O Supremo Tribunal Federal decidiu, no fim de junho (26/06), que as operadoras de redes sociais são responsáveis – sem necessidade de decisão judicial prévia – pelos danos decorrentes de publicações feitas pelos seus usuários. Até então, vigorava a norma prevista no art. 19 do Marco Civil da Internet, segundo a qual as plataformas só poderiam ser responsabilizadas caso não retirassem do ar o conteúdo ilegal ou ofensivo – como racismo, discurso de ódio, incitação à violência e fake news – após ordem judicial específica. Na prática, a nova interpretação normativa fixada pelo STF abre um perigoso precedente para a relativização da liberdade de expressão e amplia a margem para a censura, além de sepultar a responsabilidade de cada indivíduo de formar seu próprio juízo de valor sobre os conteúdos que consome.
Não se pode negar que a disseminação de notícias falsas, a apologia ao crime e a atos antidemocráticos, bem como tantos outros comportamentos reprováveis praticados no ambiente on-line, têm se tornado um problema digno de enorme preocupação. Entretanto, como diz o ditado, o remédio não pode ser pior do que a doença. Lamentavelmente, é justamente isso que se observa na solução encampada pelo STF.
Riscos da Decisão do STF
Isso porque, embora algumas condutas sejam evidentemente criminosas e devam ser eliminadas de imediato – como pornografia infantil, incentivo ao suicídio e terrorismo -, outras como “fake news”, “discurso de ódio” e “atos antidemocráticos” possuem definições vagas, que admitem alto grau de subjetividade e manipulação em sua aplicação. O resultado é o risco de que conteúdos sejam considerados ilícitos e removidos sem o devido processo legal, quando, na realidade, apenas expressam opiniões divergentes e/ou polêmicas.
Outro problema reside no fato de que exigir das plataformas a moderação prévia dos conteúdos publicados pelos usuários cria uma obrigação praticamente inexequível. Imagine a Meta tendo que revisar tudo que é postado diariamente pelas 135 milhões de contas do Instagram e 111 milhões do Facebook. Trata-se de uma tarefa extremamente custosa e, mesmo com toda a tecnologia atualmente disponível, impossível de ser cumprida de forma adequada. Consequentemente, como as próprias plataformas já alertaram ao se pronunciarem sobre o tema, haverá uma exclusão excessiva de conteúdos – leia-se: conteúdos barrados injustamente – a fim de evitar a imposição de multas e indenizações, prejudicando a livre circulação de ideias e informações.
Impacto nas Empresas de Tecnologia
O Google já afirmou que pode restringir sua atuação no Brasil em razão das novas regras. Ou seja, com a decisão do STF, além de retrocedermos na defesa da liberdade de expressão e no combate à censura, inibimos a atividade econômica ao impor às big techs um alto nível de segurança jurídica e, às pequenas empresas que lutam para conquistar o seu espaço no competitivo mercado de tecnologia, ainda mais barreiras de entrada.
Em última análise, ao atribuir às plataformas de redes sociais a responsabilidade pelo conteúdo publicado por terceiros, a Corte Constitucional brasileira reforça a lógica de uma sociedade infantilizada, que prefere delegar a terceiros suas decisões individuais em troca de uma suposta proteção. No entanto, uma sociedade verdadeiramente livre exige indivíduos maduros, capazes de exercer sua liberdade e assumir as consequências de suas próprias escolhas.