
A dependência química e o alcoolismo são reconhecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como doenças. Esse reconhecimento é a chave para entender que pessoas que sofrem dessas condições podem, sim, ter direito a benefícios previdenciários e assistenciais no Brasil. A dúvida mais comum é: alcoólatras e dependentes químicos têm direito a aposentadoria pelo INSS?
A resposta é sim, mas não de forma automática. O direito depende de um fator crucial: a comprovação da incapacidade laboral. A seguir, saiba quais benefícios podem ser solicitados e o que é essencial para ter sucesso no pedido.
O QUE GERA O BENEFÍCIO?
Para que o dependente químico ou alcoólatra consiga a aposentadoria pelo INSS (ou qualquer outro benefício), é fundamental compreender que o benefício não é concedido pela doença em si, mas pelas consequências dela.
O direito nasce quando a dependência química causa uma incapacidade que se enquadra em dois cenários:
INCAPACIDADE LABORAL (BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO):
Ocorre quando o quadro clínico (crises de abstinência, internações frequentes, delirium tremens, danos cerebrais ou hepáticos secundários) impede a pessoa de exercer sua atividade de trabalho por um período superior a 15 dias ou de forma permanente e irreversível.
É preciso que o segurado tenha mantido a qualidade de segurado e a carência mínima (geralmente 12 contribuições) antes de ficar incapacitado.
INCAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE
Ocorre quando a condição gera uma incapacidade de longo prazo (mínimo 2 anos) que o impede de participar plenamente da sociedade, aliada à situação de extrema pobreza (renda familiar per capita baixa).
Este é o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS), que não exige contribuições ao INSS, mas sim a comprovação da miserabilidade e da incapacidade.
Portanto, um dependente químico só terá direito à aposentadoria INSS se a doença o tornar incapaz de trabalhar, conforme comprovado pela perícia.
OS 3 TIPOS DE BENEFÍCIO POSSÍVEIS PARA DEPENDENTES QUÍMICOS
O dependente químico ou alcoólatra pode se enquadrar em três benefícios principais: dois previdenciários (do INSS) e um assistencial (BPC/LOAS).
1. AUXÍLIO-DOENÇA (BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA)
- Finalidade: É o benefício concedido ao segurado que está temporariamente incapaz de exercer sua função por mais de 15 dias.
- Aplicação na dependência química: É comum após períodos de internação, durante a fase aguda da crise ou em tratamento intensivo, quando o indivíduo está totalmente impedido de trabalhar.
- Requisitos: Exige que o solicitante tenha qualidade de segurado (estava trabalhando ou contribuindo, ou está no “período de graça”) e tenha cumprido a carência mínima de 12 contribuições mensais (a menos que a doença seja considerada grave, o que é discutível no caso de dependência, sendo mais seguro contar com a carência).
2. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ (BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE PERMANENTE)
- Finalidade: É o benefício concedido quando a incapacidade para o trabalho é total e permanente, sem possibilidade de reabilitação para outra função.
- Aplicação na dependência química: Geralmente ocorre quando a dependência levou a graves sequelas secundárias, como doenças hepáticas avançadas (cirrose), demência alcoólica, ou danos cerebrais que tornam a pessoa permanentemente inapta para qualquer trabalho.
- Requisitos: Os mesmos do Auxílio-Doença (qualidade de segurado e carência de 12 meses), mas a perícia deve atestar a permanência e incurabilidade da incapacidade laboral.
3. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (BPC/LOAS)
- Finalidade: Não é uma aposentadoria INSS, mas sim um benefício assistencial para pessoas com deficiência ou idosos em situação de vulnerabilidade social.
- Aplicação na dependência química: O dependente químico que nunca contribuiu para o INSS (ou perdeu a qualidade de segurado) pode solicitar o BPC, desde que a dependência cause uma incapacidade de longo prazo (mínimo de 2 anos) e a família viva em estado de miserabilidade (renda familiar por pessoa inferior a 1/4 do salário mínimo).
- Requisitos: Não exige contribuição (não é preciso ser segurado), mas exige o cadastro no CadÚnico e a comprovação da condição de baixa renda.
O FATO DE A PESSOA ESTAR EM TRATAMENTO OU TER TIDO ALTA IMPEDE O BENEFÍCIO?
Não. O tratamento e a alta não garantem automaticamente a capacidade de retorno ao trabalho. O que o INSS avalia é se o risco de recaída ou as sequelas da doença (mesmo em tratamento) ainda geram incapacidade. O segurado deve focar na comprovação da sua incapacidade funcional no momento da perícia.
A FAMÍLIA PODE SOLICITAR O BENEFÍCIO EM NOME DO DEPENDENTE QUÍMICO?
Sim. Se o dependente estiver em um estado de incapacidade total para gerir sua vida civil (o que é comum em casos graves), a família deve buscar a curatela (judicialmente) para representá-lo e solicitar o benefício. Em casos menos graves, basta uma procuração simples.
EXISTE ALGUM TIPO DE BENEFÍCIO ESPECÍFICO PARA O TRATAMENTO (INTERNAÇÃO)?
Não há um benefício do INSS específico para a internação. No entanto, se o segurado estiver trabalhando e for internado, ele terá direito ao Auxílio-Doença (se cumprir os requisitos de carência) após o 15º dia de afastamento, pois a internação configura a incapacidade temporária para o trabalho.
O DEPENDENTE QUÍMICO QUE MORA NA RUA (SEM TETO) TEM DIREITO?
Sim. Se a pessoa preencher os requisitos de incapacidade de longo prazo e viver em extrema pobreza, pode ser enquadrada no BPC/LOAS, mesmo não tendo moradia formal. Nesses casos, a comprovação da miserabilidade é feita por meio de uma Assistente Social, que fará uma avaliação in loco (ou no local onde for encontrado), e pelo CadÚnico.
ALERTA LEGAL: A IMPORTÂNCIA DA ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL
Embora este guia detalhe todos os requisitos e caminhos possíveis para solicitar o benefício do INSS, é fundamental ter em mente que casos envolvendo dependência química e alcoolismo são complexos e frequentemente negados na primeira instância administrativa.
POR QUE A CONSULTA A UM ADVOGADO PREVIDENCIÁRIO É ESSENCIAL:
ANÁLISE DA QUALIDADE DE SEGURADO
Um profissional pode analisar com precisão se o dependente manteve ou não a qualidade de segurado e a carência necessária para os benefícios previdenciários (Auxílio-Doença ou Aposentadoria).
PREPARAÇÃO DA DOCUMENTAÇÃO
O advogado sabe exatamente quais detalhes o perito do INSS busca nos laudos. Ele pode orientar o paciente e a família a obter relatórios médicos que sejam tecnicamente robustos e focados na incapacidade laboral.
ESTRATÉGIA EM CASO DE NEGATIVA
Se o benefício for negado pelo INSS (o que é comum), o advogado previdenciário pode traçar a melhor estratégia: entrar com um recurso administrativo ou ingressar com uma ação judicial, onde a avaliação pericial geralmente é mais aprofundada e feita por um profissional de confiança do tribunal.
DIFERENCIAÇÃO BPC/INSS
O profissional saberá indicar qual dos caminhos (Assistencial BPC/LOAS ou Previdenciário INSS) é o mais rápido e viável, dependendo da situação de contribuição e de vulnerabilidade social da família.