A pedido de vereador

Quadro sobre escravidão é trocado de lugar na Câmara da Serra e causa polêmica

Pintura de Antônio Tackla, artista serrano, retrata revolta de escravizados no município e faz parte do acervo permanente da Casa legislativa

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Obra de Antônio Tackla, na Câmara da Serra. Foto: Reprodução
Obra de Antônio Tackla, na Câmara da Serra. Foto: Reprodução

Após o vereador da Serra Antônio Carlos C&A (Republicanos) expor seu desconforto em relação a uma obra de arte exposta na Câmara Municipal, o quadro foi trocado de local. A mudança, no entanto, gerou repercussões na cidade e mobilizou entidades culturais.

Tudo começou quando o parlamentar, que é negro, publicou um vídeo nas redes sociais e usou seu tempo na tribuna da Câmara para expor o incômodo em relação às obras. São pinturas que retratam o período de escravização de negros no município.

Os quadros expostos na Casa são de autoria de artistas serranos, Antônio Tackla e Walter Assis, e, para o vereador, deveriam estar em museus, pois causam sofrimento e dor às pessoas pretas que trabalham no local e a si.

“Não é apagar essa história do negro, mas uma história triste como aquela (retratada no quadro) deveria estar num local que eu só vejo se eu quiser vivenciar essa tristeza”, relatou C&A.

Sobre o quadro, que foi trocado de corredor, o vereador diz que ele “retrata o sofrimento do negro”, e que “a arte é bela, mas machuca”. Ele também ressalta que é a favor de obras “que retratem as conquistas e vitórias que os negros tiveram”.

Ela não leva reflexão da escravidão, ele te leva para uma sensação ruim. Meus avós vieram nos navios negreiros no porto de São Mateus. Meu pai contava as histórias que o pai dele vivenciou. Eu comecei a olhar aquele quadro e também me sentir mal”

Antônio Carlos C&A (Republicanos), vereador da Serra

Apesar de requerer a remoção da obra, que ficava próxima ao gabinete de C&A, ele apenas foi recolocado em outro andar, a pedido dos vereadores Paulinho do Churrasquinho (PDT) e Professor Renato (PDT), que se manifestaram favoráveis à manutenção do acervo da Câmara e à valorização da história do município.

Debate sobre obra

Diante da discussão, o Conselho Municipal de Cultura vai se reunir, no próximo dia 17, com representantes de entidades culturais para debater o ocorrido. Foram convidados o Conselho de Promoção de Políticas da Igualdade Racial (COMPPIR), Academia de Letras e Artes e o Sindicato dos Artistas.

Conforme a presidente do conselho, Maria Marta, a deliberação sobre o caso da Câmara será importante para definir os próximos passos enquanto órgão fiscalizador.

Segundo ela, o debate é necessário para que o fato histórico “não se perca e caia no esquecimento”. Isso porque, justifica ela, aquilo que conhecemos, não repetimos.

O caso pode ser, conforme Maria Marta, uma falta de desconhecimento em relação ao patrimônio imaterial da cidade, à memória do que aconteceu na cidade da Serra e no Brasil como um todo.

Ela ressalta, também, que as obras expostas na Casa legislativa fazem parte de um acervo permanente e público e dizem respeito à Insurreição de Queimado, revolta de escravizados ocorrida no município no século XIX.

Julia Camim

Editora de Política

Atuou como repórter de política nos veículos Estadão e A Gazeta. Jornalista pela Universidade Federal de Viçosa, é formada no 13º Curso de Jornalismo Econômico do Estadão em parceria com a Fundação Getúlio Vargas.

Atuou como repórter de política nos veículos Estadão e A Gazeta. Jornalista pela Universidade Federal de Viçosa, é formada no 13º Curso de Jornalismo Econômico do Estadão em parceria com a Fundação Getúlio Vargas.