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Justiça obriga Samarco a escoar lama do Rio Doce para o mar em Linhares

Decisão da 3ª Vara Civil do município contraria determinação da Justiça Federal no Estado, que exigia da mineradora medidas para impedir a chegada da lama à foz do rio

Lama que percorre o Rio Doce deverá escoar para o mar Foto: ​TV Vitória

A Justiça de Linhares, no norte do Estado, determinou que a mineradora Samarco realize a abertura imediata da foz do Rio Doce para que a lama de rejeitos de minério - provenientes do rompimento da barragem de Mariana, em Minas Gerais - se dissipe no mar. A decisão, proferida pelo titular da 3ª Vara Civil de Linhares, juiz Thiago Albani, em audiência realizada na manhã desta sexta-feira (20), contraria a determinação da Justiça Federal do Espírito Santo, que exigia da mineradora a tomada de medidas para impedir a chegada da lama ao mar.

Segundo a decisão da Justiça, a empresa ainda deverá proteger todos os acessos às demais lagoas e afluentes da região, além de promover ações para minimizar os danos ambientais e sociais. Ainda de acordo com a determinação, caso a Samarco descumpra qualquer medida estipulada, estará sujeita a uma multa no valor de R$ 20 milhões, além de R$ 1 milhão por dia no caso de abandono das obras na foz. 

De acordo com a Prefeitura de Linhares, a decisão de abertura da foz teve o aval de técnicos ambientais do município, do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), do Instituto Chico Mendes (ICMBio), da Procuradoria Geral do Estado (PGE), além de contar com parecer favorável do Ministério Público Estadual (MPES).

Na visão de especialistas que estiveram presentes na audiência, entre eles o oceanógrafo Joca Thome, coordenador do Projeto Tamar no Espírito Santo e representante do ICMBio, a ida da lama para o mar seria menos prejudicial do que represá-la no Rio Doce. O mesmo entendimento teve o secretário municipal de Meio Ambiente de Linhares, Rodrigo Paneto.

"Não vamos permitir que coloquem os linharenses e a população dos demais municípios em risco. Bloquear a chegada da lama ao mar é uma loucura, é desumano. É querer estacionar a morte na frente de nossa cidade. Vamos até as últimas consequências para evitar tamanha insanidade", garantiu o secretário.

Estudo

Lama de rejeitos de minério já matou grande parte da fauna aquática que habita o Rio Doce Crédito: Leonardo Merçon/Instituto Últimos Refúgios

Segundo a prefeitura, técnicos do Iema apresentaram ao juiz Thiago Albani um estudo detalhado de todo o ecossistema formado na foz do Rio Doce e mostraram que qualquer tentativa de represar a lama traria consequências desastrosas para a região. Ainda de acordo com a prefeitura, o Iema também apresentou dados que comprovam que a lama jamais teria capacidade para atingir outras regiões como Abrolhos, na Bahia, ou Vitória, conforme informações divulgadas pela imprensa nacional.

Segundo a análise do Iema, a mancha de lama equivale atualmente a uma área de aproximadamente 50 vezes o tamanho da praia de Camburi, na capital. Conforme o estudo, mesmo que toda essa lama fosse para o mar ela se concentraria entre Barra do Riacho, em Aracruz, além de Urussuquara e Barra Nova, na divisa entre Linhares e São Mateus. Tal afirmação teve como base estudos geológicos que analisaram os últimos 5,1 mil anos da região.

Além disso, de acordo com estudos, a retenção da lama no Rio Doce comprometeria o principal berçários de espécies de água doce e salgada que são criadas no estuário, espécies que, segundo os ambientalistas, estariam ameaçadas de extinção.Os estudos geológicos mostram ainda que um eventual represamento do Rio Doce causaria inundações nas regiões de Vila do Riacho, Barra do Riacho, reserva indígena de Comboios, além da decantação de material nas lagoas Monsarás, Degredo e Suruaca. Isso provocaria a extinção de toda a fauna da região além de comprometer o estoque de água potável.

O juiz Thiago Albani também ouviu, na qualidade de especialistas no assunto, doutores e mestres em Ciências Biológicas, Bioquímica e Engenharia Ambiental, e todos se manifestaram favoráveis pela abertura da boca do Rio Doce, evitando o depósito contínuo de dejetos no leito do rio. De acordo com a Prefeitura de Linhares, com a decisão unânime pela abertura da foz para o escoamento da lama, a Samarco teria se comprometido a trabalhar no sentido de evitar qualquer represamento de lama no Rio Doce. 

A reportagem do Folha Vitória entrou em contato com a assessoria de comunicação da Samarco para saber se a mineradora já foi comunicada oficialmente da decisão e quais as medidas que estão sendo adotadas. A mineradora ficou de se pronunciar sobre o caso nesta sexta-feira.

Lama chega a Linhares

A lama com rejeitos de minério da Samarco chegou a Linhares na tarde desta sexta-feira (20)No entanto, de acordo com a prefeitura, o abastecimento de água permanece normal na sede da cidade e a captação e tratamento atendem aos padrões de qualidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde.

A prefeitura explicou que a água que chega à população não vem do Rio Doce, mas sim do Rio Pequeno, que deságua nele. Segundo a administração municipal, uma barragem foi construída para impedir que os dois rios se conectem e está sendo reforçada e protegida com lona.

Apesar de a água do Rio Doce em Linhares já apresentar alterações, com coloração mais escura e aspecto barrento, o Sistema de Alerta de Eventos Críticos (Sace), vinculado ao Serviço Geológico do Brasil, informou que a massa de água com maior turbidez ainda não chegou ao município e ainda está entre Colatina e Linhares. A previsão, até o momento, é que essa parte da lama chegue à região durante o fim de semana, mas o panorama pode mudar, conforme o deslocamento dos resíduos ao longo do Rio Doce.

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