
*Artigo escrito por Juliana Alvarenga, oncologista clínica, coordenadora da Oncologia e Oncohematologia da Athena Saúde, Oncolínicas, Hospital Meridional e Hospital Evangélico de Vila Velha.
O Dezembro Laranja, campanha nacional de conscientização sobre o câncer de pele, chega mais uma vez para reforçar uma mensagem simples, mas ainda negligenciada por grande parte da população: prevenir é sempre melhor e muito mais fácil do que tratar.
Apesar de ser o tipo de câncer mais comum no Brasil, respondendo por quase um terço de todos os diagnósticos oncológicos do país, o câncer de pele continua cercado por comportamentos de risco e pela falsa sensação de que é uma doença “menos grave” do que outros tumores.
Por ano, o Inca estima que surjam quase 230 mil novos casos de câncer de pele no Brasil, o que representa cerca de 30% dos casos totais de câncer no país. A realidade é que, embora muitos casos tenham alta chance de cura quando identificados precocemente, as formas mais agressivas, como o melanoma, podem evoluir rapidamente e causar metástases, tornando o tratamento muito mais complexo. E é justamente na prevenção onde o Brasil ainda tropeça.
Parte desse problema está enraizada em um traço cultural profundo da relação do brasileiro com o sol. Vivemos em um país tropical, onde a exposição solar é valorizada, associada ao lazer, à beleza e até à ideia equivocada de saúde. Bronzeamento, no imaginário coletivo, ainda é sinônimo de vitalidade, quando, na verdade, representa uma resposta inflamatória da pele à agressão dos raios ultravioleta. Ou seja, quando bronzeamos, a pele está, literalmente, tentando se defender de um dano.
Outro obstáculo importante é o uso irregular do protetor solar. Embora seja um item básico de proteção, seu uso diário ainda está longe de ser um hábito consolidado. O protetor costuma ser lembrado apenas em dias de praia ou piscina, e mesmo assim de forma insuficiente, sem reaplicação ou com fator de proteção abaixo do recomendado.
Além disso, muitos brasileiros não têm acesso fácil a produtos adequados, especialmente em regiões de maior vulnerabilidade socioeconômica. Essa desigualdade impacta diretamente na prevenção.
Ao tratar o protetor solar como um produto de beleza e não como um insumo de saúde, o Brasil cria uma barreira que impede que milhões de pessoas se protejam adequadamente. Não é raro que uma única embalagem tenha preço que passa dos R$ 100, o que torna inviável sua reposição frequente, especialmente em famílias numerosas. Em um país tropical, com altos índices de radiação durante todo o ano, essa é uma contradição que não pode mais ser ignorada.
Somado a isso, existe pouca atenção aos sinais iniciais. Feridas que não cicatrizam, pintas que mudam de cor ou formato, lesões que sangram ou coçam: muitos desses sintomas são ignorados, minimizados ou atribuídos ao envelhecimento natural da pele. A busca tardia por atendimento ainda é um fator crucial que dificulta diagnósticos precoces.
Além dessas questões, precisamos estar atentos à desinformação que pode estar presente na internet. Recentemente, um movimento de influenciadores dos Estados Unidos têm espalhado desinformação afirmando que os protetores solares representam risco para a saúde dos humanos. Esse tipo de conteúdo é desserviço e pode induzir parte da população ao erro e a comportamentos de risco.
Proteger-se do sol não deve ser apenas um cuidado de verão, mas um hábito de vida. O Dezembro Laranja é, acima de tudo, um convite para que cada um de nós reflita sobre a responsabilidade que temos com o próprio corpo e para que o Brasil avance na direção de uma cultura de prevenção verdadeira, acessível e consciente.
