
*Artigo escrito por Marcello Dala Bernardina Dalla, médico de família e comunidade, coordenador do Eixo de Integração Ensino Serviço e Comunidade do curso de Medicina da Faesa
O que aparentemente começou como uma solução improvisada durante a pandemia de Covid-19, hoje é definitivamente uma revolução na forma como cuidamos das pessoas. Indo além de uma alternativa emergencial, a telemedicina mostrou-se uma poderosa ferramenta de democratização do acesso à saúde.
A telemedicina faz parte de um conceito mais amplo que se chama saúde digital, pois não envolve apenas médicos. Ela conecta profissionais, pacientes, tecnologias e soluções que ajudam a salvar vidas, reduzir filas, encurtar distâncias e humanizar o cuidado.
Se a saúde digital antes era vista com desconfiança, agora é reconhecida como essencial para salvar vidas e ampliar o acesso aos atendimentos à saúde — especialmente para quem vive em áreas rurais e nas grandes cidades em que a mobilidade urbana é um problema atual e desafiador.
Mas essa história não é de início recente. Em 1964, nos Estados Unidos, Reba Benschoter liderou uma equipe que criou o primeiro sistema para atendimento remoto, conectando dois hospitais que estavam a 180 quilômetros de distância.
Usando transmissões em vídeo (os equipamentos ocupavam uma sala inteira), realizaram atendimentos psiquiátricos e aulas remotas, abrindo caminho para o que hoje chamamos de telemedicina e ainda deu base para educação à distância na saúde.
Desde essa experiência pioneira, até hoje a psiquiatria é a especialidade médica que mais utiliza a telemedicina, e sabemos como foi importante o suporte para as questões de saúde mental durante a pandemia.
Ainda hoje gera conforto ter profissionais da área ao “alcance das mãos” e “dentro” das nossas casas com tecnologias simples como um aplicativo de celular.
O Brasil também tem números que impressionam, o programa Telessaúde Brasil Redes, criado em 2007, já realizou mais de 1,2 milhão de telediagnósticos e 150 mil teleconsultorias.
Durante a pandemia, esse sistema foi fundamental para manter o atendimento em regiões remotas, evitando deslocamentos e garantindo que médicos das unidades básicas de saúde pudessem contar com o apoio de especialistas à distância para melhorar seus atendimentos.
O reconhecimento veio em 2021, quando a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) declarou o programa brasileiro como referência mundial. Mais do que isso: a Opas passou a considerar a conectividade digital — ou seja, o acesso à internet e à tecnologia — como um novo determinante social da saúde. Em outras palavras, assim como saneamento básico, moradia digna e alimentação saudável, o acesso à internet também passou a ser visto como essencial para garantir o direito à saúde.
Porém, a meta da Opas é ousada: garantir conectividade universal no setor da saúde até 2030. Para isso, é preciso investir em infraestrutura, capacitação de profissionais e políticas públicas que levem internet de qualidade a todos os cantos do país.
O impacto da telemedicina vai além da tecnologia. Ela representa uma mudança de paradigma no cuidado com o outro. Para muitas famílias, especialmente em regiões isoladas – e são muitas num país continental como o Brasil –, ela é a única forma de acesso a um especialista.
Para pacientes crônicos, oferece continuidade no tratamento. Para os sistemas públicos e privados de saúde, traz eficiência, redução de custos. E sempre quando avaliada, mostra alta satisfação dos pacientes e profissionais envolvidos.
A telemedicina, embora criada há décadas, tomou impulso durante a pandemia e com os avanços tecnológicos dos últimos anos. Mas sua consolidação como uma ponte entre o cuidado e quem mais precisa dele é o que torna essa ferramenta tão transformadora.
Ela pode influenciar decisivamente em diversas situações. Mesmo que ainda não tenha atingido todo seu potencial, ela já deixa evidente um caminho sem volta: precisamos centrar as soluções nas necessidades das pessoas, e não apenas na tecnologia.