“Não sabia que aquilo ia transformar a vida da minha filha.” Raquel Moraes é mãe de três jovens talentos: Susana Costa, de 16 anos, Rafael Costa, de 14, e Isadora Costa, de 12. Eles estudam no CEEFMTI Liceu Muniz Freire, em Cachoeiro de Itapemirim, e fazem parte dos projetos Música na Rede e Banda nas Escolas. Mais do que apresentar um novo futuro, a música transformou a vida das crianças.
Tudo começou quando Susana, há quatro anos, pediu para participar da banda do colégio. Autista de nível 1 de suporte, com indicações de altas habilidades e uma má formação congênita na pele, que faz com que ela tenha muitas pintas, ela encontrou na banda um espaço de acolhimento e expressão.
Hoje, Susana toca percussão na banda da escola e, há dois anos, faz parte da Banda Jovem Sul, após ser aprovada na seleção do projeto Música na Rede. O programa está presente em 131 escolas espalhadas pelo Estado e engloba os projetos Bandas nas Escolas, Corais nas Escolas, Orquestras de Violões nas Escolas e Orquestra Jovem.
A iniciativa é da Secretaria de Estado da Educação (Sedu), em parceria com a Faculdade de Música do Espírito Santo (Fames) e a Fundação de Amparo e Apoio à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).
Para se inscrever, é preciso estar matriculado em uma escola estadual participante do programa. As inscrições acontecem no início do ano letivo, mas ficam abertas ao longo do ano.

Irmão de músico, músico é…
Por acaso, Rafael seguiu os passos da irmã. O sonho dele era ser jogador de futebol, mas, devido à asma, não conseguia correr nem treinar. Tentou algumas vezes, mas sempre passava mal. Até que, um dia, acompanhando um ensaio da irmã, foi incentivado pelo maestro a experimentar um instrumento de sopro — e conseguiu tirar um pequeno som.
Meu filho usava bombinha constantemente devido à asma e, hoje, após dois anos no projeto, praticamente não usa mais. A saúde dele melhorou muito! A respiração, o controle com o instrumento de sopro… a música trouxe qualidade de vida.
Raquel Moraes
Rafael começou no trompete, migrou para a trompa e se tornou um dos destaques do projeto. Hoje é bolsista do Música na Rede, pela Banda Jovem Sul, e já se apresentou com a banda do Antônio Acha, em Mimoso, e com a Comude, em Itapemirim.
A caçula não ficou atrás. No fim do ano passado, Isadora decidiu seguir os passos dos irmãos e também escolheu a percussão. Assim como eles, integra a Banda Jovem Sul do Música na Rede.

A rotina dos três é intensa: estudam música todos os dias, inclusive aos sábados. Mas tudo é feito com paixão. Juntos, já participaram de viagens e festivais, como o Festival Internacional de Jazz, em Santa Teresa, e o Campeonato Nacional, em Amparo, São Paulo.
“Nunca obriguei. Sempre digo: ‘No dia em que não quiserem mais, é só falar comigo’. Mas eles amam estar na banda, amam o maestro, amam o que fazem”, diz Raquel.
Mais do que notas e partituras, ela vê o projeto como uma escola para a vida.
São experiências que talvez eu não pudesse proporcionar a eles, e isso conta muito. A música fez deles jovens dedicados, obedientes, pessoas de bem. Isso não tem preço. Sou muito grata ao Banda nas Escolas, onde tudo começou, ao maestro Pablo e ao Música na Rede.
Raquel Moraes
Do acaso à vocação
Se a música transformou a vida dos filhos de Raquel, para Alice Patrício, de 18 anos, ela abriu portas que ela nem imaginava existir. Alice entrou para o projeto Vale Música, da Vale, há dez anos, quase por acaso. Queria praticar esportes, mas acabou escolhendo o caminho das notas.
“No início, confesso que não era algo de que eu gostava muito, mas, com o tempo, virou hobby. E de um hobby virou trabalho. É algo que pretendo levar para a vida”, conta. Hoje, Alice se prepara para prestar vestibular em Música na Fames, com o violino como instrumento principal.

Ela já participou de turnês com a Nova Orquestra, tocando no Rio de Janeiro, Maranhão e Pará, em homenagem a Rita Lee. Também teve a oportunidade de dividir o palco com músicos renomados da Orquestra Sinfônica Brasileira, como Priscila Rato, spalla do grupo — como é chamado o primeiro-violino de uma orquestra.
Além de tocar, Alice também ensina. Como monitora, conduz ensaios coletivos da orquestra elementar, formada por alunos recém-chegados ao projeto, um sonho recém-descoberto.
Acho que para o músico isso é inevitável, e eu tenho esse desejo de lecionar. Alguns sonhos menores já estão se realizando, como tocar com pessoas que admiro e participar de grupos que me inspiram. Fazer faculdade também é algo que quero muito realizar este ano. Mas o maior de todos é integrar uma orquestra de referência e estar realizada profissionalmente, satisfeita com o meu trabalho.
Alice Patrício
No Estado, o Vale Música conta com uma orquestra e uma camerata jovem, além de banda sinfônica, coral infantil, coral jovem e uma jazz band.
As inscrições para os projetos são abertas todos os anos para estudantes da rede pública de ensino ou bolsistas de escolas particulares das regiões previamente definidas em cada localidade. As aulas são realizadas em Cidade Continental, na Serra.
Encontrando propósito
Aos 17 anos, Erick Davi fala sobre a música com a segurança de quem encontrou o próprio norte. Até o primeiro ano do ensino médio, há dois anos, ainda não sabia o que queria fazer da vida.
Apesar de ter crescido em uma família de músicos, o interesse só floresceu quando entrou na escola e foi convidado para a Banda Jovem Música na Rede pelo maestro Agno Roris. Desde então, a percussão se tornou seu caminho.
A música mudou minha vida, me deu acesso. Passei a conversar com pessoas com quem antes eu não conversaria, minhas notas aumentaram. Sou muito mais feliz fazendo música. A música me deu um propósito.”
Erick Davi

Em três anos de projeto, Erick já participou de turnês em Minas Gerais e competições em São Paulo, além de se apresentar duas vezes com a Orquestra Sinfônica do Estado do Espírito Santo, no Teatro Sesc Glória, em Vitória.
“Essa experiência solidificou meu desejo de seguir na música. Ver que todos ali se divertem e se ajudam, mesmo com repertórios difíceis, foi inspirador. Desde o início, eu os via como um objetivo distante, e tocar ao lado deles, com poucos anos de estudo, foi indescritível. Eles acreditaram em mim e me deram essa chance. Foi extraordinário”, contou.
Assim como Alice, Erick também quer ensinar. Sonha em se tornar percussionista profissional, viajar, tocar em orquestras e, no futuro, transmitir o conhecimento que adquiriu.
Quero fazer bacharelado em percussão sinfônica na Fames. Depois, pretendo tocar em orquestra. Quero ser percussionista profissional. Ultimamente, percebi que gosto muito de dar aula, então talvez, no futuro, eu seja professor de música. Quero viajar, tocar em vários lugares e continuar aprendendo.
Erick Davi