Política

Presos na Operação Boca Livre são ouvidos em audiência de custódia

A audiência de custódia não trata diretamente do mérito das detenções, apenas verifica se os presos foram assistidos por advogados e se eles tinham conhecimento da razão das prisões

14 pessoas presas temporariamente pela Polícia Federal Foto: Agência Brasil

As 14 pessoas presas temporariamente na terça-feira (28) pela Polícia Federal, em São Paulo, na Operação Boca Livre, foram ouvidos na última quarta-feira (29) em audiência de custódia na 3ª Vara Federal Criminal, na capital paulista. O grupo é acusado de ter participado de fraudes que desviaram R$ 180 milhões em recursos da Lei Rouanet.

A audiência de custódia não trata diretamente do mérito das detenções, apenas verifica se os presos foram assistidos por advogados e se eles tinham conhecimento da razão das prisões. De acordo com a procuradora da República Karen Louise Jeanette Kahn, nenhum dos presos contestou a detenção. “Não era a oportunidade para esse tipo de manifestação, [a audiência de custódia] simplesmente visa verificar a legalidade da detenção dessas pessoas”, disse após a sessão.

A Polícia Federal e a Justiça Federal não informaram os nomes dos presos, nem das empresas envolvidas e alegaram que a lista está em segredo de Justiça. Segundo as investigações, os 14 detidos são produtores culturais que atuavam no grupo desde 2001.

A ação investiga 13 empresas patrocinadoras que trabalharam com o grupo e estima-se que mais de 250 projetos tiveram recursos desviados. Um dos proprietários dessas empresas foi preso. “Isso foi objeto de análise pela Polícia Federal e pelo Ministério Público e as prisões foram determinadas em um primeiro momento, em se verificando, a partir das provas colhidas, o grau de envolvimento e de gravidade desse envolvimento dessas pessoas e o grau de periculosidade que elas poderiam representar caso ficassem soltas”, disse a procuradora.

Participação de servidores

Não foi preso nenhum servidor do Ministério da Cultura (Minc) que poderiam estar envolvidos no caso. Segundo a procuradora, ainda estão sendo identificados funcionários do Minc que possam ter participado dos desvios de recursos. “Há suspeita [da participação de servidores] por conta da facilidade com que esses projetos foram aprovados e ausência de completa fiscalização durante esses 11 anos”, disse.

A procuradora disse que o Ministério Público pedirá o ressarcimento dos recursos desviados. Ela reconhece, no entanto, que nem todos os valores poderão ser devolvidos. “Há certos valores que uma vez perdidos, dificilmente se recobra, como oportunidades que muitas pessoas poderiam ter tido no acesso a projetos culturais e que foram sonegados por conta dessas fraudes. Há valores que podem ser recuperados, outros não”.

Investigações

Segundo investigações da Polícia Federal, as empresas recebiam os valores captados com a lei e ainda faturavam com a dedução fiscal do imposto de renda. Com isso, o montante desviado pode ser ainda maior do que R$ 180 milhões.

A organização apresentava iniciativas ao Ministério da Cultura e à Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo para a aprovação e utilização de verbas de incentivo fiscal previstas na Lei Rouanet. As investigações mostram que os recursos foram usados para custear eventos corporativos, shows com artistas famosos em festas privadas para grandes empresas, livros institucionais e até mesmo festa de casamento, segundo o Ministério da Transparência.

Criada em 1991, a Lei Rouanet concede incentivos fiscais para projetos e ações culturais. Por meio da lei, pessoas físicas e jurídicas podem aplicar parte do Imposto de Renda devido em projetos culturais. Atualmente, mais de 3 mil projetos são apoiados a cada ano por meio desse mecanismo.

Em nota, o Ministério da Cultura informou que as investigações para apuração de uso fraudulento da Lei Rouanet têm o apoio integral do ministério e que “se coloca à disposição para contribuir com todas as iniciativas no sentido de assegurar que a legislação seja efetivamente utilizada para o objetivo a que se presta, qual seja, fomentar a produção cultural do país".

Os presos na operação poderão responder por organização criminosa, peculato, estelionato contra a União, crime contra a ordem tributária e falsidade ideológica, cujas penas podem chegar a até 12 anos de prisão.