O verdadeiro bombardeio é mental: como conflitos reprogramam decisões estratégicas

A recente operação Midnight Hammer, em que os Estados Unidos bombardearam instalações nucleares do Irã, evidencia que os conflitos armados não se limitam mais a fronteiras geográficas. Somam-se a esse episódio a escalada das tensões entre Israel e Hezbollah e a persistência da guerra na Ucrânia. Esses acontecimentos revelam um ponto mais profundo: guerras não afetam apenas a geopolítica. Elas alteram decisões de consumo, planos de carreira e percepções de risco. Em tempos de conflito, não é apenas o solo que treme, é o eixo da racionalidade humana que se desloca.

Assim como o cérebro humano, em ambientes de ameaça, ativa estruturas primitivas que priorizam a autoproteção em detrimento da razão, também as sociedades sob pressão tendem a reagir com políticas públicas de curto prazo. A dominância do instinto sobre a racionalidade individual encontra um paralelo no populismo político, no qual o apelo emocional supera a lógica estratégica.

Viktor Frankl, sobrevivente do holocausto, escreveu que até no horror existe espaço para escolha. No entanto, essa escolha exige clareza de sentido, algo ameaçado quando o ambiente externo ativa, de forma recorrente, mecanismos mentais de sobrevivência. Conflitos prolongados, como na Ucrânia, ou abruptos, como o ataque ao Irã, induzem uma psique coletiva de insegurança crônica. Como alerta Michael Sandel em “Justiça: o que é fazer a coisa certa, a liberdade exige mais do que ausência de coerção. Exige a capacidade de julgar com responsabilidade o que deve ser feito em contextos de incerteza. Se o medo domina o discernimento, o indivíduo não apenas reage, ele terceiriza sua autonomia.

A economia comportamental demonstra que, em contextos de instabilidade, os indivíduos priorizam decisões que evitem perdas em vez de buscar ganhos. Como mostram Sendhil Mullainathan e Eldar Shafir, o estado mental de escassez afeta o foco, a produtividade e a ética. Nesse cenário, as escolhas deixam de ser estratégicas e passam a ser defensivas.

Antifragilidade e Resiliência em Tempos de Crise

Ao mesmo tempo, há pessoas e organizações que se fortalecem diante do caos. Nassim Taleb denomina esse fenômeno de antifragilidade: a capacidade de crescer sob pressão. Companhias com caixa robusto, decisões descentralizadas e cultura resiliente tendem a prosperar quando outras retraem. São lideradas por gestores que compreendem o funcionamento do cérebro sob estresse e evitam decisões contaminadas por narrativas dominadas pelo medo.

O Impacto dos Conflitos na Consciência Humana

Quando uma nação bombardeia outra, as repercussões extrapolam os mapas geopolíticos. Elas reverberam no cérebro humano, ativam medos ancestrais e influenciam desde padrões de consumo até a confiança em instituições. Entender como o cérebro reage a conflitos é essencial para líderes que não querem ser arrastados pela lógica do pânico, mas sim formular estratégias lúcidas em meio à escuridão. A verdadeira trincheira, nesses tempos, não está na fronteira: está na consciência.

Rayane Fernandes Goncalves Borges

Colunista

Diretora Geral da SkillsMapping e Mentora de Carreira e Gestão de Pessoas [RH] na Ementor. Neurocientista Comportamental, e Bacharel em Administração, com MBA em Gestão e Liderança de Pessoas pela UFRJ.

Diretora Geral da SkillsMapping e Mentora de Carreira e Gestão de Pessoas [RH] na Ementor. Neurocientista Comportamental, e Bacharel em Administração, com MBA em Gestão e Liderança de Pessoas pela UFRJ.