Hoje é o melhor dia para promover a liderança feminina

* Por Cátia Horsts

 

Vencer a distância que ainda impede que mulheres ocupem posições de liderança no mundo corporativo deixou de ser uma luta só nossa. Reverter a lógica masculina e discriminatória do mercado de trabalho é uma obrigação inadiável para sociedades, organizações e estruturas que pretendem alcançar o futuro.

No entanto números da última pesquisa “Woman in the Workplace”, realizada em outubro de 2022 pela Mckinsey e Lean In, demonstram que esse é um desafio ainda colossal. Entre 2017 e 2021 a presença de mulheres em posições de alta gestão avançou pouco nos Estados Unidos, onde o estudo foi conduzido.

Um fenômeno que chama a atenção é que cresceu o número de profissionais do sexo feminino que opta por deixar empresas que não ofereçam oportunidades claras de promoção e ascensão na carreira. Esse movimento reduz o pipeline de executivas em condições de assumir posições de liderança e retroalimenta o fosso da desigualdade entre homens e mulheres em todos os níveis corporativos.

Ao mesmo tempo que esses dados são revelados, o avanço da mulher no mundo corporativo, principalmente em posições de alta gestão, se faz mais necessário. Entre essas circunstâncias, vou citar três aspectos relevantes.

O primeiro aspecto é a propulsão do trabalho remoto no mundo em consequência da crise pandêmica. Os modelos de trabalho à distância derrubam barreiras geográficas e culturais e criam condições para a formação de equipes mais inclusivas e diversas.

É inegável que as características do trabalho remoto beneficiam todos. As principais afetadas positivamente são aquelas pessoas vistas pelo mercado de trabalho como em situação de desvantagem, ou vítimas de preconceito. Estou me referindo a mães, donas de casa, cuidadoras, mulheres e mulheres negras de periferia.

A despeito da situação ser ainda mais delicada para esses grupos, trabalhar de casa e poder buscar o equilíbrio entre vida pessoal e profissional representa a possibilidade de viver uma vida normal. Para muitas pessoas, o trabalho remoto é a única opção de se colocar no mercado, progredir na careira e realizar sonhos sem abandonar as responsabilidades do convívio familiar.

Outra circunstância que favorece iniciativas para equiparação profissional entre homens e mulheres é a implementação, por parte das empresas, de políticas de Diversidade , Equidade e Inclusão (DEI). Já está comprovado que ambientes mais diversos resultam em mais criatividade e produtividade para as empresas.

Quando executadas com seriedade e conduzidas a partir de princípios genuínos, as políticas de diversidade tornam-se importantes instrumentos para sustentar práticas voltadas a corrigir deformações históricas e culturais.

Na ótica empresarial, em uma perspectiva de longo prazo, políticas de diversidade vão se tornando diferenciais competitivos. Passam, então, a fazer parte da engrenagem de atração e retenção das melhores pessoas para essas organizações.

O terceiro aspecto que eu trago nesse cenário de circunstâncias que favorecem a adoção de práticas voltadas a atrair e reter mulheres é o próprio estilo feminino de liderar pessoas. Relações mais humanizadas e o cuidado com a saúde integral são características de gerenciamento que estão emergindo como fundamentais para elevar a experiência das pessoas nas empresas.

Com a guerra que estamos enfrentando para contratar e reter profissionais, employee experience deixou de ser uma expressão da moda para se transformar em um diferencial competitivo relevante. Nesse aspecto, também, as mulheres estão em clara vantagem em relação aos homens. Pesquisas já apontam que elas têm mais condições de promover ambientes saudáveis de trabalho.

Como mulher, e uma das fundadoras de uma empresa de gestão de pessoas e recursos humanos referência no estado do Espírito Santo, com atuação em todo o território nacional, me sinto responsável por promover o debate e ser parte da mudança.

A Rhopen foi criada há mais de 11 anos. Desde então, eu e minha sócia, Jaciara Pinheiro, assumimos uma missão: criar condições justas e dignas de trabalho para mulheres que optam por seguir uma carreira profissional de sucesso sem se distanciar da família e dos sonhos.

