ELEIÇÃO DO MPES: Quem perde e ganha, os recados da votação e a saia-justa do governador

Francisco, Maria Clara e Pedro Ivo

Para alguns, o resultado da eleição foi surpreendente. Para outros, frustrante. A lista tríplice para a escolha do novo chefe do Ministério Público trouxe o promotor Pedro Ivo, como o mais votado com 146 votos; o promotor Francisco Berdeal em 2º lugar, com 132 votos; e a promotora Maria Clara Mendonça, com 97 votos.

Nos bastidores, nem mesmo os três eleitos ficaram totalmente satisfeitos com o resultado: eles esperavam receber mais votos, mas foram 257 votos em branco, ou seja, muitos membros do Ministério Público optaram pelo “voto camarão”, abrindo mão de votar em três nomes e cravando apenas um ou dois.

Numa análise mais detalhada sobre a eleição, porém, é possível ver quem se saiu melhor ou pior, os recados passados pela votação e a saia-justa do governador agora para escolher quem irá comandar o MPES no biênio 2024-2026 – ele já é alvo de pressão de associações que pedem a nomeação do mais votado, conforme noticiou a coluna ontem.

Auditório concorrido

Não chegou a lotar, mas há muito tempo – há quem diga, desde 2013 – que não se via uma movimentação tão grande entre os candidatos e seus apoiadores no auditório da sede do Ministério Público do Estado, à espera da apuração dos votos da eleição. Todos os candidatos estavam presentes e alguns levaram torcida.

Antes mesmo de começar a campanha, os sinais já davam conta de que seria uma eleição acirrada, pelo peso dos concorrentes e pelas circunstâncias.

O grupo que comanda o MPES há 12 anos foi rachado para a disputa, com dois principais candidatos: Francisco Berdeal, apoiado pela atual PGJ Luciana Andrade, e Danilo Lírio, apoiado pelo ex-PGJ e desembargador Eder Pontes e pela subprocuradora e também ex-PGJ Elda Spedo. Além dos dois ainda teve a candidatura avulsa do procurador Josemar Moreira.

Sem contar que os candidatos independentes e/ou de oposição também se prepararam para a disputa, impondo ainda mais dificuldades ao grupo da situação.

Quando o resultado saiu, muitos se surpreenderam. Havia, por parte dos presentes, a expectativa de que Francisco fosse o mais votado; que Danilo fosse fazer parte da lista e que Maria Clara não fosse entrar. Nos últimos dias, a coluna apurou com eleitores do MPES que o nome de Pedro Ivo estava em bastante evidência, mas ele ficar em primeiro lugar da lista pegou muitos de surpresa.

Após o resultado sair e o susto passar, a plateia cumprimentou todos os candidatos.

Da confiança à frustração

Danilo Lírio

Logo que saiu o resultado, o promotor Danilo Lírio deixou o auditório. Sob reserva, alguns promotores ouvidos pela coluna disseram que ele saiu bastante chateado com o resultado da votação – ele recebeu 64 votos.

Antes de começar a apuração, Danilo chegou a conversar com a coluna De Olho no Poder e disse que estava muito confiante. “Fizemos um bom trabalho”, disse ele.

Danilo é chefe de apoio ao gabinete da PGJ, mas não contou com o apoio da atual chefe do Ministério Público em sua candidatura. Ele era o candidato de Eder Pontes.

No embate Luciana x Eder, Luciana se saiu melhor

A atual chefe do Ministério Público estadual, Luciana Andrade, foi lançada por Eder Pontes – ex-procurador-geral de Justiça – em 2020. Do mesmo grupo, Luciana entrou na disputa pela vaga de PGJ para suceder Eder que, um ano depois, virou desembargador do Tribunal de Justiça.

Em 2022, Luciana foi candidata à reeleição, numa disputa em chapa única e ainda que indiretamente, contou com o apoio do padrinho na empreitada. Porém, no ano passado, a relação entre os dois começou a dar sinais de desgaste.

Há quem diga que o afastamento entre os aliados se deu por conta da eleição para a sucessão de Luciana. Ela queria apoiar um nome e Eder, outro. E não conseguiram chegar a um consenso. Mas há também burburinhos de que esse teria sido apenas um dos motivos da divergência e rompimento entre os dois.

Fato é que a eleição serviu para que criador e criatura pudessem medir forças por meio de seus candidatos e, pelo menos nessa etapa, Luciana se saiu melhor. Seu candidato, Francisco Berdeal, foi o segundo mais votado com 132 votos. Já o candidato de Eder, o promotor Danilo Lírio, teve apenas 64 votos (de 268 membros aptos a votar) e ficou fora da lista tríplice.

Há relatos, nos bastidores, de que Luciana entrou de cabeça na campanha, pedindo votos e não medindo esforços para eleger Francisco. Independentemente disso, trata-se de um marco na história do Ministério Público.

Além de apontar para o fim da “Era Eder”, pode ser o começo de uma nova “dinastia” na instituição, a “Era Luciana”, que sai da sombra do padrinho e até então líder, para ser protagonista e escrever a própria história no MPES. Isso, claro, a depender da definição do novo PGJ.

