Política

Venda de sentença: após habeas corpus, juiz Alexandre Farina deixa prisão no Quartel de Maruípe

Farina teve a prisão preventiva decretada há uma semana após votação dos desembargadores do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES)

Foto: Reprodução / Twitter

O juiz Alexandre Farina deixou a prisão no Quartel da Polícia Militar, em Vitória, na madrugada desta sexta-feira (06). Ele saiu às 2h30, segundo a assessoria de imprensa, e já está em casa. 

Tudo isso aconteceu graças a um habeas corpus obtido por sua defesa no Superior Tribunal de Justiça (STJ), na noite de quinta-feira (05). O magistrado estava detido desde a semana passada, em 29 de julho. 

Já o juiz Carlos Alexandre Gutmann continua detido no local. Os dois são suspeitos de envolvimento em um esquema de venda de sentença no Espírito Santo, ocorrido em 2017.

A decisão pela soltura de Farina é do ministro Joel Ilan Paciornik, relator do caso no STJ. Em sua decisão, ele alegou que não há motivos para manter Alexandre Farina preso preventivamente, uma vez que ele já estava afastado de suas funções no Fórum da Serra e não vinha descumprindo a determinação, de modo a atrapalhar as investigações realizadas pelo MPES.

Farina, que é diretor do Fórum da Serra, e Gutmann, titular da Vara da Fazenda Pública Estadual daquela comarca, tiveram a prisão preventiva decretada há uma semana, após votação dos desembargadores do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES). 

Em seu voto, a relatora do caso no TJES, desembargadora Elisabeth Lordes, indicou a necessidade da prisão preventiva dos juízes. Segundo ela, os magistrados representavam riscos para o andamento das investigações.

Outros dois envolvidos no caso, o empresário Eudes Cecato e o ex-funcionário da Associação de Magistrados do Espírito Santo (Amages), Davi Ferreira da Gama, seguem em um presídio comum.

Por meio de nota, os advogados responsáveis pela defesa de Alexandre Farina comemoraram a decisão do ministro do STJ e destacaram que o juiz sempre se colocou à total disposição do TJES, mas não chegou a ser ouvido.

Os advogados ressaltaram ainda que Alexandre Farina está disposto a contribuir com as investigações e que sua inocência será comprovada ao final do processo.

Confira a nota na íntegra:

Nesta quinta-feira, dia 5 de agosto de 2021, a defesa técnica do juiz Alexandre Farina Lopes obteve importante vitória com liminar deferida pelo ministro Joel Ilan Paciornik, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), para liberdade imediata do magistrado. O ministro acatou o pedido da defesa, que sempre sustentou que não há motivos suficientes que justificassem a medida extrema da prisão preventiva. Farina sempre se colocou à total disposição do Tribunal e não chegou sequer a ser ouvido.

Com a decisão, foram reestabelecidas medidas cautelares decretadas inicialmente pelo Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) e fixada uma nova medida alternativa para proibição de contato entre os corréus.

A defesa técnica reafirma o interesse do juiz Farina em contribuir com a instrução processual, com o respeito devido ao Tribunal de Justiça do Espírito Santo, na mais absoluta certeza de que sua inocência será comprovada.

Cordialmente,

Rafael Lima, Larah Brahim, Mariah Sartório, Antônio Carlos de Almeida Castro (Kakay), Roberta Castro, Marcelo Turbay, Liliane Carvalho, Álvaro Campos e Ananda França.

Juízes foram afastados pelo TJES

O afastamento cautelar de Farina do Fórum da Serra foi determinado durante sessão do Pleno do TJES, no dia 15 de julho. Na ocasião, também foi determinado o afastamento do juiz Carlos Alexandre Gutmann, outro investigado no caso da suposta venda de sentença.

Além do afastamento de suas funções, os magistrados foram obrigados a manter uma distância mínima de 500 metros das dependências do Fórum da Serra e a não ter contato com assessores e servidores do Judiciário Estadual.

A decisão foi tomada após solicitação feita pelo Ministério Público do Estado (MPES) para evitar que os magistrados interferissem na condução do processo instaurado contra eles, que investiga a suposta venda de sentença. 

O pedido de abertura de inquérito contra os juízes e outras sete pessoas foi protocolado no dia 31 de maio deste ano pela procuradora-geral de Justiça, Luciana de Andrade. 

O objetivo era apurar a suposta prática de corrupção passiva, corrupção ativa e exploração de prestígio. Por meio de fontes, o Folha Vitória teve acesso a todo conteúdo investigado pelo MPES, com cerca de 150 páginas, que traz os indícios de corrupção envolvendo magistrados, empresário e advogados.