Durante essa jornada, lutamos todos os dias para gerir o nosso negócio e criar oportunidades a partir de uma ótica feminina. Com isso, vimos desenvolvendo estratégias para buscar parcerias, fechar contratos e conquistar mercados em ambientes dominados por homens.

Essa não foi uma tarefa fácil. Não gostamos de charuto, não bebemos uísque e não fomos convidadas para rodadas de cerveja em restaurantes e boates. No entanto estivemos do outro lado da tela, participando de reuniões on-line, indo a eventos, abusando das conversas via aplicativo e fazendo boas parcerias.

Com o tempo, fomos furando a bolha e penetrando esse universo ainda dominado por eles. Fizemos isso nos posicionando de forma inteligente, responsável e profissional. Durante todo esse período, fomos incansáveis em levar para o mercado percepções e o entendimento de que negociar e fechar contratos com mulheres é uma prática positiva para o mundo business.

Tivemos sucesso até aqui, assinamos ótimos contratos e continuamos a promover o estilo feminino de liderar. Hoje, 90% do nosso time é de mulheres. Ocupamos 98% das posições de alta gestão na Rhopen. Neste ano fomos reconhecidas pelo IEL como “Melhor Empresa” e “Melhor Empresa Capixaba” em termos de gestão. Também somos a quinta “Melhor Empresa para se Trabalhar no Espírito Santo”.

Essa luta nos rendeu muitos aprendizados sobre os desafios para a valorização profissional da mulher. Como disse, os desafios são muitos e estão distribuídos em todas as dimensões da vida. No entanto quero trazer algumas sugestões para que gestoras e empresas possam trilhar a sua jornada também, contribuindo para o combate à não equidade.

Aproxime valorização da mulher e propósito. O princípio básico de qualquer empresa é ter lucro, nós sabemos. Mas não é o nosso papel obter lucro promovendo sociedades desiguais e injustas. Portanto um primeiro passo é incorporar essa luta à razão de existir da organização.

Depois de alinhar o propósito da empresa com uma direção na qual você acredita, e que faz sentido para a sociedade na qual o seu negócio está inserido, revise os valores que vão sustentar o modo de ser e agir da organização. Garanta que esses valores estejam coerentes com aquilo que as pessoas buscam enquanto sociedade e demonstre que a sua empresa é um canal para essa busca.

Após esse exercício de revisitar propósito e valores, é hora de iniciar processos participativos de comunicação e engajamento. Esses processos fazem com que todas as pessoas envolvidas e afetadas pela empresa compreendam a razão pela qual a empresa existe. Aqui, é necessário criar espaços saudáveis de colaboração, valorização e segurança psicológica para que as pessoas percebam o seu papel como agentes de mudança.

Esse processo participativo e colaborativo se alimenta da propagação de histórias de sucesso. Crie ambientes nos quais os bons exemplos sejam compartilhados e valorizados. Conte as histórias e dê os créditos àquelas pessoas que compraram a ideia e estão promovendo a mudança com experimentação, criatividade e esforço.

Utilize a tecnologia a favor da causa. Incorpore o digital first na gestão e na operação da empresa (sempre que for possível). Aqui, é preciso compreender que os modelos distribuídos em rede são nossos principais aliados. Vire a chave e passe a conduzir as pessoas com o olhar para o futuro. O futuro da gestão é digital, remoto, distribuído, flexível, inclusivo e justo.

Envolva todos os públicos de interesse nesse processo. Negócios são propagadores de mensagens e formadores de opinião e comportamentos positivos. Favoreça contratos que estão de acordo com seus princípios e influencie a sua comunidade de parceiros e fornecedores a também fazerem parte do processo de mudança. Todos somos coautoras de uma sociedade mais justa.

Precisamos agir agora. Caso contrário, vamos perder mais gerações de mulheres que poderiam estar em posições importantes de liderança nas empresas e transformando o mundo para melhor.

 

Cátia Horsts é CEO da Rhopen Consultoria

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