
O motociclista que atropelou o casal José Geraldo Torres, de 82 anos, e Maria Auxiliadora Torres, 78, na noite de segunda-feira (17), no bairro Porto Canoa, na Serra, foi ouvido pela polícia na tarde desta terça-feira (18) e liberado em seguida.
A “soltura” do motociclista chamou a atenção pelo fato do atropelamento ter causado a morte do idoso e piloto da moto ter fugido do local do acidente.
Apesar de causar estranheza, o professor de Direito Penal e advogado criminalista Rivelino Amaral explica que a medida é geralmente a mais comum, uma vez que é mais habitual que as pessoas respondam a processos em liberdade, o que torna a prisão uma medida de exceção.
No caso do motociclista, ele não foi preso ainda, pois não estava em situação de flagrante. Para que o flagrante aconteça, existem algumas medidas que precisam ser obedecidas.
“Neste caso ele não foi preso ainda porque não estava em situação de flagrante. Flagrante acontece quando uma pessoa é surpreendida cometendo um crime, quando é perseguida logo após o cometimento de um crime ou quando é encontrada logo após o cometimento de um crime com objetos que façam crer ser ela a autora”, explicou.
Estes denominadores estão descritos no artigo 302 do Código de Processo Penal, portanto, como não houve perseguição e o motociclista não foi encontrado logo após o crime, “tampouco foi o suspeito surpreendido ao cometer o crime, a prisão em flagrante é vedada”, detalha.
Apesar da impossibilidade da prisão em flagrante, não estão vedadas outras formas de prisão, como a preventiva, medida que já foi pedida pela Polícia Civil à Justiça. De acordo com o advogado, a preventiva deve ser cumprida, no mais tardar, nesta quarta-feira (19).
“Nada impede que a polícia represente pela prisão preventiva dele, que já aconteceu. Já há inclusive um mandado de prisão preventiva contra o motociclista e ele vai ser preso, se não hoje, amanhã. Por isso que ele foi à delegacia, prestou depoimento e foi embora”, disse o advogado.
Características do atropelamento se enquadram em dolo eventual
A explicação de Rivelino é corroborada pelo advogado criminalista Fabio Marçal, especialista em Segurança Pública.
Ele explica, no entanto, que o crime cometido pelo motociclista não está mais na esfera do Código de Trânsito e passa a figurar no Código Penal, uma vez que o suspeito cometeu o delito assumindo a responsabilidade de matar e por ter fugido do local do crime.
“Ele estava fazendo exibição, atropelou uma pessoa, que estava em estado grave. Simplesmente menosprezou a vida humana, virou as costas e fugiu para se eximir das suas responsabilidades. E isso caracteriza dolo eventual, homicídio doloso com algumas qualificadoras, e provavelmente vão decretar a prisão preventiva”, afirmou.
Ainda de acordo com Fabio Marçal, para que a prisão em flagrante ocorresse, a perseguição ao motociclista deveria ocorrer de maneira ininterrupta. Com isso, as buscas poderiam perdurar por até 30 dias.
“Foi o caso, por exemplo, do assassino do juiz Alexandre Martins de Castro Filho, preso 30 dias depois, porque a perseguição dele ocorreu por vários dias. No caso do motociclista, isso não seria possível, pois ele não havia sequer sido identificado. Não tem nada a ver com 24 horas após o crime”, explicou.
Relembre o caso
O motociclista foi flagrado por câmeras de videomonitoramento trafegando pela avenida de forma arriscada, levantando a roda dianteira da moto, manobra conhecida como “grau”, quando atinge o casal, que atravessava a via para seguir até um culto em uma igreja próxima.
José Geraldo, que fazia tratamento contra um câncer, morreu no local. Maria Auxiliadora foi socorrida e levada para o Hospital Jayme Santos Neves, onde segue internada. Não há informações atualizadas sobre seu estado de saúde. O motociclista fugiu do local do acidente sem prestar socorro.
Veja vídeo do acidente:
A moto estava irregular, sem placa e com sinais de adulteração. A Guarda Municipal da Serra informou que o veículo está registrado em nome de uma parente do motociclista.
O casal era muito querido pelos moradores de Porto Canoa. A estudante Isabelly da Penha, que conhecia os dois, relata que José Geraldo e Maria Auxiliadora eram carinhosos e atenciosos com todos, mesmo com quem não tinham proximidade.
“Eles eram queridos com todos aqui, mesmo com quem eles não conheciam. É doloroso saber que depois desse acidente a pessoa responsável vai seguir a vida dela tranquila.”, disse Isabelly.
O velório de José Geraldo acontece no Ginásio de Porto Canoa. O sepultamento ocorrerá nesta quarta-feira (19), no Cemitério Jardim da Paz, às 15h, na Serra.
Depoimento e pedido de prisão preventiva
Na tarde desta terça-feira, o motociclista compareceu à delegacia acompanhado da advogada. Ele foi interrogado e liberado após procedimentos formais da polícia judiciária.
Policiais teriam ido à casa dele durante a manhã, mas não o encontraram. No local, os policiais intimaram uma mulher, que seria a dona da moto envolvida no atropelamento.
De acordo com a Polícia Civil, já há um pedido de prisão preventiva contra o investigado junto à Justiça, pelo crime de homicídio doloso, na modalidade de dolo eventual, quando se assume o risco de matar.