Brasil eleva idade mínima para uso de redes sociais e chatbots

Imagine a cena: uma criança de 10 anos pedindo para criar uma conta em um aplicativo de vídeos, ou outra de 12 anos, já mergulhada em conversas com um chatbot que fala como se fosse uma pessoa de verdade. Agora, pense por um instante, e se os pais dissessem “ainda não” ou, pelo menos, “somente com supervisão”? É exatamente esse tipo de cuidado que o Brasil começa a adotar, preparando novas regras para proteger seus jovens no mundo digital.

O governo federal anunciou que, a partir de março de 2026, o uso de redes sociais, mensagens instantâneas e chatbots de inteligência artificial (IA) por crianças e adolescentes sofrerá uma mudança significativa: elevação das idades-mínimas permitidas, ou a exigência de supervisão parental mais rigorosa.

Vamos explorar os bastidores dessa decisão: o que realmente muda na prática, quais são os impactos, positivos, desafiadores e até paradoxais, e o que você, como pai, mãe, responsável ou educador, precisa considerar para compreender e orientar melhor essa nova realidade digital.


Por que o Brasil está considerando essa elevação de idade

Na era dos smartphones, tablets, chats 24h, algoritmos que “sabem” o que gostaríamos de ver antes de clicarmos e da “rolagem infinita” (infinite scroll), crianças e adolescentes já não apenas navegam; elas vivem em um ecossistema digital híbrido, entre o mundo físico e o virtual. Especialistas em pediatria e saúde digital vêm alertando há anos sobre os riscos da exposição precoce, da falta de preparo dos responsáveis, dos algoritmos projetados para engajar, e não necessariamente para proteger, e das consequências dessa “adultização” acelerada de vidas que ainda estão em formação.

Até agora, o Brasil contava com marcos legais como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que define direitos, proteção e parâmetros para infância e adolescência. Mas a regulação digital, voltada especificamente para plataformas, algoritmos, chatbots, filtros de beleza e mensageria instantânea, ainda era um território nebuloso, técnico, jurídico e em constante construção. Isso criou lacunas: acesso irrestrito de menores a ambientes online complexos, ausência de verificação consistente de idade, pouca transparência sobre o que os algoritmos exibem a esses usuários e a falta de “escudos” mais robustos para protegê-los.

Casos emblemáticos de crianças envolvidas em desafios virais, conteúdos de risco, uso excessivo de telas sem orientação e impactos na saúde mental têm gerado alerta. Na lógica de políticas públicas, “prevenir” é sempre melhor que “remediar”. O anúncio do governo aponta justamente para isso: “não queremos proibir as famílias de decidir, mas queremos que elas sejam perguntadas”.

Crianças que hoje navegam, conversam com chatbots e criam perfis são os adultos digitais de amanhã.


O que realmente vai mudar e quando entra em vigor?

As diretrizes estão previstas para 17 de março de 2026 como data para efeito das novas orientações. Os limites sugeridos são os seguintes:

Faixa etária mínimaTipo de serviço digitalComentários principais
A partir de 12 anosApps de mensagem (se controlados pelos pais), serviços com publicidade não direcionadaExemplo: mensageria básica com verificação e controle parental.
A partir de 14 anosMarketplaces, lojas de apps/games com moeda real, chatbots de IA generativa (tipo ChatGPT, Gemini)Ou seja: chatbots dão salto para faixa acima de “mensagens básicas”.
A partir de 16 anosRedes sociais completas, filtros de beleza, aplicativos que fazem coleta de dados, rolagem infinitaIndicativo de que ambientes altamente engajadores ou manipulativos exigem maturidade maior.
A partir de 18 anosPlataformas de conteúdo adulto, apostas, IA para edição de áudio/vídeo sintético, apps de relacionamentoAmbientes que têm risco alto ou exploração mais directa de dados ou recompensas.

Supervisão parental e autorização

Importante: essas idades não significam veto absoluto em todos os casos. O que se busca é que plataformas digitais sejam obrigadas a implementar verificação de idade e ferramentas de controle parental, além de perguntar ao responsável “Você autoriza que seu filho de X anos use esse serviço?”

