Lítio: O Ouro Branco da Transição Energética Brasileira Lítio: O Ouro Branco da Transição Energética Brasileira Lítio: O Ouro Branco da Transição Energética Brasileira Lítio: O Ouro Branco da Transição Energética Brasileira
Lítio: O Ouro Branco da Transição Energética Brasileira

Ao longo da história, algumas matérias-primas mudaram o rumo das nações. O carvão alimentou a Revolução Industrial. O petróleo moldou o século XX. Agora, o lítio desponta como o elemento estratégico do século XXI. Conhecido como “ouro branco”, ele é insumo essencial para baterias de veículos elétricos, sistemas de armazenamento de energia e tecnologias renováveis. Para o Brasil, país com uma das maiores reservas do mundo, o lítio representa oportunidade econômica única. Entretanto, também impõe desafios regulatórios que, se não forem resolvidos, podem comprometer a capacidade de atrair investimentos.

Com efeito, o Brasil possui reservas expressivas de lítio, concentradas principalmente no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Segundo o Serviço Geológico do Brasil (CPRM), o país detém cerca de 8% das reservas globais conhecidas. Em 2023, o governo federal liberou a exportação do chamado “lítio verde”, com base em extração de baixo impacto, colocando o Brasil no radar internacional como fornecedor estratégico para a cadeia de transição energética, especialmente para Europa, Estados Unidos e China, que demandam volumes crescentes do mineral.

Além da abundância mineral, há um componente social relevante. O Vale do Jequitinhonha é uma das regiões mais pobres do país, com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,66 segundo o IBGE. A exploração sustentável do lítio pode transformar essa realidade, atraindo infraestrutura, investimento privado e qualificação de mão de obra. Estima-se que os novos empreendimentos na região possam gerar mais de 10 mil empregos diretos e indiretos nos próximos anos, marcando uma virada histórica em seu perfil socioeconômico.

A demanda global é crescente. De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA), a procura por lítio deve aumentar quarenta vezes até 2040, impulsionada pela expansão dos veículos elétricos e das baterias para energias solar e eólica. No mesmo relatório, a IEA destaca que o lítio é insubstituível em tecnologias de alta densidade energética, consolidando sua posição como insumo crítico da nova economia.

O Brasil já começa a se destacar nesse contexto. Empresas como a Sigma Lithium e a Companhia Brasileira de Lítio (CBL) vêm liderando a produção nacional com práticas de baixo impacto ambiental e foco em exportações de alta pureza. A Sigma, por exemplo, opera em Araçuaí (MG) e já exporta lítio sustentável para grandes fabricantes internacionais, como a Tesla, posicionando o país como fornecedor relevante na cadeia global.

Oportunidades e Desafios do Lítio no Brasil

Para o Brasil, a exploração adequada pode gerar bilhões em receitas e transformar regiões historicamente pobres em polos de desenvolvimento. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) estima que o mercado brasileiro de veículos elétricos deve crescer 30% ao ano até 2030, criando demanda interna relevante. Além disso, a exportação do lítio já processado em produtos de maior valor agregado, como baterias, pode multiplicar o impacto econômico, gerando empregos qualificados e inovação tecnológica.

O maior entrave, no entanto, não está no potencial econômico, mas na burocracia regulatória. O marco legal da mineração ainda é complexo e pouco atrativo para investidores estrangeiros. Processos de licenciamento são demorados, os custos de conformidade são elevados e a insegurança jurídica cria barreiras à entrada de capital. Relatórios de consultorias internacionais, como a Fraser Institute Survey of Mining Companies, frequentemente posicionam o Brasil abaixo de concorrentes diretos como Chile e Argentina em termos de atratividade regulatória para o setor mineral.

Outro obstáculo é a instabilidade normativa. Mudanças frequentes em regras de exportação, exigências de conteúdo local e falta de clareza na tributação geram incertezas que desestimulam investimentos de longo prazo. Para um mercado em que países competem ferozmente por protagonismo, a previsibilidade é o maior ativo. Sem ela, o Brasil corre o risco de perder espaço para vizinhos que já estruturaram políticas mais ágeis e atrativas.

Em 2024, o governo federal lançou o Programa Lítio Sustentável, voltado à rastreabilidade do mineral, incentivo a práticas ESG e fomento à industrialização local. Ainda assim, especialistas apontam que a ausência de um marco legal específico para minerais críticos limita a efetividade das iniciativas. O país carece de regras claras sobre partilha de receitas, prazos de licenciamento e incentivos fiscais, que são pontos fundamentais para destravar o potencial do setor.

A Necessidade de um Marco Regulatório Claro

Há ainda a necessidade de evitar a armadilha da exportação de commodities in natura. A simples venda do minério bruto gera pouco valor agregado e deixa o país dependente das oscilações de preço internacional. O caminho estratégico está em desenvolver toda a cadeia, do refino à produção de baterias, aproveitando a demanda global por soluções completas em energia limpa. Isso exige clareza regulatória, incentivos bem estruturados e alinhamento com políticas industriais.

Outro desafio brasileiro é logístico: boa parte das minas de lítio localiza-se em regiões carentes de infraestrutura de transporte e energia. Estradas precárias, limitações na rede elétrica e distância dos portos elevam o custo operacional e reduzem a competitividade internacional. Investimentos em corredores logísticos e energia renovável seriam decisivos para tornar o “lítio verde” brasileiro viável e competitivo no longo prazo.

Ademais, a geopolítica amplia a relevância do tema. Estados Unidos e União Europeia buscam fornecedores confiáveis para reduzir a dependência da China, que concentra cerca de 60% da capacidade mundial de refino e processamento. O Brasil, ao se posicionar como exportador confiável, pode conquistar papel estratégico. Mas isso só será viável com credibilidade institucional, segurança jurídica e capacidade de oferecer condições competitivas para atração de investimentos.

Por fim, o lítio representa oportunidade histórica para o Brasil combinar crescimento econômico, inserção internacional e contribuição à transição energética global. Mas colher esses frutos depende da remoção dos entraves burocráticos e da construção de um ambiente regulatório estável. Afinal, o lítio verde só será ouro branco de verdade se o Brasil transformar potencial em previsibilidade, e reservas em prosperidade.

Gabriela Moraes Oliveira

Colunista

Associada do Instituto Líderes do Amanhã

Associada do Instituto Líderes do Amanhã