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Testosterona em mulheres: Solução ou modismo perigoso?

Prometida como remédio para baixa libido, disposição e aparência, a testosterona virou tendência entre mulheres, mas especialistas alertam!

Leitura: 5 Minutos
Suplementação com testosterona para mulheres: quais os riscos?/Foto: Canva
Suplementação com testosterona para mulheres: quais os riscos?/Foto: Canva

Nos últimos anos, a testosterona tem sido promovida, especialmente nas redes sociais e clínicas de estética, como um “hormônio do bem-estar” para mulheres.

A promessa? Mais libido, mais energia, menos gordura, mais músculos e até rejuvenescimento. Esse apelo atrai mulheres de diferentes faixas etárias, muitas vezes, sem que haja real necessidade clínica.

No entanto, esse movimento desperta preocupações crescentes entre médicos e especialistas em saúde hormonal.

A endocrinologista Dra. Jacy Alves, referência na área, destaca que a testosterona tem, sim, funções importantes no organismo feminino, mas o uso fora das indicações reconhecidas pela medicina pode causar efeitos colaterais sérios e, em alguns casos, irreversíveis.

“A testosterona tem papel fisiológico importante na mulher, mas o seu uso indiscriminado, sem acompanhamento médico, pode se transformar em uma verdadeira bomba-relógio para a saúde”, afirma a médica.

O PAPEL DA TESTOSTERONA NO CORPO FEMININO

Embora seja normalmente associada aos homens, a testosterona também está presente nas mulheres, em níveis bem mais baixos. Nas mulheres, esse hormônio é produzido principalmente pelos ovários e pelas glândulas adrenais, e tem como funções principais a regulação do desejo sexual, manutenção da densidade óssea e contribuição para o tônus muscular.

De acordo com Dra. Jacy Alves, os níveis de testosterona diminuem de forma gradual e natural a partir dos 30 anos, e essa queda não está, necessariamente, relacionada à menopausa.

“Seus níveis declinam de forma discreta e progressiva a partir da terceira década de vida, independentemente da menopausa”, explica a especialista.

Essa queda é parte do envelhecimento natural do corpo feminino e não é, por si só, considerada uma doença ou deficiência que exija reposição hormonal — a não ser em situações muito específicas.

QUANDO A TESTOSTERONA É INDICADA?

Conforme as diretrizes da Endocrine Society e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), a única indicação reconhecida para o uso de testosterona em mulheres é o tratamento do Transtorno do Desejo Sexual Hipoativo (TDSH) em mulheres na pós-menopausa.

E mesmo nessa condição, o tratamento só deve ser iniciado após um diagnóstico rigoroso, que exclua outras possíveis causas para a perda de libido, como problemas emocionais, uso de certos medicamentos, doenças crônicas ou dificuldades no relacionamento.

“A testosterona só deve ser considerada nesse contexto, e depois de descartar outras causas comuns para a queda da libido, como alterações emocionais, hormonais, uso de medicamentos e questões de relacionamento”, ressalta Dra. Jacy.

Ela também esclarece que a dosagem de testosterona no sangue raramente é útil no diagnóstico de deficiência hormonal em mulheres saudáveis. A dosagem é, na verdade, mais comum em casos de suspeita de excesso do hormônio, como em mulheres com Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP) ou tumores secretores de andrógenos.

MITOS SOBRE EMAGRECIMENTO E ESTÉTICA

Uma das maiores motivações para o uso da testosterona entre mulheres fora do ambiente médico é o desejo de emagrecer ou ganhar massa muscular. Essa busca tem sido alimentada, em grande parte, por discursos na internet, vídeos de influenciadores e promessas de resultados rápidos oferecidos por clínicas não especializadas.

Contudo, especialistas são categóricos: não há evidência científica sólida que comprove que a testosterona promova perda de peso ou melhora estética significativa em mulheres saudáveis.

