
Quando Sara Reardon, fisioterapeuta especializada em assoalho pélvico, postou um vídeo nas redes sociais alertando contra o “xixi forçado”, com o título “Caso sua mãe não tenha te contado: não faça força para urinar”, o conteúdo rapidamente alcançou 46 milhões de visualizações. Essa prática, segundo Sara, pode enfraquecer os músculos do assoalho pélvico e causar incontinência urinária e outros problemas na bexiga.
Mas essa não é a única mania no banheiro que vale a pena desaprender. Especialistas afirmam que existem maneiras corretas e incorretas de urinar. E, se você fizer da forma errada com frequência, isso pode causar problemas duradouros à saúde pélvica.
Outros hábitos a serem evitados, segundo os especialistas: fazer força para urinar, ir ao banheiro “por precaução”, segurar o xixi por tempo demais e urinar no chuveiro.
“Seja agachando, em pé ou sentado – se for necessário fazer força para urinar, isso não é saudável”, resume Ekene Enemchukwu, professora associada de urologia na Escola de Medicina da Universidade Stanford e diretora do Centro de Saúde Pélvica.
Com o tempo, esses hábitos podem aumentar a urgência, causar escapes e acidentes, além de enfraquecer os músculos do assoalho pélvico — levando à incontinência, problemas sexuais e até prolapso dos órgãos pélvicos. Isso ocorre quando um ou mais desses órgãos (bexiga, uretra, vagina, útero ou reto) se deslocam para fora do lugar.
Segundo um estudo de 2024, estima-se que 13 milhões de homens e mulheres nos Estados Unidos sofram de incontinência urinária (embora os dados mostrem que mais mulheres são afetadas). A idade é um fator importante: cerca de 50% das mulheres americanas na pós-menopausa com mais de 65 anos e 34% dos homens mais velhos apresentam esses problemas.
(No Brasil, o problema atinge 45% das mulheres e 15% dos homens acima de 40 anos de idade, segundo a Sociedade Brasileira de Urologia)
Os músculos do assoalho pélvico são “como uma rede que dá sustentação ao útero, ovários, bexiga e intestino”, explica Sara. “Eles estão ancorados ao osso púbico, cóccix e laterais, e reagem a atividades de alta pressão como correr e pular.”
Ao urinar, “os músculos do assoalho pélvico precisam relaxar”, acrescenta Ekene. Não é algo em que precisamos pensar ativamente, comenta ela; o cérebro e o corpo apenas fazem esse trabalho, fechando os mecanismos de forma automática durante o ciclo normal da micção.
Durante o dia e à noite, “a bexiga vai se enchendo de urina e envia um sinal ao cérebro para verificar: ‘É um bom momento para urinar?’”, diz Ekene. “Se for, você relaxa o assoalho pélvico e a bexiga espreme a urina para fora. Quando a bexiga percebe que terminou de esvaziar, ela para de se contrair. O esfíncter interno – um músculo involuntário – se fecha, e o esfíncter externo – um músculo voluntário – também se fecha inconscientemente, retornando ao seu estado normal.”
Mas, se você faz força para urinar ou interrompe o fluxo antes da hora, pode causar tensão muscular e confundir os sinais entre a bexiga, o assoalho pélvico e o cérebro. “Quando tensionamos os músculos, isso é um instinto de sobrevivência. Ele avisa a bexiga: ‘Não é hora de urinar’”, informa Ekene. Com o tempo, isso pode levar a esvaziamento incompleto da bexiga, retenção urinária, gotejamento pós-micção (vazamento de urina após achar que terminou) e disfunção do assoalho pélvico, explica ela.
Se isso se tornar um hábito, talvez seja necessário reeducar o assoalho pélvico para coordenar corretamente com a bexiga.
O que evitar ao fazer xixi?
- Não faça força. Embora o “xixi forçado” entre reuniões ou na correria para o trabalho pareça economizar tempo, ele pode ser prejudicial, dizem os especialistas. “A suposição é que, ao fazer força, os músculos se soltam e abrem”, esclarece Meghan Markowski, fisioterapeuta especializada em saúde da mulher no Brigham and Women’s Hospital, afiliado à Universidade Harvard, e que trata pacientes com disfunções do assoalho pélvico. Em vez disso, diz Meghan, “fazer força contrai o assoalho pélvico e força a urina a sair, em vez de deixá-la sair naturalmente”.
Esse tipo de esforço sentado pode levar à disfunção do assoalho pélvico, ou seja, à incapacidade de relaxar e coordenar corretamente os músculos da região, o que pode causar incontinência urinária e fecal, além de infecções urinárias. - Não urine agachada sobre o vaso. Em banheiros públicos, é comum as pessoas se agacharem para evitar contato com germes. Mas “agachar faz com que os músculos fiquem ativos e os quadris engajados”, descreve Sara.
