Bebida batizada não é novidade. As autoridades fazem caras e bocas de surpresa. Ou o fazem por hipocrisia. Ou para disfarçar a completa incapacidade de combater um dos crimes mais antigos.
E o crime é organizado, sim. Ou alguém imagina ser possível criminosos — pé de chinelo ou ladrões de galinha — produzirem, envasarem e distribuírem milhares de litros de bebidas falsas? Aliás, bebida é apenas uma das centenas e centenas de produtos falsificados em circulação no país.
Não esqueçamos que a oferta existe porque demanda há. O que nos obriga, de alguma maneira, a também nos responsabilizarmos. O consumo de produtos ilegais permeia todos os níveis econômicos da sociedade — do mais pobre ao mais rico. É quase como se fosse um traço cultural.
Numa inversão de valores, “o esperto” passa a ser aquele que compra um produto que imita o original por um preço infinitamente menor. Como diz o ditado popular: “não há almoço de graça”. Pra ficar apenas em três pontos, quem compra um produto falso não leva em consideração a qualidade da matéria-prima, as condições sanitárias em que o produto é fabricado, tampouco a sonegação de impostos.
No caso das bebidas, por exemplo, de acordo com a Federação de Hotéis, Bares e Restaurantes do Estado de São Paulo, só em produtos falsos foram movimentados mais de R$ 86 bilhões. Uma em cada cinco garrafas de uísque ou vodca comercializadas no Brasil é falsa. O dado é da Associação Brasileira de Bebidas Destiladas.
Ainda segundo o estudo, 36% do segmento de vinhos e destilados em circulação no país podem ser falsificados, adulterados ou contrabandeados. O fato é que produtos ilegais causam muitos prejuízos à saúde financeira do país. Pior: a ganância de alguns coloca em risco a vida de muitos.
De agosto pra cá, o Ministério da Saúde contabilizou quase 200 notificações de intoxicação por metanol misturado em bebida alcoólica. Ainda que a maior parte dos casos esteja no Estado de São Paulo, não é exagero imaginar que bebidas falsificadas estejam no país inteiro.
Por ora, já foram 14 casos e 2 mortes.
A principal linha de investigação da polícia é que fábricas clandestinas estariam usando metanol para higienizar garrafas falsificadas antes de envasá-las. De novo: o consumo desses produtos foi feito em shows, bares, adegas, restaurantes… ou seja, há que se ter, no mínimo, uma organização logística para distribuição.
Sabe o que surpreende de verdade? Tudo isso acontecer debaixo do nariz de todas as autoridades, em todas as instâncias governamentais — e ninguém sentir o cheiro da podridão.
O crime não é inodoro e deixa um gosto amargo. Chega de engolirmos explicações falsas.