Sede do TRT-ES. Foto: Divulgação/TRT
Sede do TRT-ES. Foto: Divulgação/TRT

O município de São Mateus, no Norte do Espírito Santo, uma empresa e três então candidatos aos cargos de prefeito e vereador nas eleições municipais de 2024 foram condenados por assédio eleitoral. Eles deverão pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 250 mil. O caso se refere à gestão municipal passada.

A decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 17ª Região responde a uma Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho no Estado (MPT-ES) e confirma que o vereador reeleito Cristiano Balanga (PP), o ex-vereador Kácio Mendes (PP) – que tentou a reeleição -, e o servidor Henrique Follador (PDT), candidato a prefeito na época, praticaram coação e intimidação de trabalhadores durante o período eleitoral.

Segundo o documento, os então concorrentes realizaram campanha política no interior da empresa Start Construções e Serviços Ltda – EPP, prestadora de serviços do município, durante o horário de trabalho dos funcionários, em agosto de 2024 – dois meses antes da eleição. As visitas foram gravadas, e os vídeos, divulgados nas redes sociais.

Conforme o desembargador relator, Cláudio Armando Couce de Menezes, tal conduta, “por si só, configura uma situação de intimidação e pressão psicológica, que, somada a outros fatores, reforça a conclusão pela existência do assédio eleitoral.”

Anteriormente, em primeira instância, o pedido de indenização do MPT-ES foi negado, sob argumento de que não havia provas diretas da coação dos trabalhadores. A sentença baseava-se no fato de que “as imagens e vídeos apresentados não foram suficientes para comprovar a ofensa à orientação política dos trabalhadores.”

No entanto, o TRT reconheceu que o assédio eleitoral se caracteriza por indícios e provas indiretas, considerando os contextos de vulnerabilidade dos coagidos. Consta na decisão que:

“Configura assédio eleitoral a prática de coação, intimidação, ameaça, humilhação ou constrangimento, no intuito de influenciar ou manipular o voto, apoio, orientação ou manifestação política de trabalhadores e trabalhadoras no local de trabalho ou em situações relacionadas ao trabalho.”

Formação de currais eleitorais

Segundo a denúncia do MPT, é importante ressaltar que o prefeito à época, Daniel Santana, conhecido como Daniel do Açaí, apoiava as candidaturas citadas anteriormente.

A empresa, então, prestadora de serviços públicos no município, organizou evento no seu estabelecimento “para apresentar os candidatos de sua preferência política, onde restou claro o objetivo de promoção da campanha político- partidária destes, por meio de veiculação ilícita de propaganda político-partidária em comunicações aos empregados, com violação ao direito fundamental à livre convicção política, restando configurado o assédio eleitoral.”

Esta estratégia de intimidar trabalhadores configura, para o MPT, a formação de “currais eleitorais”. Segundo a decisão da corte, tal modalidade de assédio se compara aos votos “bicos de pena” do passado coronelista, mas em escala muito maior.

Os empregados, então, se veem “obrigados a permutar o exercício da cidadania e dignidade humana pela sua permanência no emprego e, de maneira extensiva, pela sua sobrevivência.”

Indenização

Reconhecendo a ocorrência de dano moral por assédio eleitoral em face das referidas reuniões, “de cunho evidentemente político e com o intuito de obter sufrágios mediante o poderio econômico do empregador”, o tribunal responsabilizou, além dos políticos, o município de São Mateus, pela omissão na fiscalização do ambiente de trabalho, e a empresa, que permitiu a ocorrência do assédio.

A decisão fixou a indenização em R$ 50 mil para um dos envolvidos, além de R$ 5 mil pelas custas processuais.

O trânsito em julgado – quando não há mais possibilidade de recursos – se deu no último dia 6. O valor da condenação será revertido para iniciativas voltadas à promoção do trabalho decente e da cidadania.

O outro lado

A Prefeitura de São Mateus reforçou, em nota, que os fatos de que trata a decisão ocorreram durante a gestão passada.

“A administração atual reafirma seu absoluto respeito às decisões judiciais e ao devido processo legal, pautando todas as suas ações pela ética, transparência e pelo cumprimento rigoroso da legislação vigente.”

A Câmara Municipal de São Mateus, que não integra a ação julgada, informou que, até o momento, não recebeu qualquer comunicação oficial referente à decisão mencionada.

“Caso venha a ser formalmente comunicada sobre medida que atinja diretamente a atuação do Legislativo ou o exercício de mandato parlamentar, a Câmara adotará as providências cabíveis à luz da legislação vigente e informará oportunamente a sociedade.”

Já os políticos envolvidos foram procurados pela reportagem, mas não retornaram o contato até o momento desta publicação. A empresa não foi localizada. O espaço segue aberto para manifestação.

Julia Camim

Editora de Política

Atuou como repórter de política em jornais do Espírito Santo e fora do Estado. Jornalista pela Universidade Federal de Viçosa, é formada no 13º Curso de Jornalismo Econômico do Estadão em parceria com a Fundação Getúlio Vargas.

Atuou como repórter de política em jornais do Espírito Santo e fora do Estado. Jornalista pela Universidade Federal de Viçosa, é formada no 13º Curso de Jornalismo Econômico do Estadão em parceria com a Fundação Getúlio Vargas.