Todos os anos, diversas famílias vivem uma jornada que começa antes do previsto: o nascimento de um bebê prematuro. A chegada inesperada é marcada por incertezas, novas rotinas e uma corrida silenciosa contra o tempo em busca de estabilidade e segurança.

Em todo o mundo, nascem anualmente cerca de 15 milhões de bebês prematuros e de baixo peso (menores de 2,5 kg), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Desses, um terço morre antes de completar um ano de vida. No Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, aproximadamente 10% dos bebês nascem antes do tempo.

Entre os meses de janeiro e julho de 2025, segundo dados da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), dos 30.778 nascidos vivos no Espírito Santo, 3.259 são prematuros. Em 2024, dos 49.859 nascidos vivos, durante todo o ano, 5.359 foram bebês prematuros.

Os dados foram divulgados pela Sesa em novembro de 2025. Foto: Folha Vitória

Em relação aos óbitos de prematuros capixabas, foram registrados 466 em 2024 e 621 de janeiro a outubro de 2025. (Dados atualizados preliminares em 14/11/25, registrados no sistema de Tabulação de Dados – TABNET).

Uma notícia inesperada

Thayna Polastreli e Pietro. Imagem: Acervo pessoal

Entre as mais de 3 mil famílias que lidaram com a prematuridade em 2025, está a família de Pietro Santana Polastreli. Nascido em 18 de outubro, Pietro veio ao mundo após 31 semanas e meia de gestação, quase cinco semanas a menos que uma gravidez considerada normal.

Segundo a professora Thayna Olympio Polastreli, a notícia de que seu filho nasceria antes do tempo trouxe uma mistura de surpresa e preocupação.

Quando eu descobri a minha gravidez, jamais imaginaria que iria ser uma gestação prematura. Todos os exames que eu fazia sempre davam uma gestação saudável e não mostrava, em hipótese alguma, que eu ia ter um bebê prematuro.

Thayna Olympio Polastreli, mãe do Pietro e professora

Mãe de primeira viagem, Thayna precisou vivenciar um dos maiores medos da maternidade: voltar para casa sem o filho no colo.

“Quando eu comecei a sentir minhas contrações e ele nasceu, foi uma emoção muito grande e meu coração se abriu para uma alegria imensa. Mas naquele momento eu também fiquei muito apreensiva e triste, porque ele já sairia dos meus braços diretamente para a UTI”, relembrou.

Pietro passou 11 dias internado na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) do Hospital Infantil e Maternidade Alzir Bernardino Alves (Himaba), em Vila Velha. Nesse período, ele foi entubado e passou por tratamentos como a fototerapia — que utiliza luz para tratar a icterícia.

O tratamento do pequeno bebê foi baseado na Política de Atenção Humanizada ao Recém-Nascido – Método Canguru, uma técnica que oferece cuidados humanizados aos bebês e suas famílias.

O Método Canguru: quando o colo vira remédio

O Método Canguru nasceu em 1979, em Bogotá, capital da Colômbia. Os médicos José Sanábria e Hector Martinez buscavam alternativas para reduzir os altos índices de mortalidade no país e viram no contato corpo a corpo uma possível solução.

A ideia era simples: colocar o recém-nascido contra o peito da mãe para promover maior estabilidade térmica e substituir as incubadoras. Com o sucesso nas reduções das taxas e o impacto no desenvolvimento dos bebês, a técnica começou a se difundir mundialmente.

No Brasil, o Método Canguru chegou em meados de 1990 e, após resultados positivos, em 2000, o Ministério da Saúde aprovou a Norma de Atenção Humanizada ao Recém-Nascido de Baixo Peso nas unidades do Sistema Único de Saúde (SUS).

Segundo a Médica do Banco de leite Himaba, Angélica Carvalho, inicialmente a prática foi nomeada como método mãe canguru, já que era centrada na relação mãe e bebê. Posteriormente, com a evolução do método e a introdução do contato com outros familiares, recebeu o nome pelo qual é conhecido hoje.

O Método Canguru é dividido em três etapas: a primeira etapa começa no pré-natal, quando identificamos a possibilidade do neném nascer prematuro e começamos a orientação e o acolhimento da família, que continua na internação; na segunda etapa a mamãe e o bebê vão ficar o máximo de tempo na posição canguru e ela vai participar de todos os cuidados; a terceira etapa acontece em casa, quando o acompanhamento continua e o bebê retorna para consultas agendadas.

Angélica Carvalho Médica do Banco de leite do Himaba

Segundo a médica, além deste contato direto, outras atitudes são tomadas dentro de uma UTIN para garantir o bem-estar e a evolução dos recém-nascidos.

“Dentro de uma UTI que trabalha com o Método Canguru, as incubadoras são cobertas com blackout, temos um chão emborrachado para diminuir o impacto dos passos, escolhemos momentos do dia para abaixar mais a luz e diminuir o som dos alarmes” detalha. “Bebês em unidade neonatal tem maior risco de desenvolver alterações como TDAH e o próprio espectro do autismo, por isso é importante diminuir os aspectos estressantes no ambiente.”

