Política

'O pobre terá que trabalhar mais tempo para se aposentar', diz especialista em previdência

Gerson Maia de Carvalho

Gerson Maia de Carvalho Foto: Arquivo Pessoal

A reforma da Previdência voltou ao centro das atenções do brasileiro. Nos últimos dias, a imprensa nacional tem informado que entre as propostas do governo para barrar o rombo previdenciário estão a implantação da idade mínima e a equiparação entre as idades de homens e mulheres aptos a se aposentar.

Além disso, entram no rol de discussões o fim da aposentadoria especial para professores, militares e outros profissionais, além da revisão de beneficiários do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez.

Para discutir as mudanças, o Folha Vitória entrevistou Gerson Maia de Carvalho, membro do Conselho Nacional da Previdência. Confira:

Folha Vitória: O Conselho tem se posicionado a favor da reforma?
Gerson Maia: O conselho tem representantes da sociedade civil, do governo e dos empresários. A bancada dos trabalhadores é contrária à reforma da forma que é colocada pelo governo. Já a do governo, assim como os patrões, é favorável às mudanças propostas. A principal mudança é a questão da aposentadoria, que tem regra de transição só para pessoas com mais de 50 anos e a questão das mulheres, já que o governo quer o mesmo tempo de contribuição do que os homens. A bancada dos aposentados entende que já foi feita a mudança necessária com relação à idade, cuja validade é 2027.

FV: Como estão as discussões dessas propostas no Conselho Nacional da Previdência?
GM: Para o conselho só foi apresentada, em última reunião no mês de agosto, a questão das aposentadorias por invalidez e o auxílio-doença. As outras propostas ainda estão em fase de debate. Quem há mais de 2 anos recebe esses valores deve passar por uma nova perícia médica, com a possibilidade de ter alta. A lei já previa essa nova perícia, o que o conselho questiona é a forma proposta. O governo está convocando esses aposentados e o pessoal que recebe auxílio-doença para participar de um mutirão. Mas entendemos que 5 minutos não é o tempo ideal para um perito avaliar se um trabalhador pode voltar à ativa. Além disso não há quantidade de peritos suficientes.

FV: O que o senhor tem a dizer sobre fixação de idade mínima?
GM: A bancada trabalhista é contrária porque entende que da forma colocada prejudica principalmente os trabalhadores de baixa renda que precisam começar a trabalhar com 16 anos de idade, enquanto uma parte da população com maior poder aquisitivo começa a trabalhar com seus 27 anos. Até esse período não contribuem para a previdência, pois ficam estudando, enquanto a camada mais carente começa a contribuir mais cedo. O pobre terá que trabalhar mais tempo para conseguir sua aposentadoria. 

FV: Se fala que essas propostas não conseguirão passar no Congresso sem ajustes. É o que o conselho acredita?
GM: A gente tem debatido, principalmente na bancada dos trabalhadores ativos, aposentados e pensionistas, que o governo vai colocar uma proposta no limite dele e mandar para o Congresso, onde acreditamos que haverá mudanças. Até porque o Congresso vai entender que é uma forma prejudicial e que pode fazer alteração. Gerará grande debate.

FV: Quais são as discussões em torno da equiparidade de idades? A líder do governo federal no Congresso, Rose de Freitas, por exemplo é contra.
GM: Essa questão já debatemos e entendemos que não tem como colocar essa idade de homens e mulheres no mesmo patamar. Quando foi colocado o tempo de contribuição das mulheres em 30 anos não foi por acaso. Discute-se principalmente a tripla jornada de trabalho da mulher. Dados científicos apontam que a mulher exerce muito mais atividade no lar do que os homens e exatamente em função disso não adianta querermos dizer que esse homem tem a mesma jornada de trabalho, pois não é a realidade. Ainda hoje não há uma grande mudança em relação a isso.
 
FV: E quanto à aposentadoria especial dos professores, servidores públicos e militares?
GM: Estamos debatendo. Quanto mais tempo essas pessoas ficam expostas nesse ambiente de trabalho, maior é a possibilidade de riscos. A aposentadoria especial tem de ter um debate bem maior. Na reforma da previdência em 1998, no governo FHC, quase todas as aposentadorias especiais [de trabalhadores da indústria, motoristas, frentistas, vigilantes, professores universitários] foram extintas. E agora com essa proposta que o governo coloca se pretende praticamente eliminar a condição da aposentadoria especial. Acredito que precisamos discutir primeiro as condições de trabalho no Brasil para depois entrar nesse debate. A condição de trabalho do professor é terrível.Com relação aos militares, imagina um com 65 anos de idade tendo que subir os morros para fazer as batidas? 

FV: Nas discussões há algum comparativo com outros países?
GM: Fazemos essas comparações. Nos países mais desenvolvidos da Europa, a idade média dos trabalhadores chega a 83 anos. No Brasil estamos com idade média de 74 anos. E há países da Europa onde as regras hoje em vigor não são tão duras como as propostas pelo governo. Se lá se vive quase 10 anos a mais, como você pode ter uma regra parecida?

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