Responsabilidades das plataformas

As empresas precisarão adaptar seus sistemas para essa nova realidade: bloqueios ou restrições automáticas, verificação de idade (o que bate com a regulação de dados pessoais – Lei Geral de Proteção de Dados – e com exigências de segurança de menores). Também poderão ter que atualizar seus Guias de Classificação Indicativa para esse novo “eixo de interatividade”.


O que está em jogo: benefícios, riscos e desafios

Benefícios esperados

  • Maior proteção infantil: A medida pode ajudar a reduzir exposições precoces a conteúdos inadequados, reduzir o impacto de algoritmos de engajamento agressivo e, em geral, dar “um fôlego” para a infância digital se desenvolver de forma mais orientada.
  • Envolvimento dos responsáveis: Ao exigir autorização dos pais ou responsáveis legais, promove-se uma cultura de supervisão e conversa em torno do uso digital, e não só “dar o aparelho e pronto”.
  • Pressão para melhores práticas nas plataformas: A necessidade de adaptação pode levar as empresas a desenvolverem ferramentas de moderação, limitação de dados, e experiências adequadas para menores.
  • Coerência com tendências globais: Países da Europa já estudam ou implementam regras semelhantes para menores e plataformas digitais e o Brasil estaria alinhando-se à evolução internacional.

Desafios e riscos

  • Implementação técnica e custos: Verificar idade, garantir que os sistemas não sejam burlados, proteger dados pessoais e permitir supervisão parental são tarefas complexas. As plataformas já reclamam de prazo curto para adequação.
  • Privacidade versus verificação: Pedir documentos ou validar idade pode colidir com privacidade e proteção de dados, exceção especial para menores exige equilíbrio fino.
  • Evasão ou “cultura do bypass”: Menores podem buscar formas de acesso alternativo (contas falsas, acessos via amigos, celulares de terceiros…), o que pode tornar o controle mais superficial.
  • Fragmentação da internet ou serviços: Plataformas internacionais podem aplicar regras específicas para o Brasil, ou pequenas empresas podem sofrer carga regulatória desproporcional, resultando em menor concorrência ou em soluções “pessoas escapam” menos seguras.
  • Mudança de foco sem cultura digital familiar: A idade maior não basta se as famílias não conversarem, orientarem e monitorarem de fato. Uso consciente e orientação continuam fundamentais.

Porque “chatbots de IA” estão inclusos e por que isso importa?

Muitas pessoas se concentram só nas “redes sociais” quando o noticiário fala em elevação da idade para uso. Mas é crucial observar que a nova norma menciona explicitamente chatbots de IA generativa (como ChatGPT, Gemini etc) na faixa de 14 anos, segundo a proposta.

  • São ambientes de conversação que simulam interação humana, o que implica que o usuário pode não distinguir totalmente entre “máquina” e “pessoa”.
  • Podem gerar sugestões, textos, ideias, imagens, até diálogos complexos — e tudo isso sem moderação específica para cada uso adolescente ou infantil.
  • Podem levar a riscos de privacidade, exposição de dados, formação de opinião sem filtro, uso indevido (plágio, desinformação, comportamento reutilizado etc).

Por que regular isso junto das redes?

A lógica da “exposição precoce” não se limita apenas à visualização de vídeos ou posts. A interação, o ato de enviar e receber respostas em tempo real com a inteligência artificial, abre novas camadas de risco. Quando uma criança de 10 anos conversa com um chatbot sem supervisão, há o perigo de receber orientações inadequadas, interpretações erradas ou até ser induzida por respostas incompletas que soam confiáveis, mas não são seguras.

As empresas que oferecem chatbots precisam reconhecer que menores de idade são usuários vulneráveis e, por isso, devem aplicar controles de segurança de alto nível. Incluir essa preocupação no escopo das plataformas é um passo visionário, que ultrapassa a simples moderação de conteúdo e avança para uma arquitetura de sistemas realmente pensada para proteger o público infantil e adolescente.

