Você sabia que existem mais de 700 tipos de nanismo? Cada um com suas peculiaridades, desafios e a busca pela inclusão e qualidade de vida é uma constante para quem convive com a condição.
O Encontro Regional de Pessoas com Nanismo, que acontece na Universidade Vila Velha (UVV) neste sábado (6) busca discutir estes desafios, soluções e sociabilidade, coisas que vão muito além da saúde.
O evento reúne palestras de especialistas sobre a condição, dentre eles, está o médico geneticista Wagner Baratela.
Ele explica que o nanismo é uma condição que pode afetar a pessoa de diversas formas, para defini-la geralmente é utilizado como parâmetro a própria curva de crescimento da população.
Uma criança que apresenta problemas e não cresce como deveria, está abaixo até de pessoas das estaturas mais baixas, é um sinal de alerta.
Há causas como a deficiência de hormônios, assim como outras doenças. Ele explica que crianças com problemas renais e cardíacos, que passam por cirurgias durante a infância, podem apresentar problemas de crescimento.
“Há também os quadros esqueléticos, doenças genéticas que afetam o crescimento dos ossos. Entrando neste capítulo há um número enorme de mais de 700 tipos de catalogados, ligados a um gene diferente, que atrapalham não só o crescimento dos ossos, mas a formação deles. Destas, a mais comum é a acondroplasia”, explica.
O médico explica que o nanismo acontece em um a cada 20 mil bebês e acondroplasia faz com que os ossos, principalmente das pernas e da coluna, entortem e tenham deformidades. Por conta disso, cirurgias são comuns ainda na infância.
A condição pode afetar órgãos para além dos ossos, como os olhos e ouvidos, causando problemas como miopia severa e problemas de audição.
Além disso, muitas crianças podem ter problemas no sistema imune, o que as deixa mais propensas a infecções.
Convivendo com o nanismo
O especialista é uma pessoa com nanismo, com displasia diastrófica. Na infância passou por mais de 25 cirurgias, ele explica que a condição lhe inspirou a buscar a formação em medicina e genética.
“Fiquei muito tempo em hospitais, em recuperação, o que teve um papel na escolha da minha carreira, fazendo genética e atendendo pessoas como eu, passando um pouco da minha experiência”, relatou.
Segundo ele, os desafios são inúmeros. O primeiro deles é mesmo chegar a um diagnóstico, uma vez que a variedade de formas da condição a torna um desafio para a detecção.
Para além disso, existe uma defasagem de profissionais especializados em tratar doenças raras, especialmente os geneticistas.
“A maior parte dos médicos não conhece essas doenças a ponto de fazer um diagnóstico preciso. A gente precisa de um profissional especialista em doenças raras, de geneticistas. No nosso país, talvez não tenhamos 300 médicos geneticistas. Então, essa criança precisa passar por toda uma rede, precisa de tratamentos, cirurgias, passar por múltiplos médicos para ajudar com a parte hormonal. É raro encontrar um profissional que já viu um paciente assim”, disse.
Ele explica ainda que existem tratamentos que podem ajudar com o diagnóstico, mas a maior parte ainda não está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS).
A condição pode, inclusive, ser diagnosticada ainda na barriga da mãe, quando o médico notar que o crescimento do bebê não segue como deveria, isso leva em consideração o tamanho dos ossos.
Este tipo de diagnóstico pode ajudar a criança a ter o acompanhamento adequado durante o período da infância.
Desafios para adultos
A atenção não pode ser exclusiva para as crianças, uma vez que adultos com nanismo também enfrentam diversos desafios no dia a dia.
O especialista explica que adultos têm dificuldades em diversos aspectos da vida. Pense bem, quantas vezes você foi a um banheiro adaptado para receber pessoas com a condição?
Mais ainda, em clínicas e hospitais também é raro encontrar equipamentos adaptados para receber estas pessoas. Isso faz com que adultos com nanismo evitem, inclusive, procurar tratamento médico.
Na vida adulta, as pessoas têm dificuldade de acessar serviços médicos comuns, até mesmo um check-up. Eles não vão a uma UBS, muitas vezes, por vergonha. Uma mulher, por exemplo, que precise de exames ginecológicos, a maca ginecológica não é adaptada. Não só na parte médica, para uma pessoa assim, pegar um ônibus, subir um degrau, usar um caixa eletrônico, são desafios. Existe uma série de barreiras arquitetônicas.”
Wagner Baratela, médico geneticista
Questões sociais e inclusão
Outra faceta muito conhecida por quem convive com o nanismo é o preconceito. Seja no dia a dia, seja mesmo em representações artísticas ou humorísticas.
Segundo Wagner, muitas vezes as pessoas com nanismo são representadas de forma jocosa, têm sua condição usada como entretenimento e piada.
Para ele, é necessário entender que pessoas com nanismo têm suas vidas, suas profissões e querem oportunidades como qualquer outra pessoa.
“Este evento falando sobre o tema é fundamental, mostrar a luta dessas pessoas. Sim, elas têm limitações, mas isso não as impede de estudar, de se relacionarem. Elas vivem, vão ao shopping, namoram, estão aí mundo afora. É importante tirar um pouco do preconceito e do mito e lembrar que esses indivíduos existem”, afirma.
Este processo de invisibilização ocorre até mesmo na faculdade de Medicina, onde os estudantes praticamente não estudam sobre nanismo. Para isso, o Encontro na UVV é fundamental.
“Este é um tema praticamente não abordado na faculdade. Um aluno pode passar tranquilamente sua formação sem estudar sobre isso. Buscamos trazer a lembrança para essas questões em todos os níveis da sociedade. Trazer aceitação, brigar pelos direitos, leis que favoreçam essas pessoas, que exijam uma adaptação”, relata.
Diálogo e políticas públicas
O encontro tem foco em médicos para abordar temas científicos, mas talvez o tema mais importante, segundo o geneticista, é a presença das famílias para discutir assuntos do dia a dia. Colocar pessoas para se conhecerem.
Em questão de políticas públicas, o médico afirma que já existem medicamentos e pesquisas voltados para o tema, principalmente para a acondroplasia, que já conta com uma medicação injetável.
Apesar disso, por conta de seu alto custo, ainda está fora do SUS, então famílias que buscam acesso precisam usar vias jurídicas.
“É um caminho muito duro, muitas famílias não têm nem acesso a um advogado. O foco é ter um diálogo com o governo para que ela esteja disponível no SUS, porque melhora a qualidade de vida. É preciso inclui-la”, disse.
Confira a programação:
- 8h30 – Credenciamento
- 9h – Café de boas-vindas
- 9h30 – Abertura · Kézia Castro
- 9h45 – Dinâmica: Biblioteca Viva, a História de Todos Nós
- Vivência · Juliana Yamin
- 10h45 – As Displasias Ósseas: Diagnóstico, Acompanhamento de Pacientes e Tratamentos – Dr. Wagner Baratela
- Palestra · Dr Wagner Baratela
- 12h – Almoço
- 14h – Criando um mundo diferente a partir de nós
- Palestra · Gabriel Yamin, Júnior Nascimento
- 15h30 – O impacto do tratamento com Vosoritida
- Relato de Experiência · Dr Wagner Baratela
- 16h30 – Coffee Break
- 16h45 – Conhecer, pertencer e se curar: a jornada de dentro para fora
- Roda de Conversa · Izabela Ganzer
- 17h45 – Encerramento · Gabriel Yamin, Juliana Yamin