Reprodução/TV Justiça
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A decisão tomada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino, na última quinta-feira (23), acendeu um sinal de alerta no meio político.

A partir do Orçamento do ano que vem as emendas parlamentares estaduais e municipais terão de ser submetidas às mesmas regras de transparência e rastreabilidade aplicadas às emendas de deputados federais e senadores.

Em audiência na Corte, o ministro determinou que os estados, o Distrito Federal e os municípios sigam o modelo federal consolidado a partir das determinações da Corte sobre o assunto.

E mais: que a execução orçamentária e financeira das emendas parlamentares de 2026 só inicie depois que governos e prefeituras comprovarem o cumprimento das novas exigências de transparência.

Nos bastidores, há um temor que a decisão de Dino coloque sob risco o calendário de pagamentos das emendas justamente num ano eleitoral, quando cada centavo dessas verbas se transforma em ativo político.

Esses recursos, que cada deputado destina a obras, projetos e entidades em seus redutos eleitorais, funcionam como uma vitrine de realizações. Na prática, reforçam a presença do parlamentar na base e, consequentemente, ampliam seu capital político diante do eleitorado.

Em ano de eleição, a emenda parlamentar torna-se uma poderosa ferramenta de visibilidade e fortalecimento, essencial para quem quer voltar às urnas com vantagem.

O valor das emendas do ES

A peça orçamentária do Estado para o ano que vem prevê o valor de R$ 2,2 milhões de emendas para indicação de cada deputado – nos corredores da Assembleia, o valor é considerado baixo e há burburinhos de que a base aliada tentará negociar um reajuste.

Diferente do que ocorre no plano federal, as emendas parlamentares estaduais não são impositivas, ou seja, o Governo do Estado é quem decide se acata ou não a indicação do deputado estadual.

Se for acatar em sua totalidade as emendas dos 30 parlamentares, o recurso dos cofres públicos estaduais destinado às emendas somará o montante de R$ 66 milhões.

O Orçamento do ano que vem tem previsão de receita no valor de R$ 32 bilhões. O Projeto da Lei Orçamentária Anual (PLOA) está tramitando na Assembleia Legislativa, onde deve ser votado até o final do ano.

Assembleia Legislativa do Espírito Santo; veja quem são os deputados.
Assembleia Legislativa (Foto: Tati Beling / Ales)

O modelo

Na decisão, o ministro não cita especificamente quais medidas de transparência devem ser adotadas pelos estados e municípios.

Mas as determinações da Corte no plano federal foram estabelecidas ao longo do processo que declarou inconstitucional o “orçamento secreto” – a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 854 –, do qual Dino é relator.

Entre as principais determinações está a identificação de autoria, objeto e destino das emendas parlamentares, a obrigatoriedade de um plano de trabalho para o recebimento das emendas “PIX”, assim como a adoção de ferramentas para rastrear o recurso público destinado. Muitas das medidas foram consolidadas com a edição da Lei Complementar 210/2024.

A decisão do ministro para que estados e municípios adotem regras mais rígidas de transparência atendeu à petição da Associação Contas Abertas, da Transparência Brasil e da Transparência Internacional-Brasil, admitidas no processo como interessadas (amici curiae).

O documento menciona especificamente os dados do “Índice de Transparência e Governança Pública” publicados pela Transparência Internacional-Brasil nos últimos meses.

Elas sustentam que, apesar dos avanços nos mecanismos de controle das emendas federais, as emendas estaduais, distritais e municipais “padecem de profunda opacidade”.

Na petição nº 151.847/2025, apresentada pelas entidades, é relatado o seguinte cenário: “Faltam informações básicas e necessárias para o exercício de qualquer tipo de controle sobre estes recursos. Por exemplo, 14 estados não informam o ente beneficiário da emenda nos seus portais de transparência, enquanto outros 17 não informam a localidade do gasto; 12 estados não detalham o histórico de execução das emendas e 6 não informam nem o objeto da emenda”.

“Registro que é inaceitável que, no curso de um processo de conformação à Constituição das emendas parlamentares federais, sob a condução da Suprema Corte, representantes políticos se dediquem a reproduzir práticas ímprobas em estados e municípios. Isso desafia a Constituição e a autoridade do STF, além de – acima de tudo – demonstrar desprezo por cidadãos e cidadãs tão carentes de acesso a serviços públicos, em meio a notórias dificuldades fiscais”, disse o ministro, em sua decisão.

Como funciona no ES?

De acordo com a Secretaria Estadual de Controle e Transparência (Secont), no Espírito Santo, as informações sobre as emendas parlamentares são disponibilizadas no Portal de Transparência do Estado.

“Nessa página, estão disponíveis para acesso do cidadão capixaba dados detalhados sobre as emendas, como autoria, valores, objeto, órgão responsável, e situação atual, em conformidade com os princípios da Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011) e com o compromisso do Governo do Estado com a transparência pública e o controle social”, diz nota da assessoria da Secont.

No endereço indicado pela assessoria, as emendas estão listadas, uma a uma, e referem-se às que foram aprovadas na Lei Orçamentária de cada ano.

De acordo com o Índice de Transparência e Governança Pública da Transparência Internacional-Brasil, o Espírito Santo está em primeiro lugar, com 95 pontos de 100 possíveis. A ONG classificou a transparência do governo capixaba como “ótima”. O 2º colocado é Goiás, com 93,4 pontos.

O que dizem os órgãos de controle

Na decisão, o ministro determinou que o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) desenvolvam programas de apoio a estados e municípios, como a elaboração de manuais, treinamentos e compartilhamento de soluções tecnológicas, para que os entes federativos apliquem as novas regras.

Ele também determinou que os Tribunais de Contas e Ministérios Públicos estaduais adotem medidas para assegurar que a execução das emendas siga o parâmetro federal.

Procurado, o Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCES) informou que está acompanhando as discussões e que está desenvolvendo um painel para juntar as informações sobre emendas parlamentares.

“O Tribunal de Contas do Estado está acompanhando as discussões sobre transparência das emendas PIX. Inclusive, para melhorar a divulgação, concentrando as informações todas em um único lugar, já está desenvolvendo um painel para apresentação dessas informações relativas a repasses aos municípios capixabas pelo governo federal. Em etapa posterior, serão coletados os dados das emendas ao Orçamento Estadual”, informou o Tribunal, em nota.

Já o Ministério Público do Estado (MPES) informou que, como a decisão é recente, ainda será discutida internamente. Em nota, também disse que irá aguardar um direcionamento formal do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG).

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Fabiana Tostes

Jornalista graduada pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e acompanha os bastidores da política capixaba desde 2011.

Jornalista graduada pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e acompanha os bastidores da política capixaba desde 2011.