Foto: Reprodução / PromoFarma
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Na Dinamarca, país sede da Novo Nordisk, fabricante do Ozempic e Wegovy, 43 pacientes entraram com pedido de indenização por acreditarem ter desenvolvido uma grave doença ocular como efeito colateral após o uso das canetas para diabetes e obesidade. Desses, cinco casos foram analisados pelo Conselho de Compensação de Pacientes, sendo um deles arquivado e os outros quatro tiveram a indenização concedida nesta sexta-feira, 21.

Esses pacientes desenvolveram a neuropatia óptica isquêmica anterior não arterítica (conhecida pela sigla NOIA-NA), uma doença ocular grave e uma das principais causas de cegueira ou visão gravemente prejudicada em adultos.

Trata-se de um efeito colateral muito raro de Wegovy, Ozempic ou Rybelsus, medicamentos que contêm o princípio ativo semaglutida. Estatisticamente, a NOIA-NA como efeito colateral da semaglutida afeta menos de 1 em cada 10.000 pacientes, segundo a Agência Europeia de Medicamentos (EMA).

A indenização foi paga pelo Conselho Dinamarquês de Compensação de Pacientes, uma autoridade independente que decide se os pacientes têm direito a ressarcimento caso sofram uma lesão após um tratamento de saúde ou um efeito colateral grave de um medicamento.

Os quatro pacientes receberam um total de 800 mil coroas dinamarquesas (cerca de R$ 664,8 mil). Esse valor pode aumentar se for comprovado que a NOIA-NA impede os pacientes de exercerem suas funções no mesmo nível de antes, resultando em perda de renda.

A avaliação das indenizações é feita caso a caso. A lei dinamarquesa exige que seja comprovado como “extremamente provável” que o medicamento seja responsável pela doença pela qual o paciente busca indenização.

Em relação à NOIA-NA após o uso de Wegovy ou Ozempic, isso significa que o seguro de indenização ao paciente não pode conceder compensação se o indivíduo desenvolver o problema muito tempo depois de interromper o uso do medicamento.

“É lamentável para os pacientes que foram afetados pelo efeito colateral. A NOIA-NA é uma doença grave que causa danos permanentes e incuráveis à visão. Esses casos também são muito complexos de avaliar, pois envolvem novos medicamentos e os pacientes já estão no grupo de risco para desenvolver NOIA-NA”, diz Karen-Inger Bast, diretora de Compensação ao Paciente, em nota.

Pesquisas na área sugerem que não há aumento do risco de desenvolver NOIA-NA se o paciente já tiver usado Wegovy ou Ozempic por mais de 14 meses sem desenvolver a doença ocular grave, diz o órgão dinamarquês.

“Tem sido complexo definir a conduta correta nesses casos, em que também contamos com a avaliação de um especialista em nervo óptico. Esperamos poder decidir os próximos casos mais rapidamente, para que os pacientes não precisem esperar muito tempo por uma decisão. Eles merecem isso”, completa a diretora.

Ciência investiga a relação

Em estudo publicado na revista científica JAMA Ophthalmology no fim de janeiro, pesquisadores descreveram nove pacientes que desenvolveram problemas oftalmológicos ao usar semaglutida e tirzepatida, como informado pelo Estadão.

Em 2024, um estudo relacionou o uso de semaglutida a um maior risco de derrame ocular, o que levou a Academia Americana de Oftalmologia e a Sociedade Norte-Americana de Neuro-Oftalmologia a divulgar uma nota informando que a comunidade médica está ciente de alterações na visão com o uso de semaglutida há um tempo.

Na ocasião, as duas entidades disseram não contraindicar a utilização dos medicamentos, mas orientaram os pacientes a interromperem a utilização e conversarem com o médico diante de qualquer alteração na visão.

Em entrevista ao Estadão, o endocrinologista Carlos Eduardo Barra Couri, pesquisador da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da Universidade de São Paulo (USP), defendeu a necessidade de realizar estudos mais detalhados e controlados com o objetivo primordial de avaliar o efeito desses medicamentos na saúde ocular em longo prazo. Ele reforçou que, até o momento, não está claro se existe uma relação de causa e efeito entre o uso desses medicamentos e os prejuízos visuais.

“A semaglutida e a tirzepatida promovem uma redução rápida e expressiva da glicose. Há décadas sabemos que, em pessoas com grande descontrole glicêmico, esse efeito pode trazer risco de reações oculares adversas”, explicou o médico.

Em junho, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinou a inclusão da NOIA-NA como uma reação adversa muito rara nas bulas dos medicamentos que contém semaglutida.