Implicações práticas

Plataformas que oferecem chatbots precisarão implementar verificação de idade ou um modo específico para menores, possivelmente com consentimento dos pais. Pais e responsáveis deverão compreender o que é a inteligência artificial generativa e reconhecer que ela pode “enganar” ou “influenciar”, garantindo que a supervisão seja ativa e consciente. Em ambientes corporativos ou escolares, caso aplicativos com IA sejam disponibilizados para alunos ou menores, será obrigatório respeitar as novas faixas etárias e ajustar as permissões de uso de acordo com as diretrizes estabelecidas.


Perguntas comuns sobre essa mudança

  1. Essa regra significa que menores de 16 anos não poderão usar redes sociais? Não exatamente. O que muda é que essas plataformas terão de implementar verificação de idade e controle parental, e as diretrizes indicam que redes sociais completas sejam liberadas a partir de 16 anos, mas com supervisão os pais ainda podem autorizar.
  2. E se uma empresa for sediada fora do Brasil, ela também precisa seguir essas regras para usuários brasileiros? Sim. Qualquer plataforma que ofereça serviços no Brasil ou para usuários brasileiros deverá observar regulamentos locais, incluindo verificação de idade e mecanismos de bloqueio. A legislação mira o território de oferta, não só onde está a sede da empresa.
  3. Como será feita a verificação de idade prática? Ainda existem muitos detalhes em aberto. Pode haver solicitações de documentos, uso de ID digital, validação por meio de terceiros, e tudo isso levanta questões de privacidade e proteção de dados (LGPD).
  4. O que os pais ou responsáveis devem fazer desde já? Desde já, informarem-se sobre controle parental, verificarem os dispositivos que as crianças ou adolescentes usam, definirem regras de uso juntos, falarem sobre tempo de tela, riscos digitais e certificarem-se de que o uso de apps ou chatbots está adequado à idade.
  5. Quais os impactos para empresas de tecnologia ou startups que oferecem redes sociais ou chatbots? Devem revisar seus termos de uso, implementar soluções de verificação de idade, preparar relatórios de conformidade, adaptar UX para usuários menores, prever mecanismos de autorização dos pais e controlar dados de menores com padrão de proteção mais elevado.

Alguns pontos relevantes sobre o impacto geral da regra

  1. Transição de infância digital: A medida reconhece que a infância precisa de “fase de calibração” em ambientes digitais, não um acesso irrestrito logo de cara.
  2. Responsabilização das plataformas: Não basta conscientizar famílias; as plataformas também são cobradas por segurança, verificação e moderação.
  3. Integração entre TI, privacidade e política pública: O digital infantil não é só tema de educação ou saúde, também é tema de tecnologia, regulamentação, segurança e operações.
  4. Potencial para desigualdades: Crianças com menos recursos ou em famílias sem orientação digital podem ficar em desvantagem ou ter menor acesso, é preciso garantir inclusão digital com segurança.
  5. Enorme desafio operacional: Para empresas, instituições de ensino, famílias, corporativa, há um “antes” e “depois” 2026 não é um ano distante. Os preparativos precisam começar já.

Recomendações para proteger crianças e adolescentes no ambiente digital

Para garantir o uso saudável e seguro das ferramentas digitais, especialistas e órgãos de proteção recomendam uma série de cuidados que envolvem pais, responsáveis, escolas e a própria sociedade.

