Político que expôs e tentou impedir aborto em criança estuprada no ES será homenageado na Ales

O ex-candidato a vereador Pedro Teodoro dos Santos será um dos homenageados na sessão solene aos “Defensores Pró-Vida”, proposta pelo deputado Callegari (PL), que acontece na noite de hoje (14) na Assembleia. Pedro Teodoro é de São Mateus e é investigado por ter exposto uma menina de 10 anos vítima de estupro e ainda ter pressionado a família dela a manter a gravidez, fruto da violência.

Pedro foi denunciado pelos familiares da vítima e pelo Ministério Público Estadual e responde a dois processos na Justiça por ter invadido a casa da menina, tentado coagir a avó da criança a não seguir com o aborto legal – previsto em lei e autorizado pela Justiça – e ainda ter exposto o nome da vítima em redes sociais.

Pedro e grupo religioso na casa da família da vítima de estupro

Na época, Pedro era candidato a vereador pelo antigo PSL – ficou como suplente com pouco mais de 600 votos – e foi com um grupo religioso até a casa da menina tentar persuadir a família a não realizar o aborto, fruto do estupro. O grupo chegou a dizer que foi “Deus quem enviou o bebê”, para pressionar psicologicamente a família.

Pedro e o grupo sinalizaram que tinham contato com a então ministra de Direitos Humanos Damares Alves e que poderia levar a menina para um hospital em São Paulo para fazer pré-natal e esperar o tempo certo para o parto, encaminhando o bebê depois para a adoção.

Eles insistiram na proposta mesmo a família tendo dito que a gravidez era fruto de estupro, que colocava em risco a vida da menina e que já tinha decidido pelo aborto legal, contando inclusive com uma decisão judicial que amparava o procedimento.

A avó da criança chegou a desmaiar com a importunação e a família expulsou o político e o grupo da residência. Um familiar chegou a filmar a ação do grupo.

Como não conseguiu fazer com que a família mudasse de ideia, Pedro, então, expôs o nome da criança em suas redes sociais, o que contraria o Estatuto da Criança e do Adolescente. A postagem dizia: “#(nome da criança)Pelas2Vidas – Todos a favor da vida, me ajudem a levantar a # acima”.

A postagem viralizou após a ativista de extrema-direita Sara Winter – que na época era bolsonarista e ligada à ministra Damares – também publicar em suas redes sociais e divulgar, além do nome da criança, o hospital onde seria feito o procedimento, conclamando manifestantes para impedirem o aborto legal.

A menina foi levada para Pernambuco, para um hospital de referência em casos de abortos legais, uma vez que o Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes (Hucam), em Vitória, se negou a realizar o aborto com base numa normativa do Ministério da Saúde que recomenda avaliar o procedimento em caso de gestação superior a 22 semanas. A menina estava com 22 semanas e 4 dias ao chegar à unidade.

Postagem de Pedro Teodoro nas redes sociais

Com a divulgação dos dados de forma ilegal, a família da menina e médicos do hospital viraram alvos de ameaças. Dezenas de manifestantes de extrema-direita foram para a porta do hospital, com faixas, cartazes e até gritos de “assassina” contra a criança de 10 anos, vítima de estupro.

Profissionais que atenderam a menina disseram, à época, que ela estava em profundo sofrimento, e que esmurrava a barriga toda vez que se tocava no assunto. E que em nenhum momento ela manifestou desejo de continuar com a gestação.

O aborto foi realizado e a menina, juntamente com sua família, entraram num programa de proteção a vítimas de violência, no Estado, e tiveram identidade e endereço alterados. O tio da criança de 33 anos, autor dos abusos que já ocorriam há quatro anos, foi preso.

Ações na Justiça

O Ministério Público Estadual (MPES), por meio da Promotoria de Infância e Juventude de São Mateus, entrou com uma Ação Civil Pública contra o político. A ação cita que ele teve acesso, de forma ilegal, a detalhes do caso da criança; que invadiu a casa da família promovendo “terror psicológico” e ainda divulgou o nome da vítima.

O caso ainda está em tramitação na Vara de Infância e Juventude, Órfãos e Sucessões de São Mateus e no último dia 25 teve audiência para ouvir as partes e testemunhas do caso. O MPES pede a condenação de Pedro ao pagamento de multa por dano moral coletivo decorrente de conduta ilícita no valor de R$ 300 mil.

Na ação, o MPES alega que “a conduta adotada por Pedro Teodoro está incluída em uma estratégia midiática de viés político-sensacionalista pela que se porta como líder do grupo fundamentalista, a radical Sara Giromini. O político, em depoimento à polícia, admitiu que seguiu os ditames da extremista, expondo sobremaneira a triste condição da criança de 10 anos de idade, grávida de um familiar, por quem era cotidianamente estuprada há cerca de quatro anos”.

Já a ação da família, também por danos morais, corre em segredo de Justiça na Vara Cível de São Mateus. A coluna conseguiu apurar que esta ação já está mais adiantada e que está próximo de sair a sentença.

A coluna não conseguiu localizar Pedro Teodoro. Caso haja uma manifestação por parte do homenageado, a coluna será atualizada.

“Ele merece essa homenagem”

Callegari / crédito: Ales

Ao subir à tribuna para convidar outros parlamentares para participarem da sessão solene, o deputado Callegari (PL), proponente da sessão, chamou Pedro Teodoro de “amigo” e disse que ele merece a homenagem.

“Os defensores pró-vida que estarão aqui hoje fazem uma luta fantástica, uma luta como a do meu amigo Pedro Teodoro, de São Mateus, que ao lutar contra aquele aborto criminoso (…) colocou a própria vida dele em risco e por isso sofreu vários processos, por isso merece essa homenagem”, disse, na tribuna da Ales.

Callegari chegou a dizer que é contra o aborto e que a permissão para a realização do aborto legal, prevista pelo Código Penal, é inconstitucional.

O aborto é proibido no Brasil, mas é autorizado em três casos de acordo com o Código Penal e entendimento do STF: quando é fruto de estupro, quando coloca em risco a vida da gestante e quando o feto é anencéfalo (sem cérebro). A menina de São Mateus reunia dois desses requisitos: o risco à sua própria vida e o abuso sexual.

Além de Pedro Teodoro, mais 20 pessoas serão homenageadas, entre elas, o senador Magno Malta, segundo informou a assessoria de Callegari. A Assembleia foi procurada para se manifestar sobre o caso, mas disse que a responsabilidade sobre os homenageados é do proponente da sessão, no caso, o deputado. A sessão está marcada para as 19 horas.

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Em tempo: Após a sessão de homenagens e a publicação desta coluna, Callegari enviou uma nota defendendo a homenagem: “Homenageei o ativista Pedro Teodoro dos Santos, homem corajoso e honrado, que se posicionou contrário ao aborto de um feto em adiantado processo de gestação”, disse o deputado. E acrescentou:

“Pedro Teodoro é um ativista lúcido, de extremo brio e que naquele momento estava em busca de defender integralmente a vida de duas crianças, uma menor de idade, outra um feto formado e que goza de direitos, principalmente, o direito de nascer”.

Sobre os processos que Pedro Teodoro responde na Justiça por ter exposto a menina, vítima de estupro, Callegari afirmou: “Acredito que ele será inocentado e sua luta conhecida e reconhecida por aqueles que lutam contra o aborto. Ele sempre terá todo meu apoio, por lutar em defesa da vida”.