à academia, concluiu o mestrado na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e decidiu atuar fortemente na tradução do conhecimento científico para a população. Ciência que não chega às pessoas vira privilégio, e desigualdade de informação também é desigualdade social.

Microplásticos e saúde humana: o problema invisível

O plástico, criado no início do século passado para ser moldável e durável, acabou se tornando onipresente. Está em objetos do cotidiano, nos alimentos, no transporte e no nosso entorno. O problema começa quando esse material, descartado de forma inadequada, se fragmenta ao longo do tempo. É aí que surgem os microplásticos, partículas entre 5 milímetros e 1 micrômetro, e os nanoplásticos, ainda menores.

Segundo Daniel, cerca de 95% dos microplásticos têm origem secundária, ou seja, vêm da degradação de plásticos maiores como sacolas, garrafas e embalagens. Luz solar, ação das ondas, micro-organismos e o tempo fazem esse material se quebrar em partículas cada vez menores, que se espalham pelo ambiente.

Hoje, esses fragmentos já foram encontrados no Monte Everest, na Antártida, nas fossas oceânicas mais profundas e também dentro do corpo humano. Estudos recentes identificaram microplásticos no leite materno, na placenta, no sangue e em diversos tecidos.

Quando falamos de microplásticos e saúde humana, estamos falando de algo que respiramos, bebemos e comemos todos os dias.

Microplásticos no Espírito Santo e a ciência capixaba

Aqui no Espírito Santo, pesquisas conduzidas na Ufes mostram que o problema também é local. Daniel atua como pesquisador voluntário em estudos que já identificaram microplásticos em moluscos marinhos e até em teias de aranha, usadas como amostradores do ar. Isso revela algo alarmante: o ar é uma das principais vias de contaminação por microplásticos.

Esses dados reforçam o papel dos animais como sentinelas da saúde ambiental. Eles indicam desequilíbrios antes mesmo de os impactos mais graves chegarem às pessoas. Ao mesmo tempo, mostram a força da ciência capixaba e da universidade pública na produção de conhecimento relevante para a sociedade.

Microplásticos e saúde humana: impactos e caminhos possíveis

Os efeitos dos microplásticos ainda estão sendo estudados, mas já existem associações com desregulação hormonal, problemas endócrinos e aumento do risco de trombose. Além disso, essas partículas funcionam como vetores de outros poluentes, como metais pesados e agrotóxicos, potencializando os danos à saúde.

Não existe solução mágica. O enfrentamento passa por mudanças graduais de hábito, redução do consumo de descartáveis, reutilização consciente e valorização da reciclagem. Também envolve políticas públicas, responsabilidade da indústria, combate ao greenwashing e investimento em materiais realmente biodegradáveis.

A mensagem final que fica é simples e poderosa: só protegemos aquilo que conhecemos. Entender a relação entre microplásticos e saúde humana é o primeiro passo para mudar comportamentos, cobrar soluções estruturais e construir um futuro com menos impactos para o meio ambiente e para nós mesmos. Afinal, nós somos natureza, e tudo o que fazemos com ela volta para a gente.

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Yhúri Cardoso Nóbrega

Colunista

Doutor em ecologia de ecossistemas, mestre em ciência animal e presidente do Instituto Marcos Daniel.

Doutor em ecologia de ecossistemas, mestre em ciência animal e presidente do Instituto Marcos Daniel.