Segundo as apurações do MPES, o juiz Alexandre Farina, da Comarca da Serra, teria recebido propina para intermediar a venda de sentença em favor de uma imobiliária.

A sentença foi proferida, em março de 2017, pelo juiz Carlos Alexandre Gutmann, que também teria recebido pagamento indevido para favorecer a empresa.

Além dos magistrados, o MPES apontou a participação de outros envolvidos, como o dono da imobiliária, que teria pagado propina para ser beneficiado no registro de um terreno. Advogados da empresa também são investigados por envolvimento no caso, além do ex-policial civil Hilário Frasson.

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JUIZ ALEXANDRE GUTMANN CONTINUA PRESO

Além de Farina, o juiz Carlos Alexandre Gutmann teve a prisão preventiva decretada na semana passada. Ele continua preso no Quartel da Polícia Militar, em Maruípe

A reportagem questionou à defesa de Gutmann sobre um possível pedido de habeas corpus, mas os representantes do juiz informaram que o posicionamento segue o mesmo da última semana.  

Veja abaixo a nota na íntegra:

O Juiz Carlos Alexandre Gutmann teve seu nome usado de modo unilateral e desautorizado em conversas das quais nunca participou.
Apesar da comunicação registrada nos autos, é preciso deixar claro que não há uma só mensagem que tenha partido do Juiz Gutmann ou que tenha sido a ele enviada pelos suspeitos.
Gutmann está sendo massacrado por ter examinado um processo e por ter dado uma decisão juridicamente fundamentada, a respeito da qual desconhecia, totalmente, a existência de bastidores envolvendo tratativas ilícitas - as quais repudia.
O juiz tem se colocado à disposição das autoridades desde o início das investigações. Abriu mão de sua prerrogativa funcional de ser ouvido pela desembargadora relatora do caso e declarou toda a verdade na sede do GAECO/MPES, demonstrando seu claro e sincero desejo de provar sua inocência.
Gutmann nunca trocou de aparelho celular ou de chip de telefonia. Não apagou mensagens, não destruiu evidências, não realizou qualquer ato de eliminação de provas ou de obstrução da Justiça. Mantendo a coerência, submeteu-se à decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Espírito Santo e se apresentou voluntariamente para o cumprimento da prisão preventiva decretada.
Segue, apesar de tudo, com o firme propósito de cooperar e com a absoluta confiança de que a elucidação dos fatos trará a verdade e, consequentemente, levará à sua absolvição.
Dr Israel D. Jorio
Dr Raphael Boldt 

ENTENDA A PARTICIPAÇÃO DOS JUÍZES, EMPRESÁRIO E ADVOGADOS EM ESQUEMA, SEGUNDO O MPES 

Segundo o MPES, os diálogos revelaram que Farina interferiu em um julgamento envolvendo a empresa Cecato Negócios Imobiliários Ltda, que teve o registro de um terreno na Serra negado pelo Cartório de Registro Geral de Imóveis (2ª Zona da Serra).

Como em casos como este é necessária manifestação do Judiciário, o processo foi instaurado pela titular responsável pelo cartório. Em petição protocolada em setembro de 2016, o caso foi para o Juízo da Vara da Fazenda Pública Estadual, de Registro Público e Meio Ambiente da Serra.

Segundo as investigações do MPES, Farina negociou o recebimento de dinheiro com a intermediação de Hilário e de Davi Ferreira da Gama, ex-funcionário da Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages).

Os dois últimos mantinham contato direto com o empresário Eudes Cecato e com os advogados que representavam a empresa favorecida (Cecato Negócios Imobiliários) Luiz Alberto Lima Martins e Alecio Jocimar Favaro.

Os diálogos entre Hilário Frasson e Alexandre Farina para a suposta venda da decisão judicial teriam começado em fevereiro de 2017, conforme apontou o Ministério Público do Estado.

Já a sentença foi prolatada no dia 3 de março daquele ano, pelo magistrado Carlos Alexandre Gutmann, em favor da Cecato. 

"O juiz julgou improcedentes as exceções levantadas pela oficiala cartorária e determinando registro das escrituras públicas da empresa Cecato Negocios Imobiliários Ltda", apontou o órgão.

De acordo com os diálogos verificados pelo MPES, o pagamento de uma parte da propina teria ocorrido no dia 30 de março de 2017. Na ocasião, coube a Valmir Pandolfi pegar o dinheiro com Eudes Cecato e entregar para Hilário Frasson. No mesmo dia, Hilário teria repassado a quantia para o juiz Alexandre Farina.

Ainda segundo o MPES, mensagens posteriores indicaram que o empresário pagou integralmente o valor acordado.

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