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Exército notifica igreja do ES e quer saber origem de arma anunciada em rifa

O assunto ganhou repercussão após uma igreja evangélica da Serra anunciar um sorteio cujo um dos prêmio é uma espingarda

Gabriel Barros

Redação Folha Vitória
Foto: Pedro Permuy

Diante da repercussão do sorteio de uma arma divulgado por uma igreja evangélica da Serra para reforma do templo, o Comando do 38º Batalhão de Infantaria do Exército Brasileiro irá apurar o caso. A igreja deve ser notificada para que preste esclarecimentos.

Segundo fontes no Exército, uma notificação oficial foi elaborada para a igreja. A instituição terá que explicar a origem da arma, se ela tem documentação e registro feito no Comando do Exército ou na Polícia Federal. Havendo comprovação de qualquer irregularidade incorrerá em responsabilização legal.

Foto: Reprodução
Arma é semelhante ao modelo sorteado

A arma, uma espingarda calibre 12, avaliada em R$ 12 mil, é apenas um dos prêmios do sorteio. De acordo com uma publicação da igreja nas redes sociais, também será sorteado o processo de registro de CR (Certificado de Registro) e CAC (Colecionador, Atirador e Caçador). O certificado é apontado para um segundo ganhador. 

Pelas regras do sorteio, qualquer pessoa pode participar, mesmo sem o registro de CR — certificado que concede o direito de efetuar atividades de caça, coleção de armas e tiro desportivo. Neste caso, o vencedor deverá realizar todo o processo necessário para que a transferência da arma seja realizada de forma legal.

Ao Folha Vitória, o tenente-coronel Rodrigo Penalva de Oliveira, do 38º BI, explicou que, estando a arma legalizada, ela pode ser vendida ou doada. Neste caso, é preciso que o novo proprietário esteja habilitado.

"O armamento, por ser um produto controlado, tem suas condicionantes. Se eu tenho uma arma e se estiver tudo legalizado, posso doar, vender e até sortear. Mas para passar a arma para outra pessoa, tem que ter as condicionantes. Não é uma rifa simples, de uma caneta, por exemplo. Neste caso, existem normas para que o ganhador receba o prêmio", explicou.

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O tenente-coronel ainda deixou claro que, para que uma pessoa consiga o registro para ter uma arma, é preciso estar em condições e atender aos requisitos necessários, de acordo com as regras.

"Se eu quisesse comprar uma arma, a primeira coisa que preciso fazer é eu estar em condições em ter uma arma. Existem processos e passos a seguir. No Espírito Santo, esse processo é administrado pelo 38º BI. O cidadão precisa estar legalizado, autorizado. Existe uma série de requisitos, como bons antecedentes criminais, precisa ter um termo de aptidão psicológica para portar arma de fogo. Se ele não estiver apto, não consegue o registro", esclareceu.

Armas podem ser sorteadas? 

A advogada Suzanne Mergar, no entanto, lembra que há uma lei que proíbe que alguns objetos sirvam como prêmios de promoção, entre eles está a arma de fogo.

"É do conhecimento da igreja a vedação a que se refere o artigo 10, inciso III, do Decreto nº 70.951, de que não pode ser objeto de promoção, mediante distribuição de prêmios, armas e munições?", questionou.

A lei citada pela especialista é de 09 de agosto de 1972, que dispõe sobre a distribuição gratuita de prêmios, mediante sorteio, vale-brinde ou concurso, a título de propaganda, e estabelece normas de proteção à poupança popular.

Art 10. Não poderão ser objeto de promoção, mediante distribuição de prêmios, na forma deste Regulamento:
I - Medicamentos;
III - Armas e munições, explosivos, fogos de artifício ou de estampido, bebidas alcoólicas, fumo e seus derivados;
IV - Outros produtos que venham a ser relacionados pelo Ministro da Fazenda.

Espingarda teria sido doada por amigo de pastor

A arma sorteada teria sido doada por Diogennes Garcia, de Goiânia, amigo do pastor. Em uma live com o pastor da igreja da Serra, realizada na noite desta sexta-feira (27), ele disse que o sorteio tem objetivo de ajudar na reforma da igreja e explicou que, caso o ganhador da arma não tenha autorização do Exército ou da Polícia Federal, será feita uma remuneração.

"O pessoal tem uma visão muito infantilizada, parecendo que você está distribuindo de forma gratuita num morro um armamento para bandido, quando, na verdade, estamos ofertando um acompanhamento do processo para pessoa que tem interesse em se tornar um CAC, um atirador esportivo ou conhecer mais sobre o esporte. Para ter acesso ao armamento tem que passar pelo crivo do Exército ou da Polícia Federal, caso aconteça da pessoa que ganhar não ser aprovada, existe a remuneração da questão do valor", disse.

"Estamos muito orgulhosos disso", diz pastor

Em uma publicação nas redes sociais da igreja mais cedo, o pastor Dinho Souza se manifestou após a repercussão do sorteio. Ele reforçou que a arma é fruto de uma doação e que servirá para investir no Ministério Infantil da instituição.

"Estamos muito orgulhosos disso. Nossa igreja está se mudando para outro local e comunicamos aos amigos se eles tivessem algum tipo de oferta ou algo que pudéssemos vender. Foi aí que, então, um amigo querido sugeriu a possibilidade de ele doar uma escopeta calibre 12 para estarmos sorteando. Obviamente, aceitamos essa oferta e estamos fazendo uma rifa. Esta arma será para investir no Ministério Infantil", disse.

Ao defender o armamentismo, o pastor disse que "o armamento é para o cidadão de bem, seja ele ímpio ou cristão". Afirmou ainda que a igreja incentiva "a todo homem de bem que tenha uma arma na sua casa para defesa da sua família".

"Aquele que negligencia a defesa de sua família não pode ser chamado de homem. Infelizmente, as pessoas não conseguem compreender essa mentalidade. Essa arma não é para bandido. Ela vai para o cidadão de bem para que ele possa se defender dos bandidos", disse.

O Folha Vitória tentou contato com a igreja para questionar sobre as leis citadas pela advogada e sobre a notificação do Exército, mas não houve retorno até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestação.

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