“Não há evidências científicas que justifiquem o uso de testosterona para emagrecimento, ganho de massa muscular ou rejuvenescimento”, reforça Dra. Jacy Alves.

A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que o uso de hormônios com fins estéticos, sem indicação clínica, pode configurar um uso abusivo e, em alguns casos, ser classificado como doping ou prática não ética.

CAUSAS MAIS COMUNS PARA A QUEDA DA LIBIDO

Nem toda mulher que sente perda do desejo sexual está, de fato, com deficiência hormonal. De acordo com especialistas, existem múltiplas causas que podem interferir na libido feminina. Veja algumas das mais frequentes:

  • Deficiência de estrogênio, especialmente durante a menopausa;
  • Transtornos emocionais, como ansiedade e depressão;
  • Uso de medicamentos, como antidepressivos e anticoncepcionais;
  • Sobrepeso ou obesidade;
  • Problemas de relacionamento ou insatisfação sexual.

Portanto, o primeiro passo sempre deve ser uma avaliação médica criteriosa, com uma abordagem integral e individualizada.

RISCOS DO USO INDISCRIMINADO DE TESTOSTERONA

O uso de testosterona sem controle médico pode trazer efeitos colaterais sérios — muitos deles irreversíveis. Entre os efeitos adversos mais comuns estão:

  • Crescimento anormal de pelos no rosto e no corpo;
  • Acne severa e oleosidade da pele;
  • Queda de cabelo no padrão masculino;
  • Aumento do risco cardiovascular e alterações no colesterol;
  • Danos hepáticos;
  • Engrossamento da voz (muitas vezes irreversível);
  • Aumento do clitóris;
  • Alterações de humor e maior agressividade;
  • Dependência física e emocional do hormônio.

Além disso, como não existem no Brasil medicamentos de testosterona formulados especificamente para mulheres, muitas pacientes acabam utilizando versões destinadas ao público masculino, o que agrava ainda mais os riscos e dificulta a regulação da dose adequada.

O QUE DIZEM AS DIRETRIZES MÉDICAS

As principais sociedades médicas do mundo, como a North American Menopause Society (NAMS) e a Endocrine Society, reforçam que o uso de testosterona em mulheres deve ser limitado, criterioso e supervisionado por especialistas.

No Brasil, a SBEM e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) seguem a mesma linha, defendendo o uso apenas para mulheres pós-menopáusicas com diagnóstico confirmado de TDSH.

Já a Sociedade Internacional para o Estudo da Saúde Sexual da Mulher (ISSWSH, na sigla em inglês) publicou um consenso afirmando que, embora a testosterona possa ser benéfica em alguns casos específicos, ainda não existem formulações seguras e adequadas amplamente disponíveis no mercado para o público feminino.

UM OLHAR MAIS ABRANGENTE SOBRE A SAÚDE SEXUAL DA MULHER

Para Dra. Jacy Alves, tratar a sexualidade feminina de forma simplista, com soluções hormonais padronizadas, é perigoso. A sexualidade é multifatorial e envolve questões físicas, hormonais, psicológicas e sociais.

“A saúde sexual da mulher é complexa e não se resolve com soluções simplistas. O que parece uma ‘fórmula mágica’ pode ter um custo alto para a saúde”, conclui.

Em resumo, o uso de testosterona em mulheres deve ser pautado pela ciência e pelas necessidades individuais de cada paciente — nunca por modismos ou promessas milagrosas.

Laísa Menezes, repórter do Folha Vitória
Laísa Menezes

Repórter

Formada em Comunicação Social pela Universidade Federal de Viçosa, pós-graduanda em Branding pela Universidade Castelo Branco, Alumni do Susi Leaders (Ed. 2023). Atua no Folha Vitória desde maio de 2024.

Formada em Comunicação Social pela Universidade Federal de Viçosa, pós-graduanda em Branding pela Universidade Castelo Branco, Alumni do Susi Leaders (Ed. 2023). Atua no Folha Vitória desde maio de 2024.