Política

Moraes e Gonet costuram trama golpista em julgamento com único réu presente

Ministro relator e procurador-geral da República em leitura de relatório e acusação desfizeram ideia de que tentativa de ruptura democrática não passou de "mera cogitação"

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Paulo Gonet e Alexandre de Moraes
Paulo Gonet e Alexandre de Moraes. Foto: Gustavo Moreno/STF

Durante 2 horas e 50 minutos na manhã desta terça-feira (2) o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Mores e o procurador-geral da República, Paulo Gonet, se empenharam para costurar a trama golpista e desfazer a ideia de que a tentativa de ruptura democrática não passou de fatos isolados e “mera cogitação”.

A Primeira Turma do STF deu início ao julgamento da ação penal 2668, que julga o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sete membros da cúpula de seu governo (2019-2022) por tentativa de golpe de Estado e outros crimes – o chamado “núcleo crucial”. Só um dos réus, o ex-ministro da Defesa e general Paulo Sérgio Nogueira, compareceu à sessão.

Fortalecimento da democracia

Moraes e Gonet, cada um em sua leitura, destacaram que o fortalecimento da democracia brasileira passa por julgar os responsáveis pela tentativa de golpe de Estado.

Para o procurador-geral, não reprimir tentativas golpistas beneficia modelos autoritários, tanto no Brasil quanto no exterior.

“O que estão sendo julgados hoje são atos considerados graves, enquanto quisermos manter o Estado Democrático de Direito”, afirmou Gonet.

Responsável pela acusação e o segundo a falar nesta manhã, Gonet afirmou que os fatos narrados pela PGR não são fatos isolados, mas que se conectam visando o mesmo objetivo de subverter a normalidade democrática para manter Bolsonaro no poder.

Segundo o procurador-geral, a mera convocação de militares para apresentar um plano e tentar convencê-los a embarcar já se trata de execução. E citou as reuniões para as quais Bolsonaro convocou os comandantes das três Forças Armadas – Marco Antônio Freire Gomes (Exército), Carlos de Almeida Baptista Júnior (Aeronáutica) e Almir Garnier (Marinha), o único a se tornar réu, por aderir ao chamado golpista, segundo a PGR.

“Não é preciso pensamento intelectual extraordinário para entender que, quando o presidente da República e o ministro da Defesa convocam a cúpula militar para apresentar documento de formalização de golpe de Estado, o processo criminoso já está em curso”, declarou Gonet.

“Punhal Verde e Amarelo”

O PGR também afirmou que o plano “Punhal Verde e Amarelo” chegou a ser implementado, uma vez que houve monitoramento presencial de Moraes, aproximação física do alvo e movimentações para realizar a “neutralização” do ministro.

A argumentação visa desmontar a tese de alguns réus de que o planejamento de golpe estava, no fundo, no plano das ideias.

O general da reserva Mário Fernandes, ex-secretário-executivo da Secretaria Geral da Presidência no governo Bolsonaro e réu no “núcleo 2” da trama, por exemplo, chegou a afirmar que o projeto para assassinar as autoridades “não passou de um pensamento digitalizado”.

Relator da ação, Moraes passou recados e resumiu 19 meses de golpismo, entre julho de 2021 e o 8 de janeiro de 2023, em menos de duas horas de leitura de seu relatório. Ele afirmou que a pacificação do País – clamada pelos bolsonaristas por meio da anistia no Congresso – só viria por meio do cumprimento da Constituição.

STF independente

Moraes também reagiu à ofensiva do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que impôs um tarifaço ao Brasil citando uma “caça às bruxas” a Bolsonaro como embasamento. O ministro repeliu a pressão para submeter o STF e o Brasil a um Estado estrangeiro.

Ele também resumiu a série de eventos que levaram ao 8 de Janeiro e visou mostrar, em aceno às defesas dos réus, que não houve cerceamento ao direito de defesa, como alguns se queixaram.

O ministro descreveu toda a fase de instrução processual em que as defesas tiveram acesso à integralidade das provas obtidas pela investigação da Polícia Federal e cita que as audiências foram realizadas por videoconferência com testemunhas do caso. “De 82 testemunhas arroladas, foram ouvidas 52″, disse o relator.

Alguns dos réus do núcleo crucial demonstraram vulnerabilidades nesta terça-feira. Se Bolsonaro deixou de comparecer ao julgamento por questões de saúde, segundo seus advogados, Nogueira apareceu no STF com uma tipoia no ombro esquerdo: “(Machuquei) jogando pingue-pongue com meu neto”, justificou.

Presenças e segurança

Sendo o ex-ministro da Defesa o único réu presente, a esquerda esteve em maioria. Quatro deputados federais compareceram ao STF para assistir ao julgamento: Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Lindbergh Farias (PT-RJ), Fernanda Melchionna (PSOL-RS), Pedro Uczai (PT-PR) e Henrique Vieira (PSOL-RJ).

O Tribunal passa por um megaesquema de segurança nesta terça-feira. Quem sobe até o terceiro andar do prédio das Turmas, apelidada de “Igrejinha”, precisa passar por dois raios-x e uma insistência na checagem das credenciais.

Cães farejadores, drones, confisco de garrafas d’água e um pelotão de policiais fazendo varreduras e o policiamento da Corte compuseram as novas medidas de segurança.

*As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.