Polícia

Mais de 200 militares foram atendidos por dia para consulta psiquiátrica durante a greve da PM

Um policial militar continua preso no Quartel, em Vitória, após a paralisação

Após quase um ano da greve da Polícia Militar no Espírito Santo, um policial continua preso. Além disso, muitos policiais relataram casos de depressão entre os militares do Estado. O Governo afirma que não abre mão de que os envolvidos respondam pelo que aconteceu.

"O soldado é um lutador e trabalha como qualquer outro", alegou Sandra Regina Lima, mãe de um estudante de Direito e soldado da PM, preso durante a paralisação.

O filho de Sandra é o soldado Nero Walker da Silva Soares. No dia 22 de janeiro deste ano, ele completou 24 anos, mas não teve a oportunidade de celebrar o aniversário com a família. O policial está preso há sete meses. "Meu filho foi preso dentro da residência dele. Segundo eles falam, o motivo foi a greve", disse a mãe.

O soldado Nero segue detido no QCG

Ele é policial militar há quatro anos. Depois do fim da greve dos policiais, Nero fez críticas ao Governo do Estado por meio das redes sociais. Acabou sendo preso no dia 16 de junho do ano passado. Ele transmitiu ao vivo, em uma rede social, a própria prisão. "Na verdade, o recado que passa é que 'não faça isso que vai ser punido como o soldado Walker'. É uma forma de mostrar para a classe", afirmou Sandra.

Dois dias depois, o soldado foi internado em um hospital psiquiátrico por uma semana. Segundo a polícia, por descontrole emocional e agressividade. "Eu sinto quando eu o abraço, eu sinto a pressão que ele está passando, eu vejo meu filho um tanto desequilibrado", contou a mãe do soldado.

Nero Walker é o único policial militar que continua preso depois do fim da paralisação. "Se você tem um ideal, se você acha uma coisa injusta, você tem que lutar por aquilo que você acha certo. O militar não pode fazer greve mas o governo pode ficar tanto tempo sem dar um reajuste merecido a classe?", argumentou Sandra.

De acordo com o Governo, o último reajuste salarial para militares foi feito em 2014. Já segundo os familiares da classe, o último reajuste aconteceu no ano de 2010.

Atendimentos

Quartel da PM em Vitória

O soldado Nero está detido no Quartel do Comando Geral da Polícia Militar (QCG), em Vitória. Ele não foi o único a apresentar problemas emocionais, a ser internado e a precisar de ajuda médica. Diversos militares são atendidos na sede da Associação dos Cabos e Soldados, que possui médico e psiquiatra que ficam por conta de atender policiais que apresentarem quadro de depressão grave depois da greve. 

"Eu venho aqui todas as quintas-feiras. Se eu imaginava que fosse atender tanta gente assim aqui? Sim. Há muita demanda, sim. Não só mexeu com eles, como mudou radicalmente a rotina, a expectativa em relação à instituição, a eles próprios. Talvez as pessoas não conheçam quase nada do que tenha havido com os policiais. Eu fui testemunha do que acontecia. Quase 200 policiais por dia me procuraram durante a paralisação em estado desesperador", contou o psiquiatra Bernardo Santos Carmo, responsável pelos atendimentos aos policiais militares.

No ano passado, de acordo com a Associação de Cabos e Soldados do Estado, foram contabilizados cinco suicídios na Polícia Militar. Foram dois soldados, um cabo e dois sargentos. "Eu sei que tentativas, houve várias. Destes cinco, no mínimo três foram atendidos por mim. O trabalho deles é muito árduo, eu acho que deveria haver o mínimo de reconhecimento para isso", destacou o psiquiatra.

Militares não deixavam os batalhões na greve

Para ser militar, é preciso seguir a risca uma cartilha rígida. Está na Constituição que a hierarquia e a disciplina são a base das organizações militares. Existem normas e regulamentos internos específicos que determinam a conduta dos policiais. É por isso que o comando da polícia do Espírito Santo diz que as punições estão de acordo com os ideais da constituição. 

"Aqui nós temos um regulamento disciplinar, temos um Código Penal Militar, não podemos transgredir o regulamento. No final do curso de formação, o PM faz um juramento. Nós temos que manter e honrar esse juramento que nós fazemos de proteger a sociedade. Nós não podemos trair o juramento que fizemos de defender e proteger o povo capixaba. As pessoas devem responder pelo que fazem. Eu ensino isso dentro da minha casa. O pai e a mãe responsável ensinam isso aos filhos. Cada um tem que responder por suas atitudes. Aquele que transgride a lei, nós vamos lá e prendemos. Então, nós temos que ser exemplo de correção. Aqui dentro, aquele que cometeu qualquer tipo de transgressão, aquele que cometeu qualquer tipo de crime, tem que responder por ele", afirmou o comandante geral da Polícia Militar, Nylton Rodrigues.

As mulheres impediam a saída de policiais

Para o comando geral, a instituição agiu corretamente durante o impasse e nos meses que se seguiram. "Não faria nada diferente. Tentamos conversar a todo o momento. Eu assumi na segunda-feira, na quarta recebi um grupo de mulheres, decidimos que iríamos terminar, foi feita uma ata, todos assinaram, mas infelizmente não evoluiu", lembrou o comandante.

O Governo também concorda que a quebra da disciplina e da hierarquia dentro da instituição militar não pode ser aceita. "Você imagina praticar um crime e não querer responder por ele? Que mensagem que a gente quer passar para a sociedade? Todas as alternativas foram colocadas na mesa. O Estado nunca fechou as portas para reuniões, aconteceram vários encontro. Nunca se fechou as portas para o diálogo e para a negociação. O que é que tinha que ser feito por parte do governo? Conceder aumento salarial? Com a lei da responsabilidade fiscal e o cenário econômico que enfrentávamos, era isso? Não tinha solução fácil para o problema difícil. Essa solução era colocar como nós fizemos, chamar todos à razão, mostrar o caminho correto, mostrar o que é certo", destacou o secretário de Segurança Pública do Estado, André Garcia.

Policiais

Apenas a história de um policial foi relatada, pois todos os outros que foram punidos, não quiseram gravar entrevista. Eles alegaram medo de retaliação, mesmo com o compromisso de não serem identificados. As mulheres que embarcaram no movimento também se recusaram a falar. 

Depois de tudo o que aconteceu, será que a relação da Polícia Militar com o Governo está melhor? Além do aumento, eles pediram melhores condições de trabalho. O que será que eles conseguiram em relação a isso? E o projeto de lei que concede anistia aos policiais capixabas envolvidos na greve, em que pé anda? Será que existe alguma possibilidade do capixaba enfrentar todo aquele terror novamente? Essas perguntas serão respondidas na próxima reportagem da série, que vai ao ar no Balanço Geral, às 12 horas, na TV Vitória/Rede Record.

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