  • Antes dos 2 anos de idade, é essencial evitar o uso de telas e dispositivos digitais, exceto em situações de contato afetivo por videochamadas com familiares. Nessa fase, atividades como brincadeiras, interações presenciais e movimento físico são as mais adequadas para o desenvolvimento.
  • Para crianças de até 12 anos, o ideal é evitar o uso de redes sociais e sempre respeitar as faixas etárias indicadas em cada aplicativo. A maioria dessas plataformas não é projetada para o público infantil e contém mecanismos que incentivam o uso prolongado e podem gerar dependência. A presença precoce de crianças nesses espaços também cria uma pressão social sobre outras famílias para antecipar o uso.
  • O diálogo é a ferramenta mais poderosa de proteção. Conversar abertamente sobre os riscos e as oportunidades do mundo digital ajuda a criar consciência e fortalece o vínculo de confiança entre pais e filhos. Cada família deve estabelecer suas próprias regras de convivência digital, incentivando o equilíbrio e o uso moderado das tecnologias.
  • Dar o exemplo é fundamental. Adultos devem evitar o uso excessivo de celulares e tablets durante o convívio familiar e nas refeições, preservando o tempo de qualidade e a atenção mútua. Também é importante incentivar atividades fora das telas, como esportes, leitura e brincadeiras ao ar livre, essenciais para o desenvolvimento emocional e social.
  • Pais e responsáveis devem conhecer os recursos de supervisão parental disponíveis em aplicativos e dispositivos, ajustando-os de acordo com a idade e o nível de maturidade da criança. A recomendação é adiar, sempre que possível, a posse de smartphones antes dos 12 anos e acompanhar de perto o uso de dispositivos e redes sociais na adolescência (dos 12 aos 17 anos).
  • Além disso, é preciso orientar sobre o uso ético e responsável da internet. Conversar sobre o que é cyberbullying, discriminação, discursos de ódio e outros comportamentos nocivos ajuda a prevenir danos e reforça valores de respeito e empatia.
  • Outro ponto crucial é preservar a imagem e a privacidade das crianças. Deve-se evitar a exposição excessiva de fotos, vídeos e informações pessoais nas redes sociais, prática conhecida como sharenting. Esse cuidado previne o uso indevido de imagens e protege a identidade dos menores no ambiente digital.
  • Por fim, observar mudanças de comportamento é essencial. Sinais como isolamento, irritabilidade, queda no rendimento escolar, problemas de autoimagem ou sofrimento emocional podem indicar uso problemático de tecnologias. Nessas situações, buscar apoio profissional é o caminho mais seguro para restabelecer o equilíbrio e a saúde digital da família.

Essas orientações não se tratam apenas de restringir, mas de educar. A verdadeira inclusão digital é aquela que forma cidadãos conscientes, responsáveis e emocionalmente preparados para um mundo cada vez mais conectado.

Estamos em um momento da era digital em que a velocidade se chocou com a maturidade social. Plataformas digitais avançam, chatbots se tornam comuns, algoritmos moldam comportamentos, e as fronteiras entre “brincadeira” e “exposição” ficam cada vez mais tênues. A elevação das idades mínimas para uso de redes sociais e chatbots no Brasil a partir de 2026 representa um marco, não o fim da infância digital, longe disso, mas sim uma pausa reflexiva: “Ok, vamos dar um passo para trás e construir uma base segura”.

Para você que atua em TI, operações e suporte, isso traz tanto responsabilidade quanto oportunidade. Responsabilidade de ajudar a criar ambientes seguros, oportuni­dade de liderar políticas que façam a diferença, de usar sua experiência para antecipar riscos e construir indicadores que demonstrem maturidade operacional.

O digital não é mais “fora” da infância ou “apenas brincadeira” ele já é parte integrante da vida. E como tal, merece ser tratado com a mesma seriedade, mesmo que de forma humanizada, criativa e por que não? Empática. Afinal, crianças que hoje navegam, conversam com chatbots e criam perfis são os adultos digitais de amanhã. E cabe a nós garantir que esse caminho seja feito com olhos abertos, consciên­cia e responsabilidade.


A tecnologia pode ser uma valiosa aliada para todos nós, desde que seja utilizada de maneira equilibrada e segura, garantindo que todos nós tenhamos acesso seguro e informações confiáveis.

Compartilhe com a gente as suas experiências, ou se precisar esclarecer alguma dúvida entre em contato, será uma satisfação para nós poder te ajudar de alguma forma. Fique sempre ligado no Folha Digital.

👨🏼‍💻 www.jacksongalvani.com.br

Jackson Galvani

Empresário no mercado de tecnologia, foi eleito um dos melhores Gerentes de TI do Brasil, é Coordenador da ExpoTI, Palestrante e Presidente do HDI-Brasil no ES. www.jacksongalvani.com.br

Empresário no mercado de tecnologia, foi eleito um dos melhores Gerentes de TI do Brasil, é Coordenador da ExpoTI, Palestrante e Presidente do HDI-Brasil no ES. www.jacksongalvani.com.br