A chefe do Ministério Público, Luciana Andrade, entrega lista tríplice para o governador / crédito: MPES

O recado de insatisfação da categoria

Embora Luciana tenha tido um bom desempenho no apoio ao seu candidato, não passa despercebido o recado de insatisfação à atual gestão, transmitido pela categoria, por meio da votação.

A oposição emplacou dois nomes na lista tríplice – incluindo o mais votado – e os votos dados em candidatos que não representam o grupo que está no poder correspondem a 59,4% da totalidade dos votos válidos.

Ou seja, os votos dados em candidatos independentes ou da oposição somaram 325 (59,4%), enquanto os votos dados em candidatos do grupo da situação somaram 222 (40,6%).

Mais da metade (54,5%) dos membros do MPES aptos a votar escolheram Pedro Ivo, que embora se coloque como independente, está no lado oposto ao da chefe do MPES, Luciana Andrade.

Inclusive, no ano passado, na eleição para a presidência da Associação do Ministério Público (AESMP), Pedro Ivo conseguiu eleger seu sucessor, impondo uma importante derrota ao grupo de Luciana, que também pleiteava o posto. A eleição da AESMP costuma servir de termômetro para a eleição do MPES.

Pedro Ivo ser agora o mais votado mostra que mais da metade da categoria está insatisfeita com a atual gestão e que quer mudança de rumo, um ponto que pode ser colocado na balança na hora da definição por parte do governador. Veja a votação completa:

  • Pedro Ivo: 146 votos
  • Francisco Berdeal: 132
  • Maria Clara: 97
  • Marcello Queiroz: 82
  • Danilo Lírio: 64
  • Josemar Moreira: 26
  • Votos totais: 547
  • Votos possíveis: 804
  • Brancos: 257
  • Abstenção: 0
Sede do MPES

A cobrança pelo mais votado

Somado ao recado que saiu da votação, já começou a pressão para que o governador Renato Casagrande nomeie o mais votado para o comando do MPES. A coluna noticiou, ainda ontem, que a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e a Associação Espírito-Santense do Ministério Público (AESMP) protocolaram um ofício ao governador pedindo a nomeação do 1º da lista.

O documento foi enviado antes da apuração dos votos e trata-se de uma praxe em todo o País. Seria uma forma de respeitar e prestigiar a escolha da maioria da categoria.

Porém, a lei que rege a nomeação dos PGJs não obriga que seja o primeiro da lista a ocupar o cargo e Casagrande já disse que não tem obrigação de escolher o mais votado.

Ontem o governador também disse à coluna que pretende conversar com os três candidatos eleitos, antes de tomar sua decisão. As conversas ocorrerão a partir da semana que vem. Ele tem 15 dias para definir.

O que vai pesar mais?

Embora tenha tempo e possa jogar a decisão para o final do prazo a escolha do novo PGJ – até por conta da urgência das chuvas, que mais uma vez fizeram estrago no Sul do Estado – o governador está numa saia-justa daquelas.

Isso porque os três candidatos eleitos têm boa relação com o governo do Estado – o que pode ser estreitado ainda mais com as conversas da próxima semana. E também porque cada um tem pontos a favor e padrinhos de peso na retaguarda de apoio.

Maria Clara é considerada uma “promotora chão de fábrica” pela sua atuação principalmente na área de políticas públicas. É doutoranda de Direito Público na UERJ e tem como orientador o ministro e presidente do STF Luís Roberto Barroso, que acaba sendo um padrinho de peso. Ela também é muito próxima do procurador Marcello Queiroz, que ficou em 4º na disputa.

Francisco Berdeal é o que representa a continuidade da atual gestão, que é muito próxima ao governo do Estado. Ele faz parte da cúpula do comando do MPES e tem como “madrinha” a atual chefe da instituição, Luciana Andrade. Contam a seu favor a boa relação e a segurança que a atual gestão já proporcionam ao Palácio Anchieta.

Já Pedro Ivo tem a seu favor a votação em 1º lugar, as associações que encampam a escolha do mais votado e pode, segundo burburinhos nos bastidores, herdar o apoio de alguns candidatos e lideranças que não conseguiram entrar na lista. Ele é irmão do ex-deputado Sandro Locutor, que faz parte da gestão Casagrande.

Eder Pontes ainda pode influenciar na escolha do novo PGJ? / crédito: MPES

Há também uma incógnita no ar sobre qual será o posicionamento do desembargador Eder Pontes agora. Se ele sairá de campo, por conta da derrota do seu aliado, ou se poderá apoiar alguém e até influenciar na escolha do governador. Há quem diga que ele possa não declarar um apoio diretamente, mas se posicionar firmemente de forma contrária a um candidato.

Seja quem for o escolhido para tomar posse como novo procurador-geral de Justiça do Espírito Santo no próximo dia 2 de maio, essa eleição do MPES já entrou para a história.

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