
Após o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) embargar obras e um grupo denunciar ao Ministério Público supostas intervenções irregulares no cemitério Pedro Fontes, em Cariacica, o Conselho Estadual de Cultura (CEC) retomou o processo de tombamento do sítio arqueológico.
Durante a 182ª reunião do conselho, na última quinta-feira (06), o colegiado decidiu que fará visitas técnicas ao local para definir a área de proteção do sítio, que conta, além do cemitério, com a capela, o Educandário Alzira Bley e o antigo Hospital Pedro Fontes – construído na década de 30 para abrigar e isolar pacientes diagnosticados com hanseníase.
“O Conselho, por meio da Câmara de Patrimônio Arquitetônico, Bens Móveis e Acervos (CPABMA), acompanha o processo de tombamento do Hospital Pedro Fontes e realizará novas visitas técnicas para definir a área de proteção. Seguindo o rito dos demais tombamentos, serão realizadas reuniões, audiências públicas para elaboração da minuta de resolução”, informou a Secretaria de Estado da Cultura (Secult), em nota, à coluna De Olho no Poder.
O processo de tombamento da região foi iniciado em 2008. Em março de 2011 foi aprovado o tombamento provisório, mas depois disso, o processo teve pouco avanço.
A região passou a ser alvo de divergências do ano passado para cá. Conhecida como Fazenda Itanhenga, a área pertencia ao governo do Estado, mas foi doada para a Prefeitura de Cariacica em janeiro de 2024. Na ocasião, o prefeito de Cariacica, Euclério Sampaio (MDB), teria anunciado o desejo de construir um polo empresarial na região.
Segundo denúncia protocolada pela vereadora de Cariacica Açucena (PT) e um grupo que inclui historiadores e familiares de ex-internos do hospital, a região estaria abandonada e sendo alvo constante de depredação e vandalismo. Além de receber intervenções que, segundo a denúncia, seriam irregulares.
Entre as supostas irregularidades, estaria ocorrendo a abertura de novas covas na região do cemitério histórico. De acordo com o Iphan, o cemitério e seu entorno compõem um sítio arqueológico classificado como pré-colonial e histórico. No local foram encontrados vestígios históricos e pré-históricos de povos indígenas, além dos túmulos da comunidade que ali habitava.
No último mês de agosto, o Iphan esteve no local e determinou o embargo de qualquer obra ou atividade que afete o solo na área do cemitério. O instituto considerou que as intervenções da prefeitura estariam atingindo o sítio arqueológico.
Técnicos da Secult também acompanharam a visita, na ocasião. “Recentemente, a Gerência de Memória e Patrimônio da Secult acompanhou o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em vistoria técnica realizada no local, cujo laudo apontou a necessidade de medidas de preservação, especialmente nas áreas do Cemitério Padre Mathias, da Colônia Itanhenga e do Educandário Alzira Bley”, diz trecho da nota da Secult.
O MPES questionou a Secult sobre o processo de tombamento da região, segundo confirmou a assessoria de imprensa da pasta. Ainda não foi marcada a data das visitas técnicas por parte do conselho.
Demarcação
Desde 2021, o sítio arqueológico também é reconhecido pelo município de Cariacica, por meio do decreto municipal 274, assinado por Euclério.
A denúncia feita ao Ministério Público cita, entre outras coisas, que o artigo 7º desse decreto municipal estaria sendo descumprido. O texto do decreto diz:
“Se faz necessária a demarcação do território descrito para manutenção do bem tombado assim como para que o Poder Público possa licitar recursos (sejam internos ou externos) para o restauro da capela, a não abertura de covas novas e identificação do local como órgão tombado pelo Conselho Municipal de Política Cultural de Cariacica”.
Na ocasião da denúncia, noticiada pela coluna De Olho no Poder, a Prefeitura de Cariacica informou que estaria providenciando a regularização da área e que uma arqueóloga foi contratada pelo município para auxiliar nas questões que envolvam intervenções, junto ao Iphan.
“A prefeitura esclarece que tem se adequado para seguir rigorosamente todas as exigências legais e técnicas necessárias àquela área e não se furtará a cumprir com todos elas”, disse nota da gestão, à época.
“Tenho tios enterrados lá”

O engenheiro e ex-prefeito de Colatina Leonardo Deptulski faz parte do grupo que assina a denúncia feita ao Ministério Público. Ele tem laços familiares com a região.
“Tive um avô e dois tios que foram para o Hospital Pedro Fontes, porque antigamente o tratamento de hanseníase era assim, as pessoas eram separadas da família e isoladas lá. Meus tios se casaram lá na colônia, morreram e estão enterrados lá”, disse o engenheiro.
Ele disse que a intenção do grupo é criar uma entidade para zelar pela preservação cultural e histórica da região. “Queremos criar uma associação ou um instituto para defender a preservação cultural da Colônia Pedro Fontes”.
Deptulski também informou que o grupo estuda uma forma de revogar a doação da área feita pelo Estado à Prefeitura de Cariacica.
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