A inflação e o novo arranjo dos mercados globais

Ao longo da década de 1970, algumas nações hegemônicas como a americana sofreram com o advento de um cenário econômico que veio a ser denominado estagflação, ou seja, crescimento baixo e inflação acelerada. Esse quadro emergiu por várias razões, inclusive por excesso de intervencionismo dos Estados. Por meio de uma série de políticas estruturais via […]

Por Thiago Goulart, Diretor de Conteúdo Técnico IBEF-ES

Ao longo da década de 1970, algumas nações hegemônicas como a americana sofreram com o advento de um cenário econômico que veio a ser denominado estagflação, ou seja, crescimento baixo e inflação acelerada. Esse quadro emergiu por várias razões, inclusive por excesso de intervencionismo dos Estados.

Por meio de uma série de políticas estruturais via Bancos Centrais como a implementação de uma agenda de reformas, flexibilizações e regulamentação a inflação começou a assumir uma trajetória cadente no mundo desenvolvido. No começo dos anos 1980 o jogo virou com a ascensão de Ronald Reagan e Margaret Thatcher.

Já no Brasil dos anos 1990, a adoção ampla de regimes de metas de inflação e o início de um Banco Central mais independente trouxeram políticas bem-sucedidas de combate ao dragão inflacionário e de estabilização da moeda a partir da consolidação do Plano Real.

Neste século, porém, três fatores chamam atenção para alguns pontos de exacerbação inflacionária:

  1. Fator demográfico, pelo fato de que a população mundial tem ficado mais velha;
  2. Fator tecnológico, ou seja, a amplificação de novas tecnologias tem alavancado a produtividade, criando maior número de bens com menos pressão inflacionária;
  3. E o fator globalização. Após a entrada da China na Organização Mundial do Comércio (OMC) em 2001, houve um momento de inserção chinesa com foco em desinflação no mundo inteiro e todo o processo de cadeias produtivas mais eficientes.

Os três fatores convergiram para um ambiente sobre o qual achávamos que o mundo passara a ser um lugar sem inflação. Porém, quase três anos de pandemia e 7 meses de guerra na Ucrânia depois mudaram a lógica das cadeias produtivas, da agenda econômica e da narrativa da política externa. Assim, novas alianças entre as nações devem ditar as regras da conjuntura geopolítica.

O impulso pelo modelo offshoring que marcou as últimas décadas, com investimentos que extrapolam as fronteiras nacionais, ganha contornos do neologismo do momento: o friendshoring. Este é o que parece ser os novos fornecedores do século 21.

Cadeias produtivas não podem mais depender de uma única origem. Estima-se que as atuais perturbações nas cadeias produtivas tenham levado o Produto Interno Bruto global a encolher pelo menos 1%.

Em outros tempos, essa discussão ficaria a cargo da OMC, que, nos últimos anos, tem perdido sua capacidade de atuação num contexto cada vez mais desafiador para o comércio multilateral, principalmente, a partir do Trade War iniciado em 2019 entre EUA e China.

Em um contexto de arrefecimento inflacionário futuro, se apresenta ao Brasil a oportunidade de a indústria acompanhar com interesse o que pode surgir no horizonte a partir do rearranjo dos mercados globais.

É preciso saber em que medida o desejo político vai se transformar em realidade no mundo dos negócios e se as empresas estarão dispostas a arcar com custos maiores de produção.