Em segundos, o ronco das hélices corta o silêncio e o helicóptero do Núcleo de Operações e Transporte Aéreo (Notaer) ganha o céu o Espírito Santo. Do outro lado do rádio, a voz de um chamado marca o início de uma corrida contra o tempo para resgatar uma vida.
No Estado, a “patrulha do ar” transforma urgência em precisão, atuando em resgates que vão de vítimas de acidentes em rodovias e trilhas de montanha a bebês e idosos em estado crítico. As missões revelam a importância do socorro aéreo.
A atual denominação do Notaer surgiu em 2003, por força de dispositivo legal que reorganizou a aviação estadual. No entanto, as operações aéreas no Estado foram iniciadas ano de 1992, com a criação do Grupamento de Radiopatrulhamento Aéreo (GRAer).
Atualmente, o Notaer conta com cinco aeronaves, que ficam de prontidão para atender as ocorrências que acontecem de Norte a Sul do Espírito Santo.
Em entrevista ao Folha Vitória, a comandante de aeronave e chefe da assessoria do Notaer, major Elizabeth Bergamin, de 44 anos, explica que com o acionamento da central, seja do Samu, seja de outro órgão, a contagem do tempo é iniciada.
O Samu recebe a solicitação e nos repassa a demanda. O que importa para nós é a distância, o tempo, as condições meteorológicas no caminho, o combustível e se a aeronave está configurada com todos os equipamentos de navegação necessários para chegar até o local do resgate.”
Elizabeth Bergamin, major do Notaer
Atualmente, a base do Notaer está localizada no Quartel do Comando-Geral da Polícia Militar, em Maruípe, Vitória, onde ficam as aeronaves consideradas multimissão. “Podem ser acionadas para missões, tais como terrestre, aquática, atendimento à Polícia Militar, Civil, Corpo de Bombeiros, voos governamentais e aeromédico”.

“Principal dificuldade é a missão em si”
No Espírito Santo, de acordo com a major Elizabeth, a principal dificuldade não é o clima ou o relevo, mas a complexidade e particularidade que envolvem a missão em si.
Tivemos um resgate no Caparaó e o piloto teve que ir a 9 mil pés de altitude (o equivalente a 2.743 metros), o que é muito alto e não é o nosso padrão de atuação. Estamos ao nível do mar, então para isso temos treinamento constante, uma qualificação que fazemos ser capazes.”
Elizabeth Bergamin, major do Notaer
Além da qualificação constante, os pilotos no Notaer não decolam de improviso. São analisadas as variáveis que contornam os limites da missão: altitude, meteorologia e situação da vítima. “Claro que temos atendimento padronizado como base, mas vamos adaptando. Cada ocorrência é única”.
Como as emergências não têm hora ou local para acontecer, os helicópteros de resgate e os pilotos devem estar preparados para pousar nos mais diferenciados locais, seja na praia, no campo de futebol ou até mesmo no meio da rodovia.
Pousamos na rodovia, praia, fazemos resgate aquático. A pessoa está se afogando e fazemos a aproximação na areia. Existe essa coordenação com os órgãos, como guarda de trânsito, Polícia Militar. Eles apoiam para interditar vias para o tempo resposta ser o melhor possível.”
Elizabeth Bergamin, major do Notaer
A major Elizabeth relembrou as principais atuações da carreira: desde a morte de uma criança até mesmo resgates em chuvas. Ainda assim, a profissional é enfática ao dizer que uma ocorrência se sobrepõe a outra, já que cada uma tem suas particularidades, preferindo guardar na memória as experiências positivas.
“Falo que não tem uma ocorrência mais emblemática, porque cada uma é peculiar. Às vezes temos o costume de lembrar das mais tristes, como já perdi uma criança e tudo isso marca. Mas gosto de lembrar das positivas, de quantas vidas que salvamos, como quando tiveram chuvas e conseguimos tirar a família que estava com um bebê do telhado e já queria jogar no cesto, no desespero de salvar a vida do filho”, disse.
Mesmo com a particularidade das atuações, durante a entrevista, um assunto não ficou de fora: a tragédia que assolou o município de Mimoso do Sul, região Sul do Estado, em março de 2024.

