Política

Governo Lula põe sigilo de até 15 anos em telegramas diplomáticos sobre tarifaço e sanções a Moraes

Ministério das Relações Exteriores classificou 9 documentos como secretos e outros 14 como reservados; dois telegramas foram classificados com o mais alto grau de sigilo após o Estadão solicitar acesso; Itamaraty foi procurado após a publicação e ainda não se manifestou

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Alexandre de Moraes e Donald Trump
Foto: Rosinei Coutinho/STF e Reprodução/Instagram

O Ministério das Relações Exteriores impôs sigilo a uma série de telegramas trocados entre o Brasil e o posto diplomático do país em Washington, capital dos Estados Unidos, nos últimos 10 meses.

O período compreende a reta final da campanha eleitoral que sagrou Donald Trump presidente dos Estados Unidos e o acirramento das relações diplomáticas com o governo americano por causa do tarifaço e da retaliação ao Poder Judiciário brasileiro, sobretudo na figura do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes por suas decisões em processos envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e empresas americanas.

O Itamaraty foi procurado após a publicação e ainda não se manifestou.

O grau de sigilo das informações varia entre reservado — o mais baixo, com 5 anos de proibição de acesso às informações — e secreto, cuja vedação de acesso ao conteúdo é de 15 anos — este o segundo grau mais restritivo de classificação de informação.

Todos os documentos, independentemente do conteúdo e grau de sigilo, foram classificados com base no inciso II , artigo 23, da LAI, que diz que informações podem ser restringidas quando o seu conteúdo “prejudicar ou pôr em risco a condução de negociações ou as relações internacionais do País”.

Embora sigilosos, é possível identificar pelo assunto dos termos de classificação que os telegramas tratam do tarifaço patrocinado pelo governo Trump, da suspensão de vistos de autoridades e cidadãos brasileiros, de processos judiciais — Moraes atualmente é alvo de ação movida pelo Rumble e pela Truth Social, rede social do presidente dos EUA — e até mesmo do que foi classificado pelo Itamaraty como “repressão transnacional”.

Foram enviados dois telegramas pela Embaixada do Brasil em Washington no dia 26 de junho deste ano abordando o tema da “repressão transacional”. O documento, agora classificado como secreto, também menciona os termos “Congresso” e “Estados Unidos”.

No mesmo dia em que o telegrama foi encaminhado ao Brasil, o deputado republicano Chris Smith enviou uma carta ao secretário de Estado, Marco Rubio, pedindo que o governo Trump agisse o quanto antes para sancionar Moraes.

As sanções vieram quase um mês depois, no dia 30 de julho, quando um órgão vinculado à Secretaria do Tesouro dos Estados Unidos impôs sanções financeiras ao ministro por meio da Lei Magnitsky.

Antes disso, no dia 19 de julho, a gestão Trump suspendeu os vistos de Moraes, outros sete ministros do STF e do procurador-geral da República, Paulo Gonet.

O rol de informações classificadas como secretas inclui ainda telegramas sobre “conversas com assessores parlamentares” de deputados dos EUA, “subsídios para diálogos com interlocutores norte-americanos”, “cooperação bilateral contra ilícitos transnacionais e crime organizado” e comércio entre os dois País.

Ao todo, 9 documentos contêm sigilo de 15 anos e outros 14 estão impedidos de serem acessados por 5 anos.

Dentre os documentos colocados sob sigilo, dois deles foram classificados como secretos após o Estadão solicitar acesso via Lei de Acesso à Informação (LAI). Um desses documentos aborda o comércio entre os dois Países e o outro foi genericamente descrito como um telegrama sobre “Brasil-EUA”.

Como mostrou o Estadão, as táticas de classificar informações após a solicitação via LAI e a descrição genérica do assunto do documento são usadas por outros ministérios do governo Lula, que repetem uma estratégia adotada durante a gestão Bolsonaro.

Alguns desses telegramas solicitados pelo Estadão, de tão sensíveis, foram classificados como sigilosos pelo próprio ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira.

No dia 29 de novembro de 2024, mais de vinte dias após a vitória eleitoral de Trump, o chanceler tornou secreto um telegrama produzido em setembro com “subsídios para diálogos com interlocutores norte-americanos”.

Em maio deste ano, o ministro impôs o mesmo grau de sigilo a uma mensagem sobre cooperação bilateral com os EUA para enfrentamento do tráfico.

O Estadão solicitou acesso a todos os telegramas que mencionassem os termos STF, Moraes, Bolsonaro, tarifas e o lobby do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos EUA. Dentre as informações que seguem públicas, há apenas informes de missões oficiais de Eduardo no país e ataques de parlamentares republicanos a Moraes, com pedidos de sanções.

Há também uma série de documentos públicos produzidos por associações de agricultores, como a de produtores de laranja, que expressaram as suas preocupações com os efeitos da tarifação sobre os seus negócios.

*As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.