Imagem: Freepik
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Uma nova tendência nas redes sociais tem preocupado dermatologistas no Brasil. Isso porque é cada vez maior o número de usuários que defendem a ideia de que o protetor solar é dispensável e até prejudicial à saúde.

Os vídeos, que usam as hashtags #AntiSunscreen e #NoSunscreen, acumulam milhões de visualizações e incentivam jovens a abandonar o uso do protetor solar e substituí-lo por alternativas “naturais”, como óleos e manteigas vegetais.

A Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) classifica o movimento como perigoso e desinformativo. “Vemos essa tendência com grande preocupação. Incentivar o abandono do protetor solar coloca principalmente os jovens em risco, tanto de queimaduras imediatas quanto de danos cumulativos que podem resultar em câncer de pele no futuro”, diz o dermatologista Elimar Gomes, da SBD.

Gomes ressalta que as redes sociais têm enorme poder de propagação e que os conteúdos sem embasamento científico ganham visibilidade muito rapidamente, influenciando hábitos capazes de comprometer a saúde.

A radiação ultravioleta é o principal fator de risco ambiental para o câncer de pele, e isso é amplamente comprovado. Por isso, qualquer movimento que minimize esses riscos acende um sinal de alerta para a saúde pública

Dermatologista Elimar Gomes, da SBD

A dermatologista Larissa Montanheiro, do Centro Especializado em Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, concorda e compara o movimento anti-protetor solar com a onda de negacionismo que ocorreu com as vacinas na época da pandemia de covid-19.

“Vemos uma tendência de jovens buscarem uma vida simples e natural, duvidando de estudos já consolidados. Existem pesquisas robustas, de anos, comprovando que a radiação ultravioleta causa danos que aumentam o risco de câncer de pele”, alerta a especialista.

Dezembro Laranja

No Brasil, o câncer de pele não melanoma é o mais frequente na população (são cerca de 185 mil novos casos por ano) e representa cerca de 30% de todos os tumores malignos diagnosticados no País, segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA). E é justamente para chamar atenção sobre o tema que o mês de dezembro é marcado pela campanha Dezembro Laranja, criada pela SBD para reforçar a importância do uso do protetor solar e da detecção precoce de lesões suspeitas.

O dermatologista Reinaldo Tovo, do Hospital Sírio-Libanês, reforça que não há malefício associado ao uso de protetor solar e que ele é essencial para prevenir tanto lesões pré-cancerosas quanto tumores. “O sol é um fator desencadeante do câncer de pele. Os filtros solares protegem e não impedem a absorção de vitamina D”, ressalta o especialista.

Um dos argumentos dos vídeos anti-protetor solar é de que produtos naturais seriam mais seguros do que os filtros industrializados. Mas os especialistas ressaltam que essa afirmação não tem respaldo científico. “Nem tudo o que é natural é seguro. Veneno de cobra é natural, cogumelo é natural, e ainda assim podem ser venenosos”, compara Larissa, do Oswaldo Cruz.

Além disso, a dermatologista diz que os óleos vegetais não oferecem proteção adequada contra a radiação UV e, em alguns casos, aumentam a absorção de calor, intensificando queimaduras. “Óleos podem até ter algum fator mínimo de proteção, mas muito baixo, não chega perto do FPS 30 recomendado”, afirma.


Outra justificativa nos vídeos é de que o protetor solar tem produtos químicos que atrapalhariam a absorção adequada de vitamina D. O dermatologista Tovo, do Sírio-Libanês, explica que esse argumento também não se sustenta, porque vivemos em um País tropical, com sol o ano inteiro. “Bastam 15 minutos de exposição solar, três vezes por semana, para atingirmos 100% da necessidade de vitamina D. Se, por algum motivo, houver deficiência dessa vitamina, a forma mais segura é suplementar, e não abrir mão da proteção”, ensina o médico.

Ele acrescenta que todos os protetores comercializados no Brasil aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) são seguros e não apresentam nenhuma associação com câncer ou toxicidade.

Posso abrir mão do protetor em algum momento?

Mas, afinal, existe horário seguro para se expor ao sol sem proteção? Os especialistas são unânimes em afirmar que não. Embora o pico de maior radiação ocorra entre 9h e 16h, a radiação está presente durante todo o dia e os raios UV continuam atuando, independente do horário. “O conceito de ‘exposição segura sem protetor’ não existe quando falamos em prevenção de câncer de pele”, afirma Gomes, da SBD.

Para os especialistas, a principal estratégia contra a desinformação digital é ampliar o acesso à informação de qualidade. “A melhor forma de combater esses boatos é educar desde a infância, na escola, nas redes sociais, no consultório, usando linguagem simples”, comenta Larissa. Tovo defende a importância de ocupar o mesmo espaço onde os boatos nascem: “A desinformação existe e precisa ser combatida. Profissionais de saúde precisam estar nas redes produzindo conteúdo confiável”, conclui.