Thayna realizando o Método Canguru com Pietro. Imagem: Acervo pessoal

Ninguém está preparado para a prematuridade

A prematuridade causa um grande impacto na rotina e na dinâmica familiar. A chegada de um novo membro já representa uma reorganização, mas a antecipação adiciona novos fatores ao período de adaptação.

Segundo a psicóloga Natália Fadini, que atende famílias prematuras no Hospital São José, em Colatina, nas primeiras semanas, os pais geralmente vivem um turbilhão de emoções e a chegada antecipada do bebê quebra as expectativas e cria uma sensação muito forte de vulnerabilidade.

“É comum aparecer medo, insegurança e até um luto silencioso pelo parto que imaginaram e não aconteceu. O ambiente da UTIN, com tantos equipamentos, alarmes e rotinas, também pode assustar. É um período em que tudo é novo e muito sensível, e os pais ficam divididos entre a alegria do nascimento e a preocupação constante com a evolução clínica do bebê”, explica.

Angélica Carvalho relata que, durante seus anos atuando na área, já presenciou diversos momentos de insegurança. Em um dos mais marcantes, a família tinha pouca esperança quanto à recuperação do bebê.

“Muita gente não sabe o que é prematuridade. Eu já escutei uma avó falar: quando eu fui ver o meu netinho, eu abracei minha filha e falei ‘filha, estou aqui porque eu sei que vai ser difícil se ele não vai sobreviver”, relembra. “Mas esse menino sobreviveu e sobrevive bem e é isso que nós queremos.”

O medo é comum

A mãe do Pietro conta que um dos seus maiores medos era não conseguir continuar os cuidados do filho em casa. Entretanto, segundo Thayná, por ter sido introduzida na rotina do pequeno ainda dentro do hospital, prática que faz parte do método canguru, a adaptação tem ocorrido bem.

“O cuidado com um prematuro é totalmente diferente e eu ficava pensado ‘será que vou conseguir?’, mas as pessoas do hospital me auxiliaram muito e eu aprendi tudo que era necessário com elas, como as trocas de fralda e o banho”, relata.

Esthéffanye Vique Abranches, coordenadora de Enfermagem da UTI Neonatal e Pediátrica do Himaba, conta que um dos papéis dos profissionais é justamente tranquilizar os pais nos primeiros contatos com o recém-nascido.

“O primeiro contato costuma ser carregado de emoções e, ao mesmo tempo, de insegurança. Muitos pais chegam com medo, ansiedade e uma série de dúvidas. Nosso papel como profissional é acolher, orientar e mostrar que, mesmo pequeno e frágil, o bebê está recebendo todo o suporte necessário e o quanto eles são fortes”, explica.

Natália Fadini também explica que é relativamente comum sentir culpa ou medo, mas que não há “certo ou errado” quanto aos sentimentos de cada pessoa. “Peçam ajuda sempre que precisarem, tirem dúvidas com a equipe, participem dos cuidados possíveis e respeitem o tempo do bebê, cada prematuro tem seu próprio ritmo.”

Um caminho precoce, mas cheio de vitórias

Thayna Olympio Polastreli e John Lennon Lopes Santana comemorando o primeiro mês de vida do Pietro. Imagem: Acervo pessoal

Após 11 dias na UTIN e 14 dias na Unidade de Cuidado Intermediário Neonatal Canguru (Ucinca), Pietro pôde, finalmente, ir para casa com os pais. Ainda assim, como parte do método canguru, ele continua sendo acompanhado pelos profissionais de saúde.

Apesar do começo para um bebê prematuro e sua família ser um desafio, ele tem se adaptado bem ao novo ambiente e pôde comemorar seu primeiro mês de vida fora das paredes do hospital.

Eu gostaria que as outras mães de prematuros soubessem que é uma fase difícil e dolorosa, mas que passa. E, quando passa, a sensação é maravilhosa.

Você pega o seu filho e vai trazer ele pra casa, você não vai esquecer aquele momento que viveu, mas você vai viver uma alegria tão grande, um amor tão grande que você quase não lembra da dor e da tristeza que passou.

Thayna Oliveira Polastreli, mãe do Pietro e professora

Aline Gomes

Repórter

Jornalista pela Universidade Federal de Viçosa e estudante de Publicidade e Propaganda na Unopar, atuou como head de copywriting, social media, assessora de comunicação e analista de marketing. Atua no Folha Vitória como Editora de Saúde desde maio de 2025.

Jornalista pela Universidade Federal de Viçosa e estudante de Publicidade e Propaganda na Unopar, atuou como head de copywriting, social media, assessora de comunicação e analista de marketing. Atua no Folha Vitória como Editora de Saúde desde maio de 2025.