Quando a parte inferior do corpo está se esforçando para manter o equilíbrio, relaxar o assoalho pélvico fica mais difícil. Assim como fazer força, agachar pode levar ao esvaziamento incompleto da bexiga e aumentar o risco de infecção urinária. - Não urine por precaução. Se você faz xixi antes de realmente sentir vontade – como ao sair de casa para o metrô ou para jantar – talvez seja melhor repensar esse hábito.
A Cleveland Clinic informa que a maioria das pessoas urina entre seis e oito vezes ao dia. No entanto, se você for ao banheiro cedo demais, começa a treinar sua bexiga para responder a pequenas quantidades de urina, e isso vira o “novo normal”, justifica Sara. Isso pode levar à bexiga hiperativa, segundo pesquisa de 2019, resultando em vontade frequente de urinar mesmo sem a bexiga estar cheia – o que atrapalha o trabalho, o sono e a vida diária.
Há exceções: “Se você vai para a praia, onde não há banheiro por perto, e urina antes de sair, isso faz sentido”, pondera Ekene. - Não segure o xixi. Por outro lado, adiar a ida ao banheiro quando se está com vontade também não é uma solução eficaz — isso sobrecarrega o corpo.
“Profissionais de saúde e professores frequentemente adiam a ida ao banheiro por falta de tempo. Isso faz com que a bexiga fique cheia demais, os músculos do assoalho pélvico fiquem tensionados por segurar a urina por tanto tempo e a pessoa depois não consiga relaxar para urinar”, explica Sara.
“Quando você adia a micção, a bexiga se estica e vira uma ‘bolsa mole’ sem elasticidade”, adiciona Ekene. Com o tempo, o cérebro pode começar a “ignorar” os sinais da bexiga, o que pode levar ao acúmulo de bactérias na urina. Um estudo de 2022 encontrou uma associação entre adiar a micção e o aumento do risco de infecção urinária. - Não urine no chuveiro. Apesar da conveniência (e do fator nojo), há situações em que isso deve ser evitado. Para mulheres com disfunção do assoalho pélvico, por exemplo, e homens com próstata aumentada, urinar em pé pode dificultar o esvaziamento da bexiga – mesmo quando há vontade. “Pode ser mais difícil relaxar se você não estiver sentado”, diz Sara.
Outras pessoas podem desenvolver uma “resposta pavloviana” ao som da água corrente e sentir vontade de urinar imediatamente, comenta Meghan. Um pequeno estudo de 2024 relatou que o som de água corrente foi o principal gatilho para o desejo súbito de urinar. (Outro estudo identificou gatilhos como chegar em casa e estar próximo a um banheiro familiar.) - Não espere esvaziar tudo. A bexiga está constantemente se enchendo de urina, pontua Sara, e sempre haverá um pouco restante. “Você pode forçar o xixi o dia inteiro, mas a bexiga nunca estará totalmente vazia”, afirma.
Como adotar hábitos saudáveis no banheiro xixi
A boa notícia, segundo os especialistas, é que é possível reeducar o cérebro e a bexiga. Veja algumas dicas:
Pratique a respiração abdominal. “Sente-se, incline-se para frente e respire” quando estiver no vaso sanitário, orienta Sara. Isso sinaliza aos “músculos do assoalho pélvico que é hora de relaxar e à bexiga que deve empurrar a urina para fora”. Um estudo de 2022 mostrou que essa técnica ajudou a melhorar sintomas de incontinência urinária e bexiga hiperativa.

Relaxe os músculos. Se estiver com dificuldade para urinar na hora, tente fazer um “kegel reverso”.
Os exercícios de kegel convencionais consistem em “contrair e elevar” os músculos pélvicos, descreve Meghan, “mas o kegel reverso faz o oposto – é o movimento de descida e abertura” do assoalho pélvico. Inspire, depois expire a partir da parte inferior do abdômen para liberar a urina naturalmente, sem fazer força.
Mude a posição. Se ainda estiver com dificuldades, tente o esvaziamento duplo. “Seque-se, levante-se e sente-se novamente – para relaxar os músculos uma segunda vez”, sugere Reardon. Outra opção é movimentar os quadris para frente e para trás no vaso sanitário, dando à bexiga uma segunda chance de se esvaziar totalmente. Um pequeno estudo mostrou que o esvaziamento duplo ajudou a reduzir a quantidade de bactérias na urina.
Faça um diário do xixi. Sara recomenda anotar suas micções por três dias e prestar atenção à ingestão de líquidos e à vontade de urinar. O ideal é urinar a cada duas a quatro horas durante o dia e, no máximo, duas vezes à noite, diz ela.
Marque uma consulta. Se os sintomas não melhorarem, procure um fisioterapeuta especializado em assoalho pélvico ou um urologista. Esses profissionais podem ajudar a corrigir problemas urinários e ativar corretamente os músculos da região. No geral, avisa Meghan, o melhor conselho é: “Entre, sente-se e vá embora” — e, de preferência, sem o celular./Por Lisa McCarty (The Washington Post)