A major Elizabeth destaca que uma situação de chuvas torrenciais gera uma comoção intensa até mesmo para as equipes de resgate que atuam no ponto crítico. “Temos que ser extremamente profissionais, técnicos e focados”.
Eu trabalhei em Mimoso do Sul. E é uma situação muito triste, principalmente quando a gente vê a realidade, quando você volta a ver o conforto da sua casa, onde a gente via no segundo andar de uma casa a marca da água, é muito triste.”
Elizabeth Bergamin, major do Notaer
Seis helipontos oficiais na Grande Vitória
O heliponto é uma área projetada para operações de pouso e decolagem de helicópteros. Na Grande Vitória existem seis “oficiais”: Rodoviária de Vitória, Hospital Estadual de Urgência e Emergência São Lucas, Hospital Estadual Jayme Santos Neves, Hospital Meridional, Residência Oficial e no Notaer.
Diferente de um heliporto, o heliponto é uma estrutura mais básica, sem infraestrutura de apoio, como áreas de taxiamento, hangares, oficinas ou pontos de reabastecimento.
“Utilizamos os helipontos para várias operações, por exemplo, o da rodoviária usamos muito para voos aeromédicos devido à proximidade dos hospitais, utilizamos também para voos governamentais”, disse.
Entretanto, a presença dos helipontos não se estende ao redor do Estado, onde no interior são utilizados prioritariamente os campos de futebol.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) denomina como área de pouso eventual ou ocasional. Em outros casos pousamos na rodovia e existe uma coordenação para a interdição da via, para o pouso poder ser feito em segurança.”
Elizabeth Bergamin, major do Notaer
Relembre alguns resgates marcantes no Notaer no ES
Atuação em Mimoso do Sul
Em Mimoso do Sul, as fortes chuvas da noite de 22 para 23 de março, deixaram cerca de 13,2 mil pessoas desalojadas e outras 100 desabrigadas. Também devido à enchente, 18 pessoas morreram e uma segue desaparecida até hoje.
Diante do desastre, o Notaer atuou intensamente para resgatar crianças, idosos, adultos e até mesmo militares do Corpo de Bombeiros que estavam isolados pelas águas.
Apenas no dia 23 de março, foram resgatadas 33 vítimas em dez pontos do município, conforme apontam os dados informados pelo Executivo estadual.
Homens são resgatados por helicóptero em praia na Serra
Outro resgate marcante ocorreu durante o resgate de dois homens que estavam se afogando foram resgatados pelo helicóptero no dia 17 de julho de 2021 em Nova Almeida, Serra.
Nas imagens, um dos banhistas, que já não tinha mais fôlego e estava em piores condições, é retirada com o chamado “sling” ou cinto para resgate aquático. O homem é içado e deixado na areia.
O segundo homem também teve que ser retirado da água, pois também apresentava sinal de esgotamento físico. Ele havia evitado que o seu amigo se afogasse, dando a ele uma prancha e uma boia.
Resgate de piloto belga em Castelo
No dia 9 de setembro de 2025, um piloto belga que participava do 19º Campeonato Mundial de Parapente, em Castelo, região Sul, precisou ser resgatado por um helicóptero do Notaer após sofrer um acidente durante a competição.
O helicóptero Harpia 09 realizou o resgate e transferiu o atleta para o Hospital Estadual de Urgência e Emergência São Lucas, em Vitória. A vítima sofreu várias lesões pelo corpo.

Durante chuva, helicóptero transporta idosa a tempo de receber rim
O Notaer foi crucial no dia 1º de dezembro de 2022, quando as equipes ajudaram uma mulher de 70 anos, moradora de Araguaya, distrito de Marechal Floriano, região Serrana do Estado, a receber um rim após ficar na fila do transplante de órgãos.
Ela foi informada pelas equipes médicas responsáveis que havia um órgão provavelmente compatível com as condições dela, ou seja, com grandes chances de compatibilidade.
Mas a idosa estava muito longe do hospital, que fica localizado em Vila Velha, e devido às chuvas, iria demorar muito para conseguir chegar. Com isso, a equipe foi acionada e fez o transporte